segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Empreendedorismo à portuguesa

Está na moda há algum tempo o termo “empreendedorismo”. Confesso que percebo pouco ou nada do assunto e que já ando um bocado enjoado com esse paleio. Segundo os teóricos (sim, já há teóricos e cursos e tudo sobre a coisa), cada português deve criar o seu próprio emprego. Bem, isto é tão absurdo que nem vale a pena comentar. Mas há, parece-me, um “empreendedorismo à portuguesa”, muito associado ao individualismo. A cena é mais ou menos assim: um tipo tem uma ideia brilhante e, sozinho, monta um negócio e a seguir ganha carradas de dinheiro. Eu, repito, que não sou especialista no assunto, vejo, assim de repente, dois ou três problemas nesta visão.
Primeiro, ideias já as há a pontapé, toneladas delas, basta ir a alguns sites (tipo trendwatching ou entrepeneur) e é só escolher à vontade do freguês. Segundo, sozinho ninguém consegue fazer nada, de maneira que talvez fosse melhor começar por discutir a “ideia brilhante” com alguém com mais experiência no ramo. Só que o empreendedor português, do tipo “a mim é que não me enganam”, pensa logo: “Eu falar na minha ideia com alguém do ramo, tás maluco, roubavam-ma logo”.
E, assim, imagino que haja milhões de portugueses, cada um para seu lado, com milhões de ideias brilhantes, iguais a milhões de ideias de outros portugueses, guardadas e bem guardadas, não vá alguém roubá-las.
Não, o mais difícil, parece-me a mim, é conseguir formar uma equipa de pessoas motivadas e ser capaz de ir bater a uma data de portas para vender uma ideia, que não precisa ser nada de genial ou original, basta que resolva um problema qualquer. Mas isto sou eu que o digo, pobre leigo, que não percebe nada do assunto. Aliás, se percebesse…

4 comentários:

  1. Dizes tu e digo eu: pois o problema é mesmo a falta de cooperação.

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    1. Acho que é mesmo esse o ponto, Rita. Uma vez ouvi que em São Paulo, as empresas portuguesas que nos últimos anos têm lá investido, andam cada uma para seu lado, muitas vezes os empresários portugueses que lá estão nem se conhecem; em contrapartida, e no mesmo período, os alemães constituíram logo uma associação, partilham recursos, como instalações, staff, serviços jurídicos, etc. Não sei, há um grande nível de desconfiança na nossa sociedade, há com certeza uma explicação histórica para isso, mas que é mau para os negócios, parece-me evidente.

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  2. Falta de cooperação, de associativismo, sim é um problema crónico; mas temos outro ainda mais profundo e inamovível...a cultura das capelinhas, dos feudozinhos, que estão por toda a parte, que vem das profundezas da ancestralidade e, paradoxalmente, permanecem bem arreigadas no coração desta patética democracia. Esta, condiciona a outra. A chave do nosso desenvolvimento é, sem dúvida, cultural e a começar pelas elites. E...não há ideias não senhor; é outra razão do estado de falência em que nos encontramos; todos sabem gastar recursos, pucos, muito poucos sabem investi-los. Mais uma vez, trata-se de uma questão cultural.

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    1. Sem dúvidas, estamos perante uma "questão cultural"; Talvez, por isso, algumas das análises mais interessante sobre Portugal da imprensa vêm de historiadores. Um dos problemas da nossa elite, da política em concreto, é que nasceu ontem.Não têm um fundo cultural político, uma visão histórica do país, um pensamento organizado sobre a sociedade portuguesa. Não percebem o país, não percebem os problemas do regime. não conhecem a sociedade portuguesa, a sua história. Pensam que isto se resolve com umas fórmulas importadas do estrangeiro e não resolve.

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