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quinta-feira, 3 de dezembro de 2015
Criaturas metafísicas 66
Um poema e um erro ditaram o exílio de Ovídio para as costas do Mar Negro, longe de Romas, imperadores e das tentações que O Centro do Mundo sempre ofereceu a quem sonha com impérios, queira comandá-los do palco fronteiro, queira dos bastidores levá-los a glórias e triunfos.
Pode, é claro, ter sido outra a razão que moveu Augusto a dispensar senado e juízes na imposição da pena. Muitas razões além de impérios movem até os imperadores e se um erro pode significar muita coisa e mesmo um crime pior do que o homicídio, um poema atinge mais do que o poder a vaidade. Não sabemos o que melindrou Augusto. Pode ter sido uma censura à mesquinhez que mancha os grandes, aqueles em particular que pretendam a divindade e a decretem em estátuas nos postos avançados que um dia deixarão de intimidar os bárbaros. A mesquinhez implacável e severa com que conduziu António ao suicídio. Pode ter sido uma observação, os poetas deleitam-se com detalhes, acerca do leve tremor na voz com que começaria cada discurso ou cada sentença e de que não nos deram notícia os historiadores da pax romana. Ou um piscar de olhos ao embaraço do Príncipe na presença das mulheres que também não nos chegou, foi exasperantemente discreto Ovídio e não esperemos de Augusto a admissão das suas falhas. Rarearia o cabelo, aumentaria de volume o estômago, perderiam acuidade os olhos ou firmeza os músculos, deleitam-se como se disse em detalhes os poetas. Defeitos do carácter ou do corpo, especulemos que para Augusto seria imperdoável alguém lembrar-lhe que não tinha sentido de humor.
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