Dado que não conhecemos
nenhum estudo sobre o impacto das variações da TSU no emprego, motivo alegado
pelo governo na sua proposta, eu e quatro colegas decidimos fazer esse estudo
por nós próprios. O estudo é público, os dados são públicos, a programação
econométrica é pública. Tudo está disponível online para que o escrutínio
público seja feito.
O trabalho pode ser
encontrado aqui: Emprego e TSU: O impacto no emprego das alterações nas contribuições dos trabalhadores e das empresas
O sumário executivo com
a nossa motivação e com as conclusões a que chegámos segue em baixo.
Emprego e TSU: O impacto no emprego das alterações nas contribuições dos trabalhadores e das empresas
Sumário executivo
Nos últimos anos, vários
países reduziram as contribuições das empresas para a Segurança Social com o
objectivo de melhorar a competitividade externa das economias e estimular a
criação de emprego. Nesta linha, o governo português propôs uma descida da
contribuição das empresas para a Segurança Social ao mesmo tempo que aumenta a
contribuição dos trabalhadores, resultando num aumento das contribuições
totais. Mais precisamente, propôs uma diminuição da contribuição das empresas
para a segurança social em 5,75 pp (pontos percentuais) e um aumento de 7 pp
para os trabalhadores, o que resulta num aumento da contribuição total em 1,25
pp.
A originalidade da
proposta do governo português resulta de ambos os encargos incidirem sobre o
mesmo factor, ou seja, procura-se reduzir os custos de trabalho aumentando
globalmente os encargos sobre o trabalho. Esta novidade torna-a, do ponto de
vista intelectual e académico, numa questão muito interessante.
Com o objectivo de
estudar o impacto das variações dos descontos para a Segurança Social,
contribuindo para um debate informado, desenvolvemos modelos analíticos e
econométricos que nos permitem analisar a política proposta.
Do ponto de vista
teórico, demonstramos que o impacto da proposta de alteração da TSU depende
crucialmente dos pressupostos de partida, não sendo possível alcançar
resultados inequívocos relativamente aos efeitos positivos ou negativos sobre o
emprego.
Assim a análise dos
efeitos desta proposta do Governo terá, necessariamente, de ser empírica. De
acordo com o modelo empírico estimado, as alterações dos descontos para a
Segurança Social levam a que se perca cerca de 33000 empregos. Considerando um
intervalo de confiança de 95%, os nossos resultados sugerem que a perda de empregos
pode ser na ordem dos 68000. Por outro lado, na melhor das hipóteses o impacto
sobre a criação de emprego é praticamente nulo, apenas criaria 1000 empregos.
Concluímos também que na sequência das propostas
apresentadas, é de esperar um aumento do peso do desemprego de longa duração no
desemprego total.Luís Aguiar-Conraria
Fernando Alexandre
Pedro Bação
João Cerejeira
Miguel Portela
Muito interesante e deixo apenas uma sugestão.
ResponderEliminarApesar de discutirem os efeitos do aumento do custo do capital para as empresas no curto prazo, parece-me que não foi incluído qualquer variável desse género nas vossas regressões. Se essas restrições no crédito forem importantes factores na destruição de emprego e se as alterações na tsu tiverem como objectivo o alivio da situação de tesouraria das empresas, então o coeficiente que estimaram (para o tsu das empresas) poderá estar um pouco corrompido (sobrevalorizado).
Não sei se experimentaram, mas acho que existem dados no bce sobre a cedência de crédito às empresas. Seria interessante saber se as estimativas permaneceriam inalteradas com essa proxy adicional.
Vi agora mesmo aqui
ResponderEliminarhttp://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=579057
uma referência ao vosso trabalho.
Parabéns.
Espera-se que outros, académicos e não só, analisem o documento e se pronunciem.
