quinta-feira, 14 de junho de 2012

E pelo Euro, ninguém dá nada?

Ontem o governo alemão endividou-se a 6 anos com uma taxa de juro negativa. Não sei se será inédito, mas é, no mínimo, muitíssimo raro. O que quer isto dizer? Quer dizer que quem comprou a dívida, entregou ao estado alemão mais do que o valor que vai receber aquando do reembolso da dívida.

Aos alunos de economia é costume explicar que uma taxa de juro nunca pode ser negativa porque o credor tem sempre a opção de guardar o dinheiro dentro de um cofre, ou debaixo do colchão, o que tem uma rendibilidade maior do que emprestar a uma taxa de juro negativa. Numa frase, ao menos não perde dinheiro.

Como é então possível que a Alemanha tenha conseguido financiar-se a taxas negativas? Só encontro uma explicação. Os investidores consideram que ter Euros num cofre é mais arriscado do que ter dívida alemã. Ou seja, os investidores têm medo que o Euro estoire. Entre a incerteza do que vem a seguir ao euro e deter dívida alemã, preferem esta última. Cada vez mais os mercados temem o Euro.

PS Vejam os comentários abaixo, em especial os esclarecimentos do Paulo.

14 comentários:

  1. O medo, o logo o preço da divida de curto prazo, é a de que a Alemanha saia de euro, que remuneraria os investidores particularmente bem nesses estados do mundo. Daí o preço acima do par.

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  2. Não discordando, até porque o que escreve é compatível com o que eu escrevi, corrigia só uma coisa: Dívida a 6 anos raramente é considera como sendo dívida de curto-prazo. Esse epíteto costuma ser reservado para prazos inferiores a 1 ano.

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  3. Perdão. Terei confundido meses com anos. Mas se realmente forem 6 anos, então é completamente inédito. Talvez tenha sido engano do jornal de negócios.

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  4. Se foi erro, o erro não é do Jornal de negócios:

    "- (DE) Germany sold €770M in I/L 0.75% Apr 2018 BOBL; Avg Yield -0.310% v -0.400% prior; Bid-to-cover: 2.20x v 1.20x prior"
    -- http://www.tradethenews.com/US-Market-Update/MarketUpdate?storyId=1141066
    -- http://www.cmegroup.com/education/market-commentary/ir/2012/06/pre-open-equities_247.html

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  5. Pensando melhor, e depois de fazer umas pesquisas no Google, a notícia terá de ser falsa.

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  6. A conclusão só pode ser mesmo essa. Mas é estranho que investidores pensem assim. A única forma de eles terem retorno é receberem o investimento em marcos, sendo que o marco valeria mais do que o euro atual face a todas as moedas do mundo. É isso que conluí não é?
    Outra coisa, os leiloes de divida não começam a ser feitos a partir de zero para cima? Se a procura superar a oferta na tx 0 avançam para valores negativos?

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  7. É mesmo verdade, está no site do Bundesbank:
    http://www.bundesbank.de/Redaktion/EN/Downloads/Press/Pressenotizen/2012/2012_06_13_auction_result.pdf?__blob=publicationFile

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  8. Caro anónimo das 14:54.
    Há 14 anos que não trabalho com emissão de dívida soberana. Já não me lembro desses detalhes.

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  9. Obrigado pelos links Luís. Mas há aqui um detalhe que foi omitido. As obrigações omitidas são indexadas à inflação. Uma versão germâmica dos TIPS nos EUA. Os yields destas podem ser interpretadas como uma taxa de juro real. O preço acima do par pode ser explicado por uma subida das expectativas de inflação a prazo ou por um um aumento do prémio de risco associado à inflação. A explicação que deste acima sobre guardar o dinheiro debaixo do colchão aplica-se a emissões de títulos de dívida regulares (que são utilizados para calcular taxas de juro nominais). Ainda assim tem havido algumas emissões de dívida regular a taxas negativas, mas de prazos inferiores a 1 ano (emissões ocorridas no início deste ano).

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  10. Não percebi. Se está indexada à inflação, a inflação não é um risco, pelo que as expectativas e prémios de risco associadas à inflação não são considerações relevantes, não é?

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  11. Não estou muito por dentro do tipo de dívida indexada à inflação. Mas a minha interpretação segue do seguinte. Se essas obrigações tendem a reflectir a taxa de juro real, então a sua taxa de juro será (approx) igual à diferença entre a taxa de juro nominal e a soma da inflação esperada com um prémio associado à aversão à inflação. Daqui resulta imediatamente que um redução do prémio associado à inflação reduz a taxa de juro dessas obrigações. A mesma relação sobre as expectativas de inflação resulta do facto do indexante nessas obrigações ser um valor efectivo e não esperado. Assim uma descida das expectativas de inflação relativamente ao seu valor corrente (associado ao CPI) deverá reduzir o yield desse tipo de obrigações.
    (utilizando a eq de Fisher devemos ter qualquer coisa como i = r + inf_esperado + prémio -> yield(obrigações)=r+inf_esp-inf_efect+prémio = i - inf_efectiva)
    Ou talvez não seja exactamente assim. Como disse não estou por dentro destes instrumentos financeiros.

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  12. Vou pedir a um amigo que trabalha nestes mercados para aqui vir e explicar isto, caso tenha tempo.

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  13. Aguiar, quando falámos não tinha reparado que eram Inflation Linked bond, ou seja, a taxa que vês de -0.31% é a taxa real. Nestas obrigações o nominal vai sendo ajustado pela inflação pelo que na realidade o que vais receber em termos nominais (na prática o que conta) será positivo a não ser que a inflação acumulada durante estes 6 anos seja inferior a 0.31% anualizada. As obrigações normais tendem para 100% que é o seu valor nominal. Neste caso não. Na maturidade em princípio irão valer mais.

    Neste caso as expectativas de inflação são claramente baixas. No entanto adicionalmente todos os argumentos anteriores de aversão ao risco e medo que o euro acabe são válidos para justificar uma taxa de juro, mesmo que real, tão baixa.

    Gostaria ainda de acrescentar outra explicação pró cíclica e resultado da regulamentação bancária e do sector segurador (ramo vida). Tanto basileia3 nos bancos como a regulamentação específica das seguradoras e fundos de pensões incentivam a compra de obrigações (antes consideradas "risk free") vs acções. Nos bancos estas obrigações soberanas não "pesam" no capital. Nas seguradoras garantem o matching entre assets e liabilities.

    Deste modo, e tendo em conta a péssima performance das acções nos últimos anos, quanto mais sobem as obrigações, diminuindo por consequência os yields, maior é o incentivo regulamentar para as comprar.... e assim se criam bolhas!!!!

    Se o euro não colapsar no médio prazo (o meu cenário central sem sombra de dúvidas) vais assistir a mais uma "bolha" a estoirar.... mas neste caso vai ser a "bolha" dos Bunds!!!

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  14. Obrigado pelas explicacoes Paulo e anonimo. Caso contrario, so faria sentido se para os investidores no actual mercado comprar divida alema fosse a unica alternativa viavel a deter euros. E (ainda) nao chegamos a isso.

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