sábado, 27 de agosto de 2016

The end

Neste debate do burkini chegou-se ao ponto em que já não há argumentos novos. Já se sabe que ao argumento A se vai seguir o contra-argumento B, a que nós respondemos com o contra-contra-argumento C.1 (ou C.2, dependendo das nuances e da inteligência da pessoa que contra-argumentou com B) e, claro, já se sabe a resposta que o argumento C.1 vai levar. O pior de tudo é que quando se chega ao contra-argumento Z, volta-se a A, numa espiral a fazer lembrar a espiral recessiva.
Assim, vou parar de participar neste debate -- com excepção de um artigo que me pediram para escrever, mas que não deverá ter grande visibilidade.

Espero apenas que os meus amigos católicos não tornem a usar contra mim um argumento que usavam constantemente sempre que eu criticava a ICAR ou os apoios do Estado à ICAR . Esse argumento -- não é bem um argumento, mas enfim -- era simples: "Só criticas a igreja católica, se se passasse com qualquer outra religião tu não dizias nada. Quando são outras religiões podem sempre contar com a tua defesa."

É mesmo verdade, ouço este argumento constantemente, até me chegaram a dizer que se os contratos de associação envolvessem escolas islâmicas em vez de católicas eu já não seria contra que o Estado financiasse essas escolas.

4 comentários:

  1. Tomo a liberdade de apresentar o meu ângulo de abordagem

    Sobre a legitimidade da proibição do burquini

    O verdadeiro fundamento para a proibição do uso em público do hijab, do chador, e agora do burquini, habitualmente designados como vestes islâmicas, não tem rigorosamente nada a ver com a defesa da laicidade do Estado (dar a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus…), nem tão pouco com a necessidade de prover à segurança pública. Esta última razão poderá ser legitimamente invocada, isso sim, no caso da burka ou do véu que cobre metade do resto deixando apenas os olhos à vista.
    Deverá, antes de mais, ter-se em conta que o Islão não se reclama de ser só uma religião. É também (sobretudo na sua variante fundamentalista / islamista ) uma ideologia, uma causa, um modelo de sociedade, um desígnio de conquista , de domínio e de afirmação cultural.
    O véu islâmico – o jihab - e agora o burquini, poderiam ser encarados, no seio da sociedade ocidental, e antes da emergência da ameaça islamista, como uma mera questão de moda, de gosto pessoal, vamos lá até como um simples sinal de identificação com um modelo cultural.
    Mas a verdade é que, por acção das militâncias fundamentalistas, por um lado, e da inacção pusilânime e amedrontada da grande maioria dos muçulmanos, por outro, o jihab e as vestes islâmicas foram erigidos, sobretudo quando usados em contexto desafiante e provocatório nos países do ocidente de raízes culturais cristãs, em símbolos icónicos, em emblemas, em bandeiras de uma causa e de uma ideologia.
    E qual é uma das marcas essenciais dessa causa e dessa ideologia, claramente detectáveis na forma que revestem o jihab e as vestes islâmicas, unicamente aplicáveis às mulheres? Pois a de que os direitos e as vontades destas, mormente no seio do núcleo familiar, se situam num plano inferior ao dos homens, aos quais devem submissão, pois que tal resultaria da interpretação literal do que está escrito no Corão.
    Ora tais teses conflituam gravemente e estão em gritante oposição aos princípios civilizacionais das nossas sociedades europeias. E por isso, no seio destas, a defesa e a propaganda de tais teses tem de ser considerado como absolutamente intolerável. Pelo que não pode ser permitida, de todo, a exibição desafiante e provocatória dos símbolos e das bandeiras identificadoras de tais teses ou causas.
    Como de resto não pode ser permitida a exibição, com fins de propaganda, da cruz suástica, ou de símbolos e bandeiras, existentes ou eventualmente a criar, de causas ou propostas defensoras de modelos de sociedade onde exista segregação racial, ou baseados no esclavagismo.

    Manuel José Saraiva Santos
    Figueira da Foz

    ResponderEliminar
  2. Não gosto deste modo de se referir a Igreja de Roma - "ICAR". Parece que se pretende compará-la à IURD. Acho desrespeitoso e desnecessário. Além do mais, ninguém assim a conhece.