Surpreenderam-me as notícias que ouvi esta tarde sobre a "exigência de Bruxelas" tendo em conta a anterior aparente desvalorização que o chefe da troica tinha feito relativamente à exigência da redução da TSU. Politicamente, esta "exigência de Bruxelas", aliás, já antecipada pelo imperdoável Constâncio, parece dar suporte a Gaspar. Com uma reunião do CE na próxima sexta-feira e as relações entre PSD e CDS a azedarem, a "exigência de Bruxelas" é, parece, incontornável. A menos que haja capacidade técnica e vontade política para demonstrar ao FMI (que parece ser do trio o mais insistente na redução da TSU para as empresas) a urgência em receber os 4,5 mil milhões parece desprezar os impactos negativos.
Percebo que a vossa análise se dirigiu ao impacto das medidas (redução/aumento da TSU)sobre o emprego.
Os mesmos pressupostos a que resultados conduzem, segundo o vosso modelo, sobre a evolução do PIB? E do défice? Podemos esperar uma resposta vossa também sobre estes indicadores críticos?
Muitos parabéns pelo vosso trabalho!
ResponderEliminarDeixo apenas uma sugestão e também uma curiosidade: os resultados do modelo seriam mais positivos se fosse introduzida uma variável que reflectisse um decréscimo em cerca de 5% no preço dos bens não transaccionáveis?
Interessante, pena é que na minha opinião a metodologia não seja a mais adequada.
ResponderEliminarOs métodos de Arellano e afins são para dados microeconómicos e assumem homogeneidade dos coeficientes entre agentes. Se isso não acontecer a heterogeneidade será captada no termo de erro e nenhuma instrumentação corrige isso levando a que os estimadores tendam para ZERO.
Contudo como não conseguiram resolver o problema vocês resolveram fazer uma regressão simples em primeiras diferenças (presumo eu, pelo que leio) para retirar os efeitos individuais.
Contudo o pecado original de modelo dinâmico apontado quer pela literatura de GMM (Arellano etc) ou cointegração, mantém-se, i.e., têm endogeneidade até porque a variável dependente é yt-yt-1 e uma das explicativas é yt-1.
Ou está-me a escapar algo ou o modelo não é válido.
Nota: Para os mais familiarizados uma regressão em primeiras diferenças tem erros autocorrelacionados, mas neste ponto os autores corrigiram utilizando a opção cluster.
Não muito anónimo (para quem souber).
"têm endogeneidade até porque a variável dependente é yt-yt-1 e uma das explicativas é yt-1."
ResponderEliminarNo apêndice encontra a regressão sem essa variável e com essa variável substituída por yt-2. Os resultados mantêm-se.
No comments.
EliminarNo primeiro caso omissão de variável relevante, no segundo caso continua a ter o pecado original que levou Arellano e companhia a desenvolver o método GMM. Não digo que os resultados estejam errados, considero é que as regressões não são fidedignas o suficiente.
Nota: Existem formas de tratar painéis com raízes unitárias...
Vamos lá ver, admitamos que a endogeneidade de yt-1 é um problema e que contamina os coeficientes estimados. Nesse caso, é bastante improvável que retirando a variável, os resultados sejam muito parecidos. Adicionalmente, o argumento para a endogeneidade de yt-1 é bastante mais fraco se aplicado a yt-2, pelo que resultados robustos a estas duas modificações, de facto, dão-nos confiança.
EliminarQuanto ao resto. Pura e simplesmente, com uma cross section tão curta como a nossa, apenas 25 países, as variáveis instrumentais não funcionam (isto apesar de ainda não termos desistido). Veja o estudo do FMI e veja o valor da estatística de Hansen. Se nós tivéssemos apresentado um trabalho com aqueles valores aí sim, seria uma brincadeira de crianças destruí-lo.
Uma nota, o nosso objectivo com este estudo não é afirmar termos descoberto a verdade acerca do efeito da TSU, mas sim desencadear um debate baseado numa análise transparente e tão rigorosa quanto possível dos dados disponíveis. Com os dados que temos (e que disponibilizámos a todos os que quiserem confirmar ou contestar ou nossos resultados) e os métodos que usámos, a nossa conclusão é aquela que apresentámos no texto. Quem tiver uma opinião diferente, que mostre o estudo em que se baseia e disponibilize o material para que nós e toda a comunidade o possamos também estudar. Parece-me um repto razoável.
