Quando leio artigos como este de Alexandre Abreu, fico sempre na dúvida sobre se leram mal ou se são intelectualmente desonestos. Alexandre Abreu insinua que eu digo que a literatura económica apoia a conclusão que o salário mínimo provoca desemprego. Tal é, obviamente, falso. Bem pelo contrário, considero praticamente um facto que salários mínimos moderados não causam desemprego.
O que eu disse, e repito, é que acréscimos excessivos de salários mínimos em relação à realidade laboral em causa provocam desemprego. A palavra-chave é excessivos. E apresentei três critérios. Passo a citar: (1) Índice de Kaitz (que é, simplesmente, o rácio do salário mínimo com o salário mediano) não deve ser muito elevado; (2) não deve haver desemprego excessivo e (3) os aumentos do salário mínimo devem ser moderados.
Alexandre Abreu manda-nos ver um estudo citado numa entrada de Pedro Pita Barros. E eu, como sou bem, mandado, fui ver. E encontrei. A maioria dos estudos referem-se aos Estados Unidos e ao Canadá. Assim, ao gráfico que publiquei no Observador acrescentei os EUA e o Canadá.
Como é razoavelmente óbvio, estes alegados contra-exemplos limitam-se a confirmar o que eu digo.
Há também um trabalho que é referido para Portugal, que estuda o impacto do aumento do salário mínimo de jovens trabalhadores em 1987 (que na altura tinham um salário mínimo inferior ao mínimo). Ora não só esse estudo não se refere a um aumento generalizado do salário mínimo, como (vale a pena lembrar os mais esquecidos) nesse ano a taxa de crescimento do PIB real em Portugal foi de 7,63%. Têm mesmo a certeza de que é aplicável ao Portugal de hoje?
O salário mínimo federal americano é mantido a um nível extremamente baixo, basta pensar que entre 1995 e 2009 nem sequer foi aumentado para acompanhar a inflação. Os EUA são um caso muito único.
ResponderEliminarSim, entre SMN, férias, apoios à maternidade e saúde, os EUA não ficam (na minha opinião) lá muito bem na fotografia. È engraçado que quando (há uns anos) emigramos, falamos de para onde poderiamos ir (apenas mundo civilizado, nada de médios orientes e afins) os EUA era sempre riscado da lista - Canadá sim, EUA não.
EliminarLA-C, uma questão (que não sei mesmo). Em vez do índice de Kaitz, não faria mais sentido usar um rácio que relacionasse o salário mínimo (ou na realidade o custo mínimo por trabalhador) com a produtividade média por trabalhador? Suponho que as duas medidas estarão correlacionadas (ou deveriam estar se o mercado de trabalho fosse eficiente), mas intuitivamente parecia-me ser mais lógico haver efeitos devido à remuneração absoluta do que com a relação aos outros na mesma economia.
ResponderEliminar"ou na realidade o custo mínimo por trabalhador"
EliminarUm ponto muito interessante, este. Por exemplo, uma redução da TSU levaria a um aumento do salário líquido sem aumentar os custos, pelo que os efeitos perniciosos não aconteceriam.
Respondendo à pergunta: sim e também é um indicador usual para este tipo de comparações.
Já agora, como eu ideologicamente não gosto de taxas de TSU diferenciadas (porque no vim vai-se dizer que quem paga menos TSU tem menos direito à reforma, a subsídios de desemprego e etc), prefiro, em vez disso, que se manipule a taxa de IRS.
EliminarNão me parece mais baixo que o Dinamarquês, ou o Sueco.... Embora me pareça que a subida do salário mínimo é, obviamente, uma limitação ao valor do trabalho admissível numa economia e, por isso, é um threshold à entrada de pessoas no emprego, por outro lado, traça uma linha entre o que é assunto de segurança social e aquilo que é assunto laboral ao impedir dumping. Acho que nesse aspecto os americanos têm razão. E o Luis tb.
ResponderEliminarJá me fartei de comentar sobre este assunto, inclusive com um post aqui na destreza sobre o assunto.
ResponderEliminarMas no outro dia a discutir o assunto com uns colegas meus surgiu-me uma dúvida (que se alastra, de certo modo aos salários no sector público também):
Não seria justo fazer o SMN variar conforme a zona do país? Pergunto isto porque porque 400 euros podem não permitir um nível de vida digno em Lisboa, mas se calhar permitem em Paredes de Coura,
Claro que se pode argumentar que viver uma grande cidade é opção, mas também é certo que nas grandes cidades há maior oferta de trabalho.
