Esta
semana, Silva Lopes, um homem de esquerda, teve uma intervenção
corajosa. Diz ele que, embora lhe custe muito que lhe cortem na pensão, não vê
outra solução para a “sustentabilidade” (desculpem lá o palavrão) do sistema.
Os “grisalhos”, acrescentou, não podem continuar a “asfixiar os mais novos”,
que, como é sabido, terão, na melhor das hipóteses, direito a uma pensão
simbólica. Em 2001, Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso anunciaram uma reforma do
sistema para 50 anos. Em 2007, Vieira da Silva anunciou outra reforma, desta
vez para, salvo erro, 30 anos. Em ambos os casos, partiu-se de pressupostos irrealistas,
como o de taxas de crescimento médio anual de 3% e 2%, respectivamente. Em
2007, a Polónia fez também uma reforma da "segurança social", avançando para um
sistema de capitalização: cada um desconta, de forma obrigatória (presumo),
para si e as pensões actuais são cobertas com dívida pública. Em Portugal,
continua-se com um sistema redistributivo, em que os mais novos pagam as
reformas dos mais velhos, contando que, quando chegar a sua vez, alguém pagará
as suas. Já sabemos que isso não vai ser possível; os números, a começar pelos
da demografia, não deixam margem para dúvidas a esse respeito. A questão é:
devem ser os mais novos a suportar o grosso dos custos, pagando a reforma dos
mais velhos e poupando (se tal for ainda possível) para a sua velhice, ou devem
os sacrifícios ser repartidos pelas diferentes gerações? Eu, tal como o Silva
Lopes, não tenho dúvidas sobre qual é a solução mais justa.
"cada um desconta, de forma obrigatória (presumo), para si e as pensões actuais são cobertas com dívida pública"
ResponderEliminarMas ainda não se percebeu que é justamente porque não se quer tratar as pensões actuais como divida (basicamente, quer que não se note o calote) que se fala de "cisma grisalho"?
Já agora, tanto faria o sistema ser operacionalmente de capitalização como de redistribuição, se os valores a pagar tivessem unicamente a ver com as contribuições individuais e taxas efectivas de crescimento/cobertura. Mas mesmo nesses casos, como tratar as pessoas que, por uma carreira contributiva pequena com grandes períodos de desemprego tem uma auto-capitalização muito baixa?
“ (…) como tratar as pessoas que, por uma carreira contributiva pequena com grandes períodos de desemprego tem uma auto-capitalização muito baixa?”
ResponderEliminarUma sociedade que deixa cada pessoa escolher livremente quanto deve poupar para a reforma está, sem dúvida, a arranjar uma carga de problemas e sarilhos para o futuro. E esta observação decorre apenas de um conhecimento mínimo da história e da realidade. Ou seja, mesmo num sistema de capitalização, o Estado tem de intervir, obrigando as pessoas a poupar, caso contrário, estará certamente a arranjar e a transferir problemas gravíssimos para o futuro. Em relação à questão que coloca, podemos socorrer-nos da experiência do Chile, idealizada pelo economista José Piñera no final dos anos 1970 e implantada no início dos anos 1980 – entretanto, dado o seu enorme sucesso, o modelo foi copiado por vários países, a começar por vários da América latina. Em que consistia esse modelo? Basicamente, foi oferecida a hipóteses aos trabalhadores chilenos de recusar o sistema de pensões estatal. Caso optassem pelo novo sistema, em vez de descontarem do seu salário, contribuíam com quantia equivalente (10% do seu salário) para uma “Conta de Reforma Pessoal” em seu nome, gerida por empresas privadas e concorrentes. Ao atingir a idade da reforma, poderiam levantar o dinheiro. Bem, sobra o problema dos “trabalhadores ocasionais”, os que não têm um emprego regular, a tempo inteiro. Para esses, está prevista uma pensão mínima a pagar pelo governo, desde que as pessoas tenham trabalhado pelo menos 20 anos. Para além disso, há também uma pensão de “Solidariedade básica”, para quem não preenche o requisito dos 20 anos. Enfim, há várias soluções possíveis, como está é que não dá: o método dos “pagamentos repartidos” destrói a cultura da poupança e a ligação entre as contribuições e os benefícios, entre o esforço e a recompensa; a prazo, como se pode ver, o resultado é desastroso.
Caro J C Alexandre,
ResponderEliminarPor ser extenso (excede o número de caracteres consentidos pelo blog) solicito-lhe leia aqui o meu comentário:
http://aliastu.blogspot.pt/2013/05/carta-aberta-um-futuro-pensionista.html
Caro Rui Fonseca
ResponderEliminarAntes de mais, obrigado pelo seu comentário. Confesso que sobre esta matéria tenho mais dúvidas do que certezas, ou melhor, sinto-me um pouco como o José Régio quando escreveu: ”Não sei para onde vou – Sei que não vou por aí!”. Há, para mim, todavia, duas questões claras. Primeira, o Estado não pode deixar ao livre-arbítrio de cada um a gestão das suas poupanças para a reforma. Neste ponto, até a maioria dos economistas liberais ou neoliberais (seja lá o que isso for) dirá o mesmo, por um motivo simples: não são parvos e sabem perfeitamente, pela experiência da realidade, que o seu famoso pressuposto da “racionalidade” das pessoas tem os seus limites – aliás o José Piñera, que mencionei no comentário acima, era considerado um “Chicago boy” (apesar de em bom rigor ter estudado em Harvard e não em Chicago onde pontificava o célebre Milton Friedman). Segunda, o sistema redistributivo, que vigora actualmente em Portugal, conduz a médio e longo prazo a resultados catastróficos e, em meu entender, os princípios que lhe subjazem são errados, porque, repito, destroem a cultura da poupança, a ligação entre as contribuições e os benefícios, entre o esforço e a recompensa.
Percebo as suas dúvidas sobre a viabilidade, em Portugal, da implantação de um sistema de capitalização, desde logo porque, como diz, e concordo, é difícil acreditar no Estado, nada nos garantindo que no futuro não proceda a expropriações (é esse o termo) dos fundos de pensão.
Acho que este tema deve ser discutido abertamente, e as reformas não devem ser feitas de forma encapotada, como a última de Vieira da Silva, em que claramente foram omitidas as suas implicações nas futuras pensões dos mais novos. Só por isso ainda bem que o Paulo Portas falou em “cisma grisalho”, embora, admito, não fosse essa a intenção dele.
O problema é que os baby-boomers do pós-guerra chegaram às reformas com um sistema feito pelos pais de toda esta sociedade ocidental e não têm culpa se o céu agora lhes cai em cima. Tal como nós, os pós-pós-baby-boomers não fizemos nada para não virmos a ter reformas...
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