domingo, 8 de maio de 2016

A groupie do Lobo Antunes

Na Terça-feira, fui a um jantar de aniversário aqui na vizinhança. Eu era a convidada mais jovem, o resto das senhoras tinha mais de 50 anos, tendo a mais velha e anfitriã 92. A aniversariante era a K., que completava 87 anos. Eu não conhecia a K., mas ela já tinha ouvido falar de mim e sabia que eu era de Portugal. Assim que entrei e fomos apresentadas, informou-me que era a groupie do António Lobo Antunes, a maior fã, e que gostava muito de José Saramago também. Perguntou-me se eu já tinha lido algum deles e eu disse que não.

Tenho muito medo de José Saramago: tive uma má experiência no décimo ano, graças à minha professora de Português, que achava que eu era uma nulidade. Eu até aceito que haja pessoas que tenham essa opinião de mim e não me perturba minimamente -- até me diverte --, mas não cabe a um professor ter essa opinião de um aluno, nem comportar-se como se o aluno fosse um incómodo, especialmente numa idade tão crítica. Mas, mesmo tendo medo, tenho aqui um livro do Saramago, que é para tentar curar-me da minha fobia. E comprei-o em inglês, porque encontrei-o assim, logo apeteceu-me comprá-lo. Também tenho um livro do Lobo Antunes, versão inglesa, também. Um dia destes, lê-los-ei!

Dado meu desconhecimento directo da obra dos autores que a K. apreciava, perguntou-me que autores portugueses é que eu lia. Quando me fazem estas perguntas eu entro em pânico. Para começar, tenho uma memória horrível e preciso de tempo para me lembrar das coisas, então nomes é patético. Se soubessem o número de meses que me levou para decorar o nome dos meus co-autores neste blogue, morreria de vergonha. No entanto, em minha defesa, assim que comecei a ter uma ideia da personalidade deles, consegui associar os nomes às pessoas, pois ganharam vida no meu cérebro. Para me lembrar das coisas, preciso de um motivo. É por isso que, para mim, é mais fácil escrever do que falar, pois a escrita é mais lenta do que a conversação, logo o meu cérebro tem mais tempo para funcionar. (Convém aprender os pequenos truques que fazem a nossa vida mais fácil.)

Também entro em pânico porque começo a racionalizar as coisas: vale a pena mencionar autores que não estão traduzidos para inglês; quais deles estão; quais é que a pessoa iria gostar, dadas as suas preferências, etc.? Hoje, ao lembrar-me do episódio, decidi fazer a lista dos autores que eu li em português no último ano (ordem completamente aleatória e incluí os autores brasileiros):

  • Eugénio de Andrade
  • Vera de Vilhena
  • Nuno Júdice
  • Almada Negreiros
  • Pedro Mexia
  • Agostinho da Silva
  • João Ricardo Pedro (este nome é muito difícil para mim porque troco a ordem)
  • Mário de Sá-Carneiro
  • Fernando Pessoa e heterónimos
  • Cecília Meireles
  • António Gil
  • Eduardo Prado Coelho
  • Chico Buarque
  • Clarice Lispector

Não pensem que li isto tudo a eito, pois leio vários livros ao mesmo tempo e alguns livros comecei há mais de um ano, outros ainda não terminei. Não sei porquê, mas ultimamente gosto bastante de ler poesia em português; a ficção é capaz de ser o estilo que menos prefiro e penso que a minha lista de nomes reflecte isso mesmo. Falei à K. de Camilo Castelo Branco, Eça de Queiroz, Mário de Sá-Carneiro, e Fernando Pessoa. Já sei que é um bocado cliché, mas pensei que a probabilidade de estarem traduzidos para inglês fosse alta -- a minha vida é toda probabilidades, habituem-se. E que queriam vocês? Que eu falasse em José Rodrigues dos Santos, um autor que eu tenho a certeza que foi traduzido para inglês? Não achei que ela fosse gostar...