Não sei até que ponto isto seria possível, ou de que maneira se poderia calcular essa potencial ponderação.Que poderia ser usada para funcionários públicos: um professor a ensinar em Lisboa ou em Paredes de Coura recebe o mesmo salário me termos nominais, mas tem um poder de compra muito mais reduzido, o que pode dentro de certas perspectivas não ser considerado justo.
Talvez isto sem "regiões" minimamente autónomas não seja exequível, mas gostava de saber a opinião da malta sobre o assunto, para ter perceber se isto faz sentido ou é só mais um disparate dos meus.
PS: Isto teria também como bonus promover as zonas mais desertificadas e pobres dos país, já que as empresas ao mudarem-se para lá veriam os custos com pessoal reduzidos (aquelas que empreguem trabalhadores que recebam o SMN, obviamente)
É evidente que se ajustares o salário mínimo por região os problemas das assimetrias regionais diminuem. Tal como ninguém de bom senso defende que deva haver um único salário mínimo na Europa inteira é perfeitamente razoável alguém defender que não deve ser o mesmo em Portugal inteiro. (E, aliás, não é.)
EliminarÉ engraçado que no post do Pedro Pita Barros (no FB, salvo erro) eu sugeri algo semelhante. Não por regiões, mas por actividade económica. Uma empresa de sapatos ou construção civil tem lógica pagar salário mínimo, um banco não. Esta delimitação por sectores seria apenas trazer "para a luz" o que já se faz em sede de contrato colectivo de trabalho.
Eliminar"que se alastra, de certo modo aos salários no sector público também"
EliminarDeclaração de interesses - sou trabalhador de uma instituição pública na "província"
Vejo alguns problemas com o "alastramento" do André Gama (com salários mais baixos nas zonas com menor custo de vida) - poderia aumentar ainda mais a dificuldade de arranjar profissionais com certas qualificações para fora de Lisboa (veja-se as noticias recorrentes sobre a falta de médicos e professores em certas regiões; o meu local de trabalho é raro o mês em que não é falado sobre isso).
Em termos gerais, diria que há um bónus implícito em viver numa grande cidade (e é exatamente por isso que os preços lá são mais elevados) e que salários reais mais baixos são simplesmente a compensação por esse bónus.
[Este meu comentário refere-se apenas à parte da salários da FP, não ao SMN]
Luís, sou profundamente agnóstico nesta questão do SMN, mesmo sabendo que gostaria, como todos, acho, que ele fosse efectivamente mais elevado, porque demonstraria uma sociedade mais igualitária, assim o comportasse a produtividade laboral portuguesa. A minha questão para ti é apenas: qual o papel do SMN afinal? Com as condições que colocas, parece-me que ele é apenas eficaz enquanto instrumento quando menos necessitamos dele? Uma outra questão: o SMN continua ser importante como indexante das prestações sociais? Tinha a ideia que uma das reformas do governo Sócrates tinha sido a desvinculação do SMN enquanto indexante do cálculo da maioria das prestações sociais. Se assim fosse, isso alteraria de algum modo o impacte macro do aumento do SMN?
ResponderEliminarRespondendo rapidamente, porque tenho de sair:
Eliminar1 - Gosto de um salário mínimo por questões sociais (uma certa ideia de dignidade associada ao trabalho) e para impedir situações de exploração laboral de trabalhadores com muito pouco poder negocial. Não gosto do desemprego que causa quando é demasiado elevado.
2- Um subsídio aos salários mais baixos é uma boa forma também de ajudar trabalhadores mal pagos. Gosto da ideia de que estimula o emprego (há vários estudos que o comprovam), não gosto da ideia de subsidiar empresas que pagam mal aos trabalhadores.
Juntando 1 e 2, gosto de uma combinação das duas políticas que tentem maximizar os efeitos bom e minimizar os efeitos perversos. Numa altura, em que o nosso salário mínimo é (relativamente) dos mais altos da OCDE e em que o desemprego está em níveis elevadíssimos, parece-me evidente qual dos dois instrumentos descritos deve ter prioridade.
O salário mínimo não pode ser um instrumento de criar "igualdade" na sociedade; é um instrumento que protege quem tem menos poder de negociação no mercado de trabalho. Qual é o incentivo para as pessoas se esforçarem se sabem que vão ganhar o mesmo caso não se esforcem? Deve haver igualdade no acesso ao trabalho, criar oportunidades para investimentos nas zonas mais desfavorecidas, dinamizar o mercado de trabalho para que as pessoas encontrem melhores empregos rapidamente, etc. Agora dar um salário mínimo alto por decreto para promover igualdade é absurdo.
EliminarApenas para secundar ali o caro LAC no 1 e no 2!!
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