PS Tenho dificuldades em lidar com este tipo de comentários feitos anonimamente. Parece-me que se quer atacar a nossa reputação profissional deve dar a cara. Anonimamente é demasiado simples, pode dizer os disparates que lhe apetecer que não corre riscos.
"Percebo que a vossa análise se dirigiu ao impacto das medidas (redução/aumento da TSU)sobre o emprego."
ResponderEliminarCerto. Pela simples razão de que esta medida foi apresentada como servindo para combater esse grande flagelo da sociedade portuguesa que é o desemprego.
"Os mesmos pressupostos a que resultados conduzem, segundo o vosso modelo, sobre a evolução do PIB?"
Impactos negativos, também, Está no apêndice.
"E do défice?"
Não estudámos esse efeito.
Ao primeiro anónimo. Obrigado pela sugestão. Para já não incluímos essas variáveis (há outras que também queremos introduzir) porque optámos por manter o nosso estudo próximo do do FMI. De qualquer forma, obrigado pela sugestão, muito provavelmente iremos incluí-la numa próxima versão.
ResponderEliminarLuis:
ResponderEliminarPercebi bem, estão a dizer que uma queda de 5% no preço do trabalho só aumenta a procura de trabalho em 1000 pessoas? 0,02%?
Se é assim, a elasticidade é ~0, e o que faz sentido é aumentar muito a TSU. Resolvemos a crise por esse lado.
Não sou economista. No entanto estou habituado a tratar, na física, com sistemas complexos e não lineares. São sistemas em que as previsões são difíceis e por vezes pequenas variações provocam resultados surpreendentemente diferentes.
ResponderEliminarHá uma coisa que me intriga, como conseguem fazer um estudo destes em 3 dias enquanto os economistas do governo precisaram de muitos meses para o fazer.
Mas já que há mais este modelo podem usá-lo para testar possíveis realidades virtuais. Na física é muitas vezes assim que se testam a validade dos modelos.
O que seria interessante seria então saber quais seriam os valores ideais da TSU, segundo o vosso modelo.
Se o modelo prevê estes resultados com estes valores da TSU quais são os resultados que prevê para outros valores. Sim, porque os valores existentes não são nenhuma verdade infalível divinamente revelada. Sugiro então que usem o modelo e que o façam indicar os valores ideais da TSU, para empresas e trabalhadores. Isso teria 2 utilidades, para além de ser um meio de testar a validade do modelo, se ele resistir ao teste também pode indicar pistas úteis para melhorar as taxas da TSU, quer estes valores sejam no sentido de subi-las, quer de descê-las.
leopardo
Eu aqui ajudo o Luís.
EliminarSe olharmos para o resultado a TSUe tem sinal positivo enquanto a TSUt negativo.
À letra seria então zero para os trabalhadores e infinito para as empresas. Obviamente que não é isto.
A questão é a seguinte: ou acredita-se no pressuposto de que o modelo é o correcto (inverosímil), ou aceita-se como uma sendo uma aproximação do modelo não linear através de uma expansão de Taylor de 1ª ordem. Neste caso os resultados são válidos localmente e o que pede é impossível (aliás o modelo teórico é não linear)
PS: Esta aproximação no estudo em causa levanta outros problemas, pq os valores das variáveis colocados no modelo são diferentes. Assim sendo a expansão de Taylor é feita sobre que ponto? Presumo, e não tenho a certeza, que seja sobre o ponto médio das observações. Nesse caso os resultados para Potugal serão tão mais válidos quanto mais próximos os valores imputados estiverem perto de média e a curvatura do modelo seja menor.
Contudo há formas mais rebuscadas de estimar considerando esse aspecto para apanhar toda a curva, e não apenas a aproximação local.
Caros comentadores,
ResponderEliminarestou num rodopio com os media e estou completamente rebentado. Amanhã tentarei responder às vossas questões, ok?
"Mas já que há mais este modelo podem usá-lo para testar possíveis realidades virtuais."