Por falar em nomes, a K. perguntou-me qual o último nome de António Lobo Antunes para poder alfabetizar a sua estante correctamente. Eu disse "Antunes" porque entre "Lobo" e "Antunes" não há um hífen. (Por falar em Antunes, esse é o nome da personagem principal de "Romance", o livro de Almada Negreiros que li e do qual gosto bastante: o capítulo II é absolutamente sublime!) Depois perguntou-me acerca da lógica do nome, pois os espanhóis colocam o nome da mãe em último. Expliquei que nós somos ao contrário e, para além disso, depende do estatuto social da família: as famílias mais ricas dão nomes mais compridos aos filhos, logo pode haver vários nomes da mãe e vários do pai.

Estão a ver que as senhoras americanas são um bocado exigentes e conversar com elas é tipo uma prova oral. Bem, acho que devo ter tido um 9, pois fiquei de lhe dar, por escrito, recomendações de outros autores portugueses para ela ler. Se quiserem ajudar-me, a caixa de comentários está mesmo em baixo deste post. Obrigada, desde já...

10 comentários:

  1. O Júlio Dinis está fora de moda, mas tem belíssimas descrições das mudanças sociais no portugal rural depois do triunfo do Liberalismo do sec. XIX. Infelizmente, parece que é muito difícil de encontrar em inglês.

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    1. Por acaso, prefiro o Júlio Dinis ao Camilo e ao Eça. Atrevo-me a dizer que, tivesse ele vivido mais tempo, e seria reconhecido como o maior romancista português de sempre. Creio, infelizmente, que nunca foi traduzido em inglês. Há uma tese de doutoramento acerca dele, de um autor americano, cujo nome agora me escapa.

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    2. Suzanne Black [suzanne.black@oneonta.edu]
      autora de:

      "The Anti-Diagnostics of Júlio Dinis and the Medical Hubris of Egas Moniz. In The Art of Medicine in Iberian and Latin American Literature, ed. Patricia Novillo-Corvalan Forthcoming from Routledge, 2015",

      tem para breve a publicação da sua tradução de "Uma Família Inglesa", de Júlio Dinis:

      "An English Family"

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  2. Jorge de Sena, Rita! Além do mais, leccionou na Universidade de Wisconsin e na UC Santa Barbara (aliás, morreu em Santa Barbara). Escreveu um único romance, "Sinais de Fogo", inacabado (mas lê-se muito bem, mesmo assim). Ignoro, contudo, se está traduzido em inglês, mas arriscar-me-ia a dizer que sim.

    Quanto a outros, a dificuldade está realmente em saber-se se estão traduzidos, mas se quiseres incluir brasileiros, decerto o Jorge Amado está traduzido, e talvez o Guimarães Rosa. Portugueses traduzidos, talvez o Aquilino Ribeiro, o Fernando Namora, o José Régio (também autor de ficção), o Nuno de Bragança, o Carlos Oliveira, a Lídia Jorge, a Fernanda Botelho e a Ester de Lemos.

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  3. Para além do já referido Aquilino Ribeiro, José Rodrigues Migueis e Alves Redol (o primeiro para um retrato do Portugal da primeira metade do século XX urbano, o segundo para um retrato do Portugal da primeira metade do século XX rural).

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    1. Sim, o Miguéis deve estar traduzido em inglês,até por ter vivido nos EUA a maior parte da sua vida (e ter-se, inclusivamente, tornado cidadão americano). Já o Alves Redol duvido que tenha sido traduzido em inglês.

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  4. Aqui está um link para um site com muita informação sobre autores portugueses traduzidos para inglês (e respectivas obras). Alguns deles, apesar de óbvios, tinham-me escapado.

    E sim! Consta o José Rodrigues dos Santos e também o Miguel de Sousa Tavares (de cujo romance "Equador", para mim surpreendentemente, vi um dia uma recensão no Times Litterary Supplement).

    http://storberose.blogspot.pt/p/portuguese-literature-in-english.html

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