Saint-Simon (1760-1825), Robert Owen (1771-1859), Charles
Fourier (1772-1837) e Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) foram os principais
teóricos ou doutrinadores socialistas pré-Marx, e que este não hesitou em classificar
de utópicos, por contraponto ao seu pretenso socialismo científico. Na década
de 30 do século XIX, a conotação da palavra socialismo era mais ou menos isto:
um sistema inventado de sociedade que privilegiava o social contra o egoísta; o
cooperativo contra o competitivo; a sociabilidade contra o interesse
individual; o controlo social estrito sobre a acumulação e o uso da propriedade
privada; a igualdade económica ou pelo menos compensações segundo o mérito. Na
realidade, as várias espécies de socialismo entretanto desenvolvidas (cooperativo, comunitário, anárquico, científico, libertário, democrático, etc.) nunca
perderam de vista estas referências originais.
Dito isto, as ideias dos primeiros doutrinadores
socialistas eram muito diferentes. Por exemplo, o conde Saint-Simon aspirava a
um planeamento estatal através da infiltração e da persuasão de uma elite
científica dedicada. Os engenheiros e artistas (pensadores criativos)
formulariam planos; os cientistas avaliariam a exequibilidade desses planos; os
industriais e banqueiros ficariam encarregados da sua execução. Saint-Simon
seria, mais tarde, acusado de elitismo por outros socialistas.
Por seu turno, Charles Fourier era o caso paradigmático do autodidacta
louco. E talvez por isso me tenha despertado curiosidade. Caixeiro,
tipógrafo, caixeiro viajante, apenas se podia dedicar aos seus estudos e
escritos durante algumas horas à noite. Talvez a maior fantasia de Fourier
fosse que o trabalho, além de socialmente vantajoso, podia ser agradável e
ajustado ao carácter e desejos de cada indivíduo. Fourier via a famosa fábrica
de alfinetes de Adam Smith, onde cada um faz a sua parte da tarefa
cuidadosamente dividida, como uma ameaça para a natureza humana. O trabalho “agradável”
deveria ser variado, feito em cooperação e produzir coisas bem-feitas e
duradouras. As famílias deveriam viver em pequenas comunidades de modo a que
todos se conhecessem uns aos outros. Ao mesmo tempo, essas comunidades deveriam
ser suficientemente grandes para garantir a auto-suficiência e a diversidade de
talentos.
Fourier queria impedir o alastramento do princípio
industrial que considerava uma ameaça à individualidade autêntica e ao prazer do trabalho. Estava convencido de que o processo de produção cooperativo
podia ser mais eficiente do que o processo capitalista urbano. Ficou sempre no
ar uma ambiguidade sobre o problema de as suas comunidades simplesmente voltarem
as costas ao Estado e à sociedade convencional. Todavia, Fourier vislumbrava, no
futuro, confederações de comunidades nacionais e depois internacionais.
Fourier foi buscar muito a Rousseau, nomeadamente a
convicção de que o homem comum (honesto e natural) era mais virtuoso do que o
aristocrata (sofisticado e corrupto) ou o erudito (artificial e arrogante). O
homem deve ser capaz de fazer tudo, o que era muito o ideal americano de
Jefferson e Jackson. Em suma, a sociedade deveria ser reconstruída de forma a
garantir isto. Seria reconstruída em falanstérios cooperativos de 1 600 pessoas
que cultivavam cerca de cinco mil acres. Todos teriam acesso a edifícios comuns,
com serviços comuns, incluindo restaurantes, creches e salas de recreio. As
necessidades básicas estariam garantidas, mas as ostentações seriam banidas
pela opinião pública.
Para sua desgraça, quando as suas ideias começaram a
atrair as atenções, as pessoas faziam troça ou ignoravam as suas tortuosas
descrições. Seja como for, o seu princípio geral, a que chamava alternadamente “harmonia”,
“solidariedade”, Unitéisme, Collectisme, Sociantisme ou Mutualisme,
era tratado com respeito por alguns. Este foi o verdadeiro começo do socialismo
comunitário.
Curiosamente, no século XIX, a doutrina de Fourier teve mais
impacto nos EUA do que na França ou na Grá-Bretanha. Houve, de facto, várias
experiências de comunidades de trabalhadores. Nenhuma destas “nobres
experiências” durou muito. Alguns autores estudaram este insucesso e apontaram causas:
subcapitalização, direcção financeira incompetente e um excesso de intelectuais
muito exigentes e avessos ao trabalho, ou simplesmente incompetentes.
Nesta história, há outro dado que me parece curioso. Regra geral, as
comunidades religiosas duram mais tempo. Talvez o amor ou temor absorvente a
Deus seja a melhor (ou a única) forma de garantir a unidade de comunidades
isoladas, esperançadas numa vivência mais satisfatória.
Eu gostaria de saber como é que Charles Fourier fixou em "810" o número de "tipos de personalidade" e a dimensão do falanstério em 1.620 (o dobro). Quanto às 12 paixões nem pergunto:
ResponderEliminar«(...)
Out of these 12 passions and the different proportions in which they might coexist within each individual, Fourier devised his classification of 810 personality types. Allowing for the representation of the complete spectrum of personality types in each sex, the ideal size of the phalanstery was therefore set at 1.620.
(...)»
[The Theory of the Four Movements-Charles Fourier]
Prezado Isidro Dias,
ResponderEliminarTem toda a razão. O homem era um visionário, via coisas que mais ninguém via, coisas que não lembravam ao diabo.
Com 12 paixões, eu diria 4.096 tipos de "personalidade", e portanto falanstérios de 8.192 pessoas.
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