segunda-feira, 3 de abril de 2017

Pobretes, mas alegretes

Hoje, de uma ponta à outra de Portugal, as câmaras municipais transformaram-se em organizações de eventos. Feira do chouriço ou da alheira, feira medieval ou tecnológica, feira da agricultura ou do turismo, feira de produtos tradicionais ou do futuro, Natal, passagem de ano, o Calvário de Cristo (palavra de honra), o diabo a quatro, tudo serve de pretexto para mais um “evento”. Algumas almas mais avisadas perguntarão se não haverá maneiras mais inteligentes de os nossos autarcas espatifarem o nosso dinheiro. Com certeza que sim, mas isso dá muito mais trabalho e não dá tanto nas vistas como o foguetório. Entretanto, o povo "diverte-se", os autarcas mostram “obra”, alguém se farta de ganhar dinheiro e o contribuinte, como de costume, paga a conta e apanha as canas. Não temos emenda.

10 comentários:

  1. José C Alexandre, tem a certeza de que o balanço da soma desses eventos é negativo? O turismo tornou-se a actividade mais dinâmica da economia portuguesa por mero acaso? Se não cultivar o que a cultura portuguesa tem de único, na gastronomia, na história ou nos hábitos, que valor diferenciado uma comunidade de 10 milhões de habitantes da periferia da Europa, já sem bancos e sem indústria relevante (tirando a fileira florestal), consegue propôr a uma economia global?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Há com certeza "eventos" que farão sentido numa lógica de marketing territorial. O meu ponto é que se caiu no abuso, gasta-se dinheiro sem estratégia, apenas para dar nas vistas, por moda, por imitação, para dar dinheiro a ganhar a alguém. O retorno para as populações em muitos casos é altamente duvidoso ou nulo.

      Eliminar
    2. Acho que faz uma generalização precipitada. Acho que a agenda de eventos e a criação de numerosas rotas temáticas e percursos pedestres são dos maiores contributos à revitalização do interior e à dinamização de economias locais ocorridos nos últimos 15 anos.

      Eliminar
    3. sem dúvida. está a ser a única maneira de ver o interior com gente a apreciar o que se faz, e o que o interior tem.
      a partir de quantos eventos é abuso? qual deve ser o rácio áreas/eventos? tem frequentado alguns deles ou só vê os cartazes e então parece-lhe? 'o calvário de cristo', porquê a admiração?, sempre se fez a via sacra e com encenações, agora são é publicitadas... (se fosse em Braga, Sevilha, etc.)

      ''Algumas almas mais avisadas perguntarão se não haverá maneiras mais inteligentes de os nossos autarcas espatifarem o nosso dinheiro. Com certeza que sim, mas isso dá muito mais trabalho e não dá tanto nas vistas como o foguetório'' - estou certo que muitos 'autarcas' o receberão de braços abertos para ouvir e aplicar essas maneiras inteligentes.

      não quero crer que o problema que incomoda seja mesmo a alegria de viver que o povo têm. (mas alegria não rima com inteligência).

      rui

      Eliminar
    4. Qual é o rácio? É o rácio do bom senso, um recurso que não abunda nos génios que nos pastoreiam, como a história sobejamente demonstra.

      Eliminar
    5. a história demonstra tudo e o seu contrário.
      copos de água com utilidade marginal decrescente etc...
      maneiras mais inteligentes é que táqueto.

      rui

      Eliminar
    6. "a história demonstra tudo e o seu contrário."

      - Não é bem assim. Todavia, e em alguns aspectos, existe algo que vem de longe, como no seguinte trecho:
      «(...)
      O conde hesitou. Como uma vela de sebo não diria... Sebo subentendia obtusidade... Ora n'este ministerio sobrava o talento. Incontestavelmente havia lá talentos pujantes...

      - Essa é outra! gritou Ega atirando os braços ao ar. É extraordinario! N'este abençoado paiz todos os politicos têm immenso talento. A opposição confessa sempre que os ministros, que ella cobre d'injurias, têm, á parte os disparates que fazem, um talento de primeira ordem! Por outro lado a maioria admitte que a opposição, a quem ella constantemente recrimina pelos disparates que fez, está cheia de robustissimos talentos! De resto todo o mundo concorda que o paiz é uma choldra. E resulta portanto este facto supra-comico: um paiz governado com immenso talento, que é de todos na Europa, segundo o consenso unanime, o mais estupidamente governado! Eu proponho isto, a vêr: que como os talentos sempre falham, se experimentem uma vez os imbecis!

      O conde sorria com bonhomia e superioridade a estes exageros de phantasista.
      (...)»
      [Os Maias, de Eça de Queiros]

      Eliminar
    7. Grande Eça, é sempre um prazer relê-lo e já há algum tempo que não o faço. Está na hora.

      Eliminar
  2. Certa autarquia até pagou excursões dirigidas ao 13 de Maio em Fátima. Todavia, tiveram o azar de o fornecedor preterido reclamar em vez de conformar-se e esperar pela sua vez.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Pois, esse é apenas mais um bom exemplo de que já se passou, muitas vezes, o limite do razoável. É melhor fazer dois ou três grandes eventos, bem pensados e com uma lógica coerente do que as dezenas por ano. O excesso mata a eventual eficácia ou retorno da coisa. O conceito de utilidade marginal decrescente inventado pelos economistas no século XIX explica os efeitos contraproducentes de certos excessos- com o tempo, é a própria utilidade total que diminui. É o primeiro copo de água que nos mata a sede, o segundo já não sabe tão bem e o terceiro até nos pode dar dores de barriga.

      Eliminar

Não são permitidos comentários anónimos.