ResponderEliminarEm modelos económicos isso é difícil, seria fácil contestar o resultado. Eu diria que é o contrário. Em vez de se usar um modelo para analisar diversas políticas, é necessário, isso sim, usar diversos modelos com abordagens diversificados para estudar um único assunto. Os economistas falham tanto que alguma humildade metodológica é necessária. Neste caso, o nosso estudo partiu de dados para vários países ao longo de vários anos. Para fundamentar uma mudança de política, deveria ser complementado por um estudo com um modelo económico calibrado para Portugal, em que se tivesse em conta como o comportamento dos agentes económicos reage. E, naturalmente, um estudo aprofundado sobre a realidade empresarial e laboral portuguesa. Tipo, quais são as empresas que têm maiores custos de trabalho, qual o impacto desta medida nos custos das empresas exportadoras, etc. O nosso contributo é apenas um contributo para a discussão.
JCD, os impostos sobre o salário, com esta proposta, aumentam de 34,75 para 36%. (refiro-me apenas aos descontos para a SS)
ResponderEliminarCaro Luís e demais colegas,
ResponderEliminarSaúdo e agradeço a vossa iniciativa.
Muito embora o resultado emblemático do vosso trabalho tenha sido obtido por via de um modelo econométrico, julgo que se impunha que fosse complementado pelo enunciado da intuição económica que a ele subjaz, à semelhança do que costuma ser exigido em artigos científicos de economia.
Cordiais cumprimentos.
Bom dia.
ResponderEliminarCamilo Lourenço hoje no Negócios diz "A descida da TSU, como foi apresentada, suscita dúvidas? Sim. Mas mais pela perda do consenso social (ninguém quer transferir rendimentos para as empresas) do que por razões técnicas." http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=579641&pn=1
Parece-me que não leu o vosso estudo. Ou se leu e não concordou, é dos poucos que defende as razões técncas da medida, mas não apresenta dados concretos que a suportem.
Também este estudo de Aguiar-Conraria et al não é capaz de se impor em termos técnicos na medida em que não fornece um enunciado do mecanismo económico, em termos de intuição económica, que procure explicar a pertinência do resultado econométrico. Recordo que as revistas cientificas internacionais costumam exigir a explicitação de tal intuição económica, de molde a se poder justificar a pertinência e razoabilidade dos resultados teóricos e econométricos. Não obstante, considero empenhada a tentativa de Aguiar-Conraria e co-autores.
EliminarMelhores cumprimentos.
Isto realmente de comentar anonimamente é muito fácil. Caro anónimo, só eu, 1 dos 5 co-autores, tenho 2 duas dezenas de artigos publicados em revistas científicas internacionais, com refereeing. Sei muito bem o que é publicar numa revista internacional.
EliminarDe qualquer forma, deixemo-nos de tretas, a função deste trabalho não é o de ser publicado numa revista internacional, é o de lançar o debate em Portugal. Se quer fazer comparações, compare com os trabalhos de consultoria que o governo encomenda e paga a peso de ouro. Venha-me dizer que este trabalho é inferior a esses. Olhe, comece por comparar com o estudo sobre a desvalorização fiscal apresentado no ano passado.
E no fim, voltamos ao mesmo, que é o que Cristiano Lopes diz na última frase: onde está o estudo técnico que suporte estas medidas? Gostava de ver tão valoroso estudo, com certeza que preparadinho para ser submetido à American Economi Review.
Eliminar"na medida em que não fornece um enunciado do mecanismo económico, em termos de intuição económica"
EliminarPosso estar a dizer um enorme disparate (se for o caso, os autores do estudo podem facilmente corrigir-me), mas parece-me que o mecanismo essencial (se percebi bem o estudo) é:
- Se a rigidez salarial for sobretudo ao nivel dos salários nominais iliquidos, esta medida vai baixar o custo total do trabalho (via redução do encargo da entidade patronal), e por aí reduzir o desempregeo
- Se a rigidez for sobretudo ao nivel dos salários liquidos, esta medida vai aumentar o custo total do trabalho (já que, como o aumento da TSU do trabalhador é menor que a redução da TSU patronal, para o mesmo salário liquido recebido pelo trabalhador, a empresa vai ter que pagar mais), e por aí aumentar o desemprego
E a partir daí foi usar a econometria para determinar qual dos efeitos é mais forte.
