Marty tem 34 anos, trabalha num talho,
vive com a mãe nos subúrbios. É feio e gordo. Aos sábados à noite, sai com os
amigos. Sábado após sábado, falhanço após falhanço, Marty vai cavando a sua
solidão. As suas tentativas de sedução são recebidas com desprezo, repulsa.
Está cansado de ser rejeitado. Quando é que casas Marty? Pergunta a mãe;
perguntam os outros, no prazer perverso que existe em humilhar os feios. Até
que Marty conhece Clara (Betsy Blair), uma outsider como ele, de beleza modesta e destituída dos afectos alheios. Marty e Clara gostam um do outro,
gostam de conversar. O exército dos solitários começa então a sua conspiração
contra esta relação amorosa. A mãe teme o abandono. Os amigos celibatários
invejam a sorte de um dos seus. Todos vêem defeitos na Clara. Marty fica
confuso. Hesita. E decide. Às vezes, temos de decidir contra tudo e contra
todos. São as escolhas que fazem a nossa individualidade.
Marty é um filme de 1955, que deu o
Óscar a Ernest Borgine, o único na longa carreira deste grande actor,
injustamente esquecido. Marty é um dos poucos “filmes que captaram de forma tão
digna e pungente a tristeza da fealdade”, escreveu João Pereira Coutinho (JPC)
em “Vamos ao que interessa” - já agora, um livro que aconselho vivamente
e do qual roubei sem vergonha o título e a ideia para este post.
O argumento da “beleza interior” é uma
espécie compensação ética para os feios. Verdade que pode ser mais importante
do que a superficialidade da beleza. Desgraçadamente, é para a superficialidade
que as pessoas olham primeiro, como sublinha o JPC. A natureza está-se a
borrifar para a justiça. Distribui aleatoriamente e sem contemplações a beleza.
Uns são belos. Outros não.
A prazo, há um fraco consolo (ou
vingança) para os feios. Numa sociedade doentiamente obcecada com a saúde, a
beleza e a juventude, a velhice traz finalmente a igualdade. A velhice (apesar
de uns envelhecerem melhor do que outros) é igual para todos.
De facto, a natureza está-se a borrifar para a justiça. Mas sempre achei estranho que a literatura (e, pelos vistos, o cinema) se debruce profundamente sobre a tristeza dos feios e muito pouco se fale da tristeza dos burros.
ResponderEliminarIsabel, acha que os burros são tristes? Não sei, alguns, pelo menos, são bem alegres. A literatura e o cinema estão cheios de personagens idiotas e, geralmente, não são tristes.
EliminarIsso sao idiotas. Pessoas com dificuldade em entender o que o professor explica, com maus resultados por mais que se esforcem, que sabem que as coisas sao complicadas demais para o entendimento delas, isso e outra coisa.
EliminarJá que colocas as coisas nesses termos, devo informar-te que te acho um homem muito pouco digno.
ResponderEliminarObrigado, és uma querida.
Eliminar"A velhice (apesar de uns envelhecerem melhor do que outros) é igual para todos."
ResponderEliminarEsqueceste-te de Dorian Gray?
Pois, também achei interessante aquela ideia do filme Benjamin Button com o Brad Pitt