Filho de um pequeno agricultor, desde muito novo Baltazar Garzón levou à letra o conselho do pai: “para seres alguém, tens de ver o sol nascer”. Garzón não era apenas ambicioso, era obstinado. Várias vezes acusou publicamente os colegas de preguiça, falta de interesse e motivação. Era o mais controverso magistrado de Espanha. O magistrado das cruzadas.
Em 1988, aos 32 anos, tornou-se um dos mais jovens magistrados do todo-poderoso tribunal, a Audiência Nacional.
Os magistrados da Audiência Nacional são os mais poderosos de Espanha porque é aqui que vão parar os casos mais importantes. Nos estágios iniciais dos processos, não são apenas juízes, mas também promotores de justiça e polícias de investigação. Está por isso previsto um processo de recurso para evitar eventuais abusos de poder.
Logo em 1988, Garzón começou a dar nas vistas na sequência do famoso processo dos GAL (Grupos Antiterroristas de Liberación), montado e financiado pelo ministério do Interior dos governos socialistas de Felipe González.
Na guerra suja contra a ETA, foram atribuídas 27 mortes ao GAL, tendo sido entretanto provado que um terço das vítimas nada tinha a ver com os terroristas. Foi um escândalo enorme na altura, embora Gárzon nunca tenha conseguido provar uma ligação directa entre o GAL e Felipe González, que supostamente não estaria a par das operações. De qualquer maneira, os danos provocados ao governo socialista foram devastadores.
A coragem de Garzón era evidente, mas também se tornaram logo evidentes os seus defeitos: a vaidade, a arrogância e uma fraqueza fatal para chamar a atenção.
O astuto Felipe González percebeu bem a natureza do homem e convidou-o, em 1993, para número dois da lista do PSOE em Madrid, abaixo do próprio González. Foi uma jogada de mestre. Garzón, cego pela ambição e pela vaidade, caiu que nem um patinho e aceitou. Os socialistas, contra todas as previsões, voltariam a ganhar as eleições. Afinal de contas, tinham agora do seu lado o homem que lhes tinha feito a vida a negra, denunciado uma série de escândalos de corrupção.
A passagem de Garzón pelo governo socialista foi um desastre. Esperava que lhe dessem um cargo e poderes para o combate à corrupção. Enganou-se. Foi-lhe atribuído o título de “czar” antidroga, com ligações ao ministério do Interior.
Depois da passagem desastrosa pelo governo, a sua atracção pelos holofotes e câmaras de televisão não refreou. O processo que instaurou contra os crimes dos franquistas é mais um exemplo dessa sua vertigem mediática. Uma ideia abstrusa, diga-se de passagem, e pela qual está também a ser julgado em tribunal. Mas, como sempre, ele parecia adorar dividir a opinião pública espanhola ao meio.
Foi agora condenado em tribunal devido a abusos de poder. A sua carreira enquanto juiz está acabada. Não nos devemos espantar. Afinal de contas, a soberba e a vaidade são pecados capitais.
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