Não sejamos hipócritas. Todos sabemos que convites como o da GALP ao Secretário de Estado são absolutamente normais e comuns. Muito provavelmente, seriam muito poucos os políticos que sobreviveriam a este tipo de escrutínio.
Mas, mais uma vez, não sejamos hipócritas. Todos sabemos que é esse um dos principais problemas do país: a forma como as grandes empresas se relacionam com o Estado e com os seus representantes.
Claro que se pode argumentar que o caso do Secretário de Estado dos Assunto Fiscais é mais grave, pois existe um contencioso fiscal de 100 milhões de euros. Mas as influências compram-se em relações amistosas e não nas contenciosas. O problema do tráfico de influências está presente sem contencioso. Faz todo o sentido para a Galp manter o Secretário de Estado da Indústria satisfeito e bem-disposto. Haja contencioso ou não.
Até porque os interesses são fungíveis. Há muitas formas de compensar o pagamento de 100 milhões.
O problema de haver contencioso não é de substância é de descaramento.
Desde quando exigir aos governantes um comportamento que não viole a lei é ser hipócrita? Eu acho que, neste caso, ser hipócrita é refugiarmo-nos no argumento de que isto é corriqueiro.
ResponderEliminarVá lá, que já não está cá o Sampaio para perorar acerca da " ética republicana", leia-se, presumo, " ética de Afonso Costa"
Exactamente. "as influências compram-se em relações amistosas e não nas contenciosas"
ResponderEliminarAqui há uns tempos, a propósito duma empresa que se mostrava muito generosa para com um projecto duma pessoa que conheço bem, o interessado explicou-me que isso já vinha de trás. Há uns anos tinha almoçado com o dono dessa empresa a propósito de outro projecto e, de facto, a certa altura começou a achar que ele estava a ser estranhamente simpático e atencioso, até que o outro lhe disse:
"Não se lembra que quando você era vice-presidente do instituto tal eu lhe mandei um cabaz de Natal e você me telefonou a dizer que ia mandar devolvê-lo? Pois foi a primeira vez, em décadas de relações com a administração pública, que alguém me fez uma coisa dessas!"
(Para não fazer uma desfeita ao ofertante, que ficou muito incomodado com a ideia, o ofertado comunicou-lhe que então ia pôr a peça de cerãmica no gabinete da presidência e entregar o resto do cabaz com compotas, bolachas, vinhos, coisas finas, a uma associação de beneficência ali perto).
Há duas coisas que acho fantásticas nesta história: 1) nunca ninguém tinha devolvido os presentes; 2) anos e anos depois esse gesto continua a suscitar uma extraordinária boa-vontade em resposta.