segunda-feira, 2 de novembro de 2015

A mais longa e triste paragem da economia portuguesa

Entre 2001 e 2014 a taxa média de crescimento anual do PIB português foi 0%. Ou seja, estamos hoje no ponto onde estávamos em 2001. Na análise macroeconómica da economia portuguesa não há nada mais triste que esta longa paragem da economia portuguesa.
Na história do século XX, só nos primeiros 20 anos encontramos um período semelhante em termos de desempenho económico (período de mudança do regime monárquico para a República).
Esta longa paragem torna-se ainda mais chocante no contraste com o excelente desempenho nas quatro décadas anteriores, em que a economia portuguesa esteve entre as economias do mundo que mais cresceu. Entre 1960 e o ano 2000, a economia portuguesa cresceu a uma taxa média anual de 4,3%, ou seja, a produção anual da economia foi multiplicada em mais de cinco vezes. Para as gerações acima dos 40 anos, a estagnação e, em muitos casos, a contração dos seus rendimentos transformou as expetativas optimistas, que o crescimento das décadas passadas tinha criado, numa enorme desilusão.
Entre 2001 e 2014, só há duas economias da UE com pior crescimento médio anual: a Itália e a Grécia, com uma taxa de -0,1%. Naquele período, as taxas médias anuais de crescimento da EU e da zona do euro foram, respectivamente, 2,1% e 0,9%, e da Alemanha 1%.
É verdade que o crescimento das economias ocidentais tem vindo a desacelerar desde os anos 70. A economia japonesa, por exemplo, está praticamente estagnada desde o início da década de 90. Mas a economia japonesa, como outras economias desenvolvidas, pararam ou abrandaram o seu crescimento quando os níveis de rendimento eram dos mais elevados do mundo. E é também esta dimensão que choca quando analisamos o desempenho da economia portuguesa desde o início do século XXI. 
Portugal parou de crescer quando se encontrava a meio do processo de convergência para os níveis de rendimentos dos países mais ricos da Europa. Os economistas costumam designar esta fase de crescimento como “catching-up”, uma fase em que as economias podem beneficiar da imitação das formas de organização nos países mais desenvolvidos.
Ou seja, os obstáculos que se colocam ao nosso crescimento têm uma natureza diferente dos obstáculos que os países que se encontram na fronteira da inovação enfrentam – alguns deles são aqui descritos por Tyler Cowen. Devia, por isso, ser mais fácil encontrarmos uma saída para o bloqueio em que a economia portuguesa se encontra há mais de uma década. Mas talvez não seja, porque não há nada mais difícil do que transformar e melhorar a qualidade das instituições.    

12 comentários:

  1. Análise muito interessante. A verdade é que nos últimos 15 anos praticamente nada foi feito pelos governos para transformar e melhorar a qualidade das instituições. Foram demasiadas oportunidades perdidas em nome de uma série de interesses que estão instalados (de um lado e do outro do espectro político).

    ResponderEliminar
  2. Sem dúvida Pedro - penso que o bloqueio resulta precisamente da acção dos interesses instalados.

    ResponderEliminar
  3. Infelizmente é predominante a ideia de que o país tem um problema de distribuição de riqueza versus um problema de geração de riqueza e esta ideia ( que é genuína numa parte significativa dos nossos concidadãos) influencia as opções de política.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Provavelmente tem os dois tipos de problemas. Existe uma relação entre a concentração de riqueza e a taxa de crescimento em muitas economias... Não quer dizer que resolvendo um automaticamente resolva o outro, mas a captura pelos interesses instalados torna-se mais fácil em países mais desiguais.

      Eliminar
  4. Coincidentemente ou talvez não, essa estagnação coincide com a criação do euro.

    ResponderEliminar
  5. a questão merece ser investigada. mas isso não aconteceu com as outras economias da periferia do euro que também foram resgatadas.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Aconteceu sim: com excepção da Irlanda, a TFP estagnou em todos os outros países da periferia. A TFP é um indicador mais adequado da performance, pois o crescimento do PIB foi influenciado por bolhas imobiliárias e crédito fácil na Irlanda e na Espanha, o que não é sustentável. Na Irlanda, a TFP cresceu, embora a um ritmo decrescente. Contudo, esta trajetória já tinha sido iniciada antes da adesão ao Euro. Eu simpatizo bastante com a ideia da fraca qualidade institucional estar por detrá das middle income trap, embora no caso português, as políticas macroeconómicas prosseguidas depois da entrada no Euro tiveram consequências muito negativas para o país.

      Eliminar
  6. Humilde pergunta de um leigo na matéria: Como se pode dizer que a economia do país não cresceu se o PIB, em 2000, era inferior a 120 mil milhões de dólares e ultrapassou 220 mil milhões de dólares em 2014? E como comparar esse período com os 40 anos anteriores, quando o PIB valia, em 1960, menos de 4 mil milhões de dólares?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. http://www.pordata.pt/DB/Portugal/Ambiente+de+Consulta/Tabela

      Eliminar
    2. Qual é a tabela que indica que Portugal não teve um crescimento importante entre 2000 e a eclosão da crise financeira global?

      Eliminar
  7. Seguindo o o modelo de Daron Acemoglu e James Robinson (2011) temos instituições extractivas e beneficiaríamos com instituições inclusivas, mas é uma abordagem muito vaga.

    ResponderEliminar

Não são permitidos comentários anónimos.