José Rodrigues dos Santos voltou à carga: “o fascismo é um movimento
de origem marxista”, insiste ele no Público. A origem do fascismo estaria
nas ideias do “marxista” francês Georges Sorel (1847-1922) que publicou, em 1908, um livro
muito influente intitulado Refléxions sur la violence. Como a revolução do proletariado profetizada por Marx e
Engels nunca mais via a luz do dia, a impaciência começou a instalar-se no seio
dos marxistas logo no final do século XIX (vejam bem a paciência dos comunistas
portugueses, que ainda não desistiram da ideia). Sorel achou que era melhor não
esperar sentado e defendeu que se passasse à acção. Uma elite ilustrada guiaria
o proletariado e, juntos, antecipariam o fim do capitalismo à mocada. Lenine
leu o livro e daí lhe veio a ideia de uma “vanguarda”. Mussolini também o leu e
daí o seu fascínio pela violência das massas. E, se bem entendi, Georges Sorel é
a origem comum dos dois movimentos: bolchevismo e fascismo. Há, sem dúvida,
muitas coincidências e sobreposições nestas duas histórias de violência, que abalaram
a Europa e o mundo. E Rodrigues dos Santos tem razão: o socialismo não foi parar por acaso ao "nacional-socialismo" alemão: os nazis estavam, por exemplo, a lançar um Estado providência.
Há, todavia, um
problema nesta narrativa de Rodrigues dos Santos. O fascismo pode ter bebido em
fontes marxistas, mas isso não significa que seja uma simples derivação do marxismo. Na verdade, o fascismo
bebeu em muitas fontes. Mussolini não tinha uma filosofia, tinha uma retórica,
como defendeu algures Umberto Eco. De facto, como é que se faz uma revolução e se mantém
ao mesmo tempo uma monarquia? Como é que se advoga o controlo absoluto e o livre
mercado? Como é que se concilia uma educação estatal que apela à violência com
os privilégios concedidos à igreja?
De qualquer maneira,
não se pode falar de fascismo sem falar de nacionalismo exacerbado,
corporativismo, a ideia de um chefe carismático, a vontade imperialista de
conquistar novos territórios. O que é que estas ideias têm a ver com o marxismo?
Muitas delas vêm do século XIX, muito antes de Sorel. É o caso, por exemplo, da crítica da
representação individualista e a correspondente apologia da representação orgânica,
que vêm do primeiro romantismo. Até em Portugal, Ramalho Ortigão e Oliveira Martins defenderam
um Estado orgânico e a conciliação de classes. E estas ideias, normalmente associadas ao
fascismo, vão completamente contra o “internacionalismo” e a “luta de classes”
do marxismo.
O Oliveira Martins seria um excelente exemplo da convivência ideológica, ainda bem dentro do sec. XIX, entre a representação organica nacionalista e socialista e o individualismo anarquista!! Sabe-se que começou de um lado mas acabou no outro!!
ResponderEliminarEsta discussão parece-me estulta, e muito mais ainda quando representada por J.R. dos Santos. Há determinadas práticas históricas que coincidem. Há parcelas de um património partilhado por diferentes ideologias, sim!! Não mais nem menos que isto!!
Prezado Justiniano,
EliminarÉ exactamente isso. Em poucas palavras, resumiu bem a questão.
O JRS, para além da clarividência para o negócio de certo tipo de escrita (nem me atrevo a chamar-lhe literatura), projecto em que tem várias pessoas a fazer «peças de um fato» que ele depois afeiçoa, nunca pareceu uma pessoa muito clarividente.
ResponderEliminarEm tempos, na televisão, disse que não fazia separação de lixo doméstico porque não sabia o que significavam as 3 cores e o que deveria pôr em cada contentor.
As sinopses existentes nas capas dos dois livros mencionados por JRdS não deixavam supor que ele estivesse a tentar falsificar a história, porque estão identificados como ficção. Só que, dizendo agora são provas de o fascismo ter origem no marxismo (antes disse que eram gêmeos, parece), entrou no terreno da ESPERTEZA SALOIA, já desmontada em vários bons artigos, dois dos quais de JCA, neste DdD.
ResponderEliminarE, sabendo eu que a expressão "esperteza saloia" é ofensiva para vários naturais de Sintra e Mafra, que bem se orgulham de serem saloios, e sem terem culpa nenhuma sobre as invencionices do marketeiro em causa, adiciono um vídeo que mostra a origem desta expressão que, na sua origem, significava o contrário do que significa hoje.
ESPERTEZA SALOIA [João Rodil (Historiador)]
https://www.youtube.com/watch?v=eAv8uVkMw0s
(2 minutos e 31 segundos
Muito obrigado pela sua sugestão, não fazia ideia da origem da expressão; graças a si, já aprendi mais uma coisa hoje.
EliminarO tema ainda é prenhe, a julgar pelo público de hoje e por outros locais da bloga!! Vai-se a ver e a coisa tem toda origem no iluminismo setecentista...ou na renascença seiscenta....ou na antiguidade clássica romana...ou helénica...ou na agregação mesopotamica...ou...
ResponderEliminarAcho que o JRS se queria referir a todos as ideologias totalitárias, mas nesse caso, lá está, o início comum foi o barroco naquela acepção de horror ao vazio!!
Muito bom.
Eliminar