De novo, repito que posso ter percebido mal o estudo, mas fiquei com a ideia que a "intuição subjacente" é essa.
Miguel, obrigado pela ajuda. Foi isso e foi um pouco mais. Mostrámos também que relaxar as imensas hipóteses simplificadoras do modelo levaria a efeitos ainda mais difíceis de prever.
EliminarO que o anónimo está a querer dizer, penso eu, é que o modelo econométrico a estimar deveria ter sido uma derivação do modelo teórico. (O que é tudo menos consensual na disciplina, porque apesar de facilitar a interpretação dos resultados, também é verdade que contamina a análise empírica com os pressupostos irrealistas da teoria)
Caro Luís,
ResponderEliminarGostaria de, em primeiro lugar, lhe garantir que a minha intenção, com os meus comentários, não é a de denegrir ou de atacar o seu trabalho, o qual considero um documento de grande valia enquanto promotor primeiro da discussão pública informada da questão em escrutínio. Nesse sentido, agradeço-lhe muito a si e a seus co-autores pelo trabalho. O que a mim me anima nesta minha intervenção é tão-somente - creia-me totalmente - a de eu próprio me querer esclarecer e convencer da pertinência do vosso resultado.
Verifico que subscreve a análise avançada por Miguel Madeira (a quem agradeço). Na sequência, gostaria de colocar as seguintes perguntas:
1. parece resultar do vosso estudo e das palavras de Miguel Madeira que o efeito da rigidez a nível dos salários líquidos irá sobrejugar o outro efeito mencionado. Então, a minha pergunta é a seguinte: o que o leva a pensar que assim será, estando Portugal numa situação de desemprego agudo? Não seria antes mais plausível esperar-se o contrário, tendo presente a enorme escassez de emprego?
2. explica o Luís que mostraram também que "relaxar as imensas hipóteses simplificadoras do modelo levaria a efeitos ainda mais difíceis de prever". Em face desta afirmação, gostaria de lhe perguntar: o que o faz pensar que ignorando o relaxamento das referidas hipóteses simplificadoras e optando por confiar-se a um modelo econométrico, o faz sentir-se em posse de um meio de predição de maior e mais confiável capacidade preditiva?
Com consideração e estima.
OK, obrigado pelo comentário e pelo esclarecimento que prestou.
EliminarPergunta 1: O cenário que eu considero mais realista é o 3, para ser sincero. Sei que há empresas que vão ficar entre o cenário 2 e o 3, o que há partida implica que o desemprego aumente. Acredito também que haja empresas que fiquem pelo 1. Ou seja, não consigo prever qual o efeito total. Adicionalmente, quando se relaxam as hipóteses simplificadoras vê-se que tudo pode mesmo acontecer. Assim, teoricamente, eu não tiro conclusões.
Pergunta 2: Repito o que escrevi antes. Em economia, diferentes abordagens levam a resultados diferentes. Uma mudança de lei desta magnitude, (transferência de rendimento na ordem dos milhares de milhões de euros) tem de ser muito bem fundamentada. É importante que se façam estudos seguindo abordagens muito diferentes. Dou exemplos, um modelo DSGE que esteja imune à crítica de Lucas, um estudo aprofundado do tecido empresarial português, para ver onde estão os sectores mais trabalhos intensivos, um parecer cuidado de vários constitucionalistas que garanta que esta lei passa no TC, etc, etc.
Os nossos resultados estão aí, mas não pretendemos ter a última palavra sobre o assunto. Simplesmente não aceitamos que transferências de rendimento desta magnitude sejam feitos na base do “acho que” e “é minha convicção que”. Tem de ser feito com base em estudos escrutináveis.
Mais uma coisa, um trabalho feito em 4 dias exige uma âncora. Não é possível fazê-lo a partir do nada. A nossa âncora foi o estudo do FMI que citamos no trabalho e que é por toda a gente citado para defender a desvalorização fiscal (descida da TSU e subida do IVA).
EliminarQuer isto dizer que começámos com um modelo que sabíamos ser favorável à desvalorização fiscal. A única coisa de relevante que alterámos foi considerar a TSU paga pelo trabalhador em vez do IVA. Atá a base de dados é a mesma.
