29. Não se pode governar um país que tem duzentas e quarenta e seis variedades de queijo.
Quem disse isto, sabia. Para mais, era general. Sabia tanto de queijo como do país. Deve ter provado todos. Mas não se pode agradar a todos. Cada queijo pode ser melhor do que o outro, e nunca se sabe se o próximo nos conduzirá ao êxtase. Mas cada um quer que o seu queijo seja o melhor, e torce o nariz aos outros, e analisa-lhes as qualidades, e descobre-lhes as falhas, e aumenta-as, e indigna-se quando os preferem. Nem sequer compreende que se possa preferi-los. Não se pode governar um país que tem duzentas e quarenta e seis variedades de preferências. Que fazer, como já dizia o outro na Estação Finlândia. Já agora, desembarco, terá decidido, e num país que tem duzentas e quarenta e seis variedades de heróis tortuosos, há os mortos em duelos, os que se atiram para debaixo de comboios, os dominados por uma indolência metafísica, os que acusam deus, os que o desafiam, os anjos de candura, os príncipes, os usurários, os anarquistas, as famílias infelizes, os eremitas, os burocratas, os militares dispensados, os narizes, os capotes, as almas mortas, os pais e os filhos, os idiotas. Pobre De Gaulle e as suas duzentas e quarenta e seis variedades de queijo e as duzentas e quarenta e seis variedades de preferências que os defendem. E, já agora, as duzentas e quarenta e seis variedades de perfume com que se disfarçam os cheiros, não pode ser por acaso que um país tenha ao mesmo tempo tantos queijos e tantos perfumes. E também neste caso, cada um é melhor do que o outro, e o próximo pode ser o que nos conduz ao êxtase. O mesmo pode dizer-se das frases, nisto não são assim tão diferentes dos queijos, dos perfumes e dos heróis tortuosos, e cada uma é melhor do que todas as outras, e a próxima pode ser a que nos conduz ao êxtase. Ora vejam. Disse Cervantes, sem se preocupar com números. Cada homem é como Deus o fez, e muitas vezes pior ainda.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Não são permitidos comentários anónimos.