Em 1975, Charles Goodhart, conselheiro do Banco de Inglaterra, enunciou uma regra sobre os efeitos da intervenção do Estado: any observed statistical regularity will tend to collapse once pressure is placed upon it for control purposes. Esta regra, que ficaria conhecida como a Lei de Goodhart, costuma ser enunciada da seguinte forma: when a measure becomes a target, it ceases to be a good measure. Arriscar-me-ia a enunciar esta lei de uma forma mais aplicada aos nossos problemas:
Mal um indicador económico se torna um objectivo de Política Económica, imediatamente esse indicador perde a sua relevância enquanto instrumento condutor de política.
Pelo menos desde o Tratado de Maastricht, assinado em Fevereiro de 1992, que o rácio da dívida pública face ao PIB tem um valor político de referência: 60%. A Lei de Goodhart diz-nos que a partir desse momento o valor contabilístico da dívida pública deixou de representar o seu verdadeiro valor.
Maquilhar de contas públicas tem, pelo menos, dois problemas. O mais óbvio é o da falta de transparência: contabilizada ou não, a dívida pública existe. Mas há um problema mais subtil: ao não usar a sua forma preferencial de financiamento a crédito ― a emissão de títulos de dívida pública ―, o Estado recorre a esquemas mais onerosos. O uso e abuso das parcerias público-privadas, inaugurado com a construção da Ponte Vasco da Gama, é um dos mais comuns. Mas há outros. Por exemplo, a compra de submarinos em leasing permitiu evitar, temporariamente, a contabilização dessa dívida.
Quando se espoletou a crise financeira, em 2007-2008, Portugal apresentava, oficialmente, uma dívida pública de 70% do seu PIB. Valor bastante razoável, se verdadeiro. Infelizmente, havia dívida escondida em diversas gavetas, desde empresas públicas a regiões autónomas passando, evidentemente, por diversas PPPs. Assim, ficámos sujeitos àquilo a que chamamos self-fulfilling prophecies, profecias auto-sustentadas, ficando à mercê da crise das dívidas soberanas que assolaria a Europa pouco depois e que, em Portugal, desembocaria na chegada da Tróica.
Introdução ao meu artigo deste mês nos Cadernos de Economia.
PS Reparei agora que este número dos "Cadernos de Economia" conta com a colaboração de três associados da Destreza: eu, o João Cerejeira e o Manuel Cabral. É quase como se fôssemos uma delegação blogosférica da Ordem dos Economistas.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Não são permitidos comentários anónimos.