quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Procuram-se líderes...

"Only when the tide goes out, do you discover who's been swimming naked."
Warren Buffett
Revoltei-me ao ler esta notícia acerca da demissão em bloco dos chefes das urgências do hospital Garcia de Horta. A demissão numa altura de crise, em que a vida de pessoas está em risco, vai contra tudo em que acredito. Acho uma demonstração clara de falta de profissionalismo. É muito fácil estar à frente de organizações em tempos normais, quando as coisas são previsíveis. Quando se entra em situações de crise, é que se vê quem andava a nadar nu, como dizia o Warren Buffett. O que me incomoda ainda mais é que um surto de gripe de gravidade acima do normal não é uma situação extrema. Se tivesse havido uma crise pior, teria sido uma razia.
Sim, reparei que a demissão é pescadinha de rabo na boca: “Não haveria (recuo no pedido de demissão) se as condições difíceis não fossem reversíveis, mas as condições são reversíveis”. Não compreendo esta necessidade de criar estes dramas todos quando a vida das pessoas está em causa. Mas lá está, como falávamos eu e o Zé Carlos, em Portugal é previsível que o sistema encalhe.

5 comentários:

  1. Isto não tem nada a ver mas:
    Variação homóloga de Janeiro( a 28 de Janeiro, - 3dias): + 1196 mortos em 2015 do que em 2014, aproximadamente + 10%.

    Em Dezembro, em relação a 2014: +2248 mortos...

    Pura coincidência e só más línguas... Não que estes oportunistas do Garcia de Orta não sejam mesmo oportunistas... mas que Paulo Macedo não passe pelos pingos da chuva

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  2. Cara Rita,

    Neste caso, discordo. É procedimento "comum" (passo o termo) este género de demissões em regime hospitalar para forçar situações. E é normal porque é altamente vísivel mas tem pouco impacto em termos de funcionamento hospitalar. Os directores de serviço demissionários ficam em "funções" até serem substituídos e normalmente são-no com celeridade, visto que são nomeados internamente. A administração é que fica mal...

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  3. Carlos, eu detesto todos estes dramas e todo este fogo de artifício--é white noise, como se diz em estatística. Acho um desperdício de tempo de antena e uma falta de respeito. As pessoas comportam-se como se o país fosse um circo e toda a gente acha isso normal. É falta de profissionalismo. Acho incrível que só se note que não há condições de trabalho e se ameace a demissão quando a situação fica crítica--será que estes líderes não têm planos de contingência para situações críticas ou o plano de contingência é a demissão em bloco?

    O público tem de exigir que as pessoas se comportem à altura. Isto é um comportamento medíocre e a mediocridade ser comum não é desculpa para ser aceitável nem para se exigir que deixe de ser comum. A comunicação social tem grandes culpas nisto porque é cúmplice ao apenas relatar os dramas e não investigar porque é que o sistema falhou.

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  4. Como escrevi, acho normal. Por definição, os directores de serviço são solidários com a administração do hospital e cabe-lhes implementar o bom funcionamento do seu serviço, de acordo com o plano da direcção. Se não concordam com a maneira como o hospital é administrado, devem fazer as suas queixas à administração. Caso esta nada faça, legalmente só lhes resta a demissão. Uma demissão em bloco dos directores de serviço deveria, em teoria, levar a uma demissão da adminstração por parte do Ministério, mas raramente acontece. O equivalente seria uma demissão em bloco dos Ministros de um Governo.

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  5. Olá Rita
    Concordo com o espírito do teu cometário. Em tempos difíceis devemos exigir mais de todos e a demissão ou o cruzar de braços não é solução. Mas também acho que ir deixando degradar situações sem protesto (algo que tem acontecido muito em Portugal) também ajuda a que se deixe as coisas degradar às vezes a pontos inaceitáveis.
    Chamo à atenção para o que hoje é uma situação que se coloca em muitos casos de instituições públicas, incluindo hospitais. Há leis que obrigam e os responsáveis a determinados procedimentos médicos, de contratação, de direito do trabalho, etc. Há outras, hoje vindas do ministério das finanças que criminalizam actos tão simples como comprar materiais sem autorização, ou contratar para o quadro uma pessoa que de acordo com a lei tem esse direito. Um médico pode ser responsabilizado (e estão a ser crescentemente responsabilizados) por negligência médica, e isso pode ser-lhe imputado criminalmente. Eu pergunto se um familiar teu ou de outra pessoa for tratado de forma negligente, se considerarás não colocar um processo ao médico que o atendeu mal, por ele dizer que naquela urgência deviam estar mais médicos e por isso tinha de ver os doentes todos a correr, e que nestas condições o valor médio de erros é de 12,7% com uma variância de X, e que aquela morte por negligência está dentro desta distribuição estatística, a menos de dois desvios padrões, e por isso é claramente uma morte que deve ser imputada a quem fez o orçamento? É que ninguém vai discutir isto nestes termos. Eu já há muito tempo que me interrogo sobre qual a responsabilidade que se pode atribuir a um médico nas decisões que toma na 25ª hora de trabalho seguido, quando fazem escalas de 24 horas seguidas de turnos de 8h. É que para guiar um TIR não se pode conduzir mais de 4 horas seguidas, nem deixar de ter pausas longas ao fim de 8 horas. Como operar um doente requer menos capacidade e atenção, um gajo de directa está perfeito.
    No final pergunto assumias estar a gerir uma urgência em que podias ser responsabilizada por mortes por negligência que sabias que iam acontecer? Ou em caso de ruptura tomavas decisões pelas quais podias ser despedida, responsabilizada financeiramente ou até criminalmente, como decidir colocar pessoas adicionais e comprar medicamentos, consumíveis, etc, sem esperar por autorização administrativa, com a vaga desculpa esfarrapada de que está gente a morrer nas tuas mãos.
    Eu já estive a dar aulas em condições em que para imprimir uma folha ou para fazer fotocópias tive de sair da universidade perder meia hora a ir a centros de fotocópias, pagando do meu bolso, etc. Já estivemos com o aquecimento a semifuncionar, e outras coisas que tal. Sempre fiz o meu melhor tanto aí como noutros lados, mesmo quando as circunstâncias claramente não eram o que devia ser. Mas é muito diferente passar frio, perder um tempo estúpido a fazer uma tarefa simples porque se andam a racionar fotocópias, etc, do que ter pessoas em risco de vida e ter de as tratar sem ter condições razoáveis.
    Quando decidiram cortar no aquecimento do meu gabinete, levei umas meias e uma camisola melhor, não entrei em greve ou em protesto.
    Mas se cortassem o aquecimento a um doente meu, eu partia a loiça toda...
    E é por isso que não atiro pedras a estes médicos. Guardo-as para outros.

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