Ou seja, se o nosso estudo não serve para contestar o impacto desta desvalorização, porque tem algum erro metodológico, então o estudo que mais vezes é citado para defender a desvalorização fiscal também não é válido. Tão simples quanto isso.
Caro Luís,
ResponderEliminarAgradeço a amabilidade que teve em responder às minhas perguntas. Permita-me que faça de seguida uns breves comentários às suas respostas.
Se do ponto de vista teórico não tira conclusões, o que lhe permite então confiar no modelo econométrico como produtor de conclusões fiáveis, sabendo -- como aliás manifesta -- da existência da famosa Crítica de Lucas que se aplica ao seu modelo econométrico? Existe alguma idiossincrasia no caso vertente que atenue a força da Crítica de Lucas?
É inteiramente verdadeiro o que afirma de que, em economia, pegando em abordagens diferentes pode atingir-se resultados diferentes (e até antagónicos). Mas, para os estudos técnicos terem algum valor enquanto iluminadores da prática, uma das abordagens vai ter de ser eleita como a mais razoável, pois, de contrário, atentamos contra o propósito que enuncia (e que eu subscrevo) de que «Simplesmente não aceitamos que transferências de rendimento desta magnitude sejam feitos na base do “acho que” e “é minha convicção que”.»
É claro que compreendo que 4 dias de trabalho empenhado e diligente de cinco investigadores não é talvez suficiente para estudar questão tão cheia de complexidade. E compreendo ainda que tenham recorrido a um trabalho-âncora para lançarem a vossa investigação. Porém, o trabalho a que recorrem não foi ainda publicado em nenhuma revista científica internacional, ou seja, não transitou ainda em julgado na comunidade dos pares científicos. É certo que se trata de um estudo recente (e que ainda não pôde ser publicado), é certo que pode ser um trabalho muito badalado nos meios informais, mas a verdade é que o Google Scholar apenas regista duas únicas citações do trabalho mencionado, sendo que uma delas é uma auto-citação.
Mais uma vez, o que aqui deixo escrito não visa atacar o seu trabalho - procuro ser sempre uma pessoa construtiva -, mas antes o esclarecimento de mim próprio.
Muito obrigado.
"Existe alguma idiossincrasia no caso vertente que atenue a força da Crítica de Lucas?"
ResponderEliminarNão. O modelo econométrico é vulnerável à crítica de Lucas. Mas pensando a sério sobre o assunto, como tenho feito nas últimas semanas, penso que a crítica de Lucas reforça os resultados: as alterações do comportamento dos agentes reforçará os impactos negativos da política. Por outro lado, modelos que respeitam a crítica de Lucas têm eles próprios imensos problemas, como certamente sabe, e estão longe de ser consensuais. Talvez volte a isto para a semana.
"Mas, para os estudos técnicos terem algum valor enquanto iluminadores da prática, uma das abordagens vai ter de ser eleita como a mais razoável, pois, de contrário, atentamos contra o propósito que enuncia (e que eu subscrevo) de que «Simplesmente não aceitamos que transferências de rendimento desta magnitude sejam feitos na base do “acho que” e “é minha convicção que”.»"
Para eleger uma das abordagens como mais razoável é preciso conhecê-las, não acha? Manifestamente não é o caso. Como quer que escolha se não são conhecidas? Junte-se ao meu apela para o governo publicar os estudos (de preferência submetidos para publicação na AER) Para já, a única abordagem conhecida é esta. É uma chatice. Mas, mesmo assim, não concordo. Para uma transferência desta magnitude, é bom que todas as abordagens coincidam nos resultados. Se não coincidirem, passos mais pequenos são necessários. O próprio Gaspar teorizou sobre isto: em ambientes de incerteza devem dar-se pequenos passos.
"o trabalho a que recorrem não foi ainda publicado em nenhuma revista científica internacional, ou seja, não transitou ainda em julgado na comunidade dos pares científicos. É certo que se trata de um estudo recente (e que ainda não pôde ser publicado), é certo que pode ser um trabalho muito badalado nos meios informais, mas a verdade é que o Google Scholar apenas regista duas únicas citações do trabalho mencionado, sendo que uma delas é uma auto-citação."