    Mas adiante. Minha contribuição para "The End":

    http://ionline.sapo.pt/521632?source=social

    ResponderEliminar
  3. Quando se passa o tempo a comentar a história dos burkinis e do hijab, e do intolerantes que somos na Europa, penso sempre na metáfora da árvore que não deixa ver o bosque.

    Nem vou entrar na questão do terrorismo, porque seria tremendamente redutor, mas penso ter visto verdadeira intolerância e falta de respeito em países declaradamente seguidores do Islão, para visitantes ocidentais. Por isso mesmo, prefiro nem entrar na discussão da justiça/injustiça.

    Também não julgo o modelo de sociedade machista, que segue estes países. Eu acredito na igualdade de oportunidades, direitos e deveres, mas isso sou eu; considerar que todos devem pensar assim seria etnocentrismo, erro no qual tento não cair.

    Não considero esta forma de vestir como um desafio ou afronta. Já vi mulheres muito bem desenvolvidas, tanto profissional como pessoalmente, mas que vestem segundo o estabelecido no Islão. Obviamente, estas mulheres têm a "sorte" (lá está o etnocentrismo) de viver numa sociedade que lhes permite estudar, desenvolver-se como profissionais e ser independentes. Também já vi mulheres católicas, que vão à missa todos os domingos e capazes de rezar todos os dias, na mesma condição com a diferença que estas não levam o burkini, mas levam um biquini.

    No meio de tanta incongruência, acredito que a liberdade que tanto pedimos deve ser respeitada sempre que não ponha em causa a segurança. Assim, penso que em situações que exigem a identificação da pessoa, não se pode nem se deve usar a religião para que tal não aconteça e não é falta de respeito alguma a Allah, Jesus Cristo, Vishnú, Zeus, ou qualquer outro que uma pessoa que vive e convive com a sociedade, tenha de mostrar o rosto, o cabelo, ou tenha de tirar a roupa, salvo seja, para garantir que a sociedade permanece em segurança.

    Quanto ao resto é mesmo A-B-C-A, como bem diz. Salta-se de árvore em árvore e quer queiramos, quer não, nunca poderemos ver o bosque completo.

    Já agora, a mim não me escandaliza o Burkini, escandaliza-me mais o argumento "se os contratos de associação envolvessem escolas islâmicas em vez de católicas eu já não seria contra que o Estado financiasse essas escolas.".

    Cumprimentos

    ResponderEliminar
  4. «(…)
    não tornem a usar contra mim um argumento que usavam constantemente sempre que eu criticava a ICAR ou os apoios do Estado à ICAR (…) "Só criticas a igreja católica, se se passasse com qualquer outra religião tu não dizias nada. Quando são outras religiões podem sempre contar com a tua defesa."
    (…)»

    Segundo foi divulgado em data recente, aconteceu isso em mesmo em 2011, e em dobro, com perseguições e tudo, a um dos autores de certo projecto nessa área dos contratos de associação. É uma situação baixa e rasteira que, no entanto, pode acontecer de muitas maneiras, como, por exemplo, num caso descrito por certo ex-estudante da Universidade de Coimbra, quando foi meu professor:

    “Estava eu a fazer um teste num anfiteatro quando se ouviu vozes fortes: - “Levante-se!” – “Não levanto!”. (Nesta altura já quase toda a gente olhava para o meio da sala…) – “Levante-se!” -“O Senhor Professor está a olhar para mim, mas não vê aquele ali!” (Enquanto o professor olhou para o lado o aluno retirou para debaixo do casaco o papel em que estava sentado). – “Levante-se!”. (O aluno levantou-se, o professor pediu desculpa e mandou que continuassem a fazer o teste).

    Alguns consideraram que o aluno tinha sido “esperto”. Outros limitaram-se a concluir que ele tinha acabado de descer na sua consideração, não tanto por estar copiar, porque tinha sido proposto que fosse um teste com consulta do que, hipoteticamente, resultaria um direito de resistência, antes porque quis dissimular a sua situação à custa de terceiros.

    Esperteza saloia! (e ressalvando que é sem ofensa para os saloios de Sintra e Mafra).

    ResponderEliminar

Não são permitidos comentários anónimos.