Pois, mas eu estou-me nas tintas para o 'Google citations' bem como para as revistas internacionais. Este é o estudo usado pelo FMI para pressionar governos a adoptar a desvalorização fiscal. Tanto quanto sei, já no ano passado, resultados preliminares deste estudo foram usados para pressionar o governo.
Mas, admitamos por momentos que o estudo do FMI está mal feito e que é uma merda e que nós fazíamos uma estudo muito diferente. Que credibilidade tinham uns obscuros professores do Minho (e de Coimbra) para utilizar um modelo muito diferente? Se apresentássemos este tipo de resultados imediatamente seríamos confrontados com o estudo do FMI e dir-nos-iam que estávamos a escolher um modelo que desse os resultados que queríamos, ou não é verdade?
PS Apesar da cordialidade desta conversa, e tendo o nosso estudo o objectivo explícito de obrigar quem defende a política proposta a mostrar os seus próprios estudos, bem como os dados que o suportam, lamento, mas não vou continuar esta conversa com um anónimo.
PPS Não me venham com tretas de isto ser um referee report anónimo. Nos referee reports há um editor que dá a cara pelos relatórios e em quem eu confio.
Muito obrigado, Luís, pela sua resposta. Compreendo perfeitamente que não queira prosseguir a conversa, mas a verdade é que eu próprio já me encontro esclarecido quanto ao seu pensamento e argumentação, pelo que é mesmo de terminar a discussão.
ResponderEliminarSó duas pequenas notas:
1. já houve aqui uma escolha sua por uma abordagem em detrimento de outra - escolheu o modelo econométrico em detrimento do modelo teórico;
2. foi o Luís (e não eu) quem mencionou que que o estudo do FMI era muito citado ("Ou seja, se o nosso estudo não serve para contestar o impacto desta desvalorização, porque tem algum erro metodológico, então o estudo que mais vezes é citado para defender a desvalorização fiscal também não é válido. Tão simples quanto isso.")
Fico ansiosa por ver a elaboração que promete de que a Crítica de Lucas ainda reforça os seus resultados!
"1. já houve aqui uma escolha sua por uma abordagem em detrimento de outra - escolheu o modelo econométrico em detrimento do modelo teórico;"
EliminarMesmo o modelo teórico do FMI dava resultados ambíguos.
"2. foi o Luís (e não eu) quem mencionou que que o estudo do FMI era muito citado"
Perdão, agora percebo melhor o seu comentário anterior, mas não era isso que quis dizer. Eu quis dizer que era citado por quem defende a desvalorização fiscal e por quem propõe estas políticas em concreto. Não me estava a referir a citações na literatura académica.
"Fico ansiosa por ver a elaboração que promete de que a Crítica de Lucas ainda reforça os seus resultados!"
Calma, eu disse que talvez voltasse ao assunto para a semana, não é uma promessa, é, na melhor das hipóteses, uma declaração de intenções.
Caro Luís,
ResponderEliminarApesar de termos dado por encerrada a nossa conversa, não resisti a dizer-lhe que é o próprio Luís que, sem disso estar consciente, não acredita no resultado do seu modelo econométrico. Passo explicar.
Quando escreve
"O cenário que eu considero mais realista é o 3, para ser sincero. Sei que há empresas que vão ficar entre o cenário 2 e o 3, o que há partida implica que o desemprego aumente. Acredito também que haja empresas que fiquem pelo 1. Ou seja, não consigo prever qual o efeito total.",
no fundo está a dizer que os valores dos parâmetros do modelo econométrico vão alterar-se de forma imprevisível. Deste modo, as conclusões que do modelo econométrico extraem tornam-se não sustentadas -- na realidade naive.
Melhores cumprimentos.
Agradeço este comentário essencialmente por me permitir corrigir um erro grosseiro que cometi lá em cima e em que não tinha reparado: "à partida" e não "há partida", evidentemente.
EliminarPS Podia também deixar o seu comentário crítico ao estudo e ao modelo que prevê a criação 55000 empregos com estas alterações à TSU. Ficar-lhe-ia bastante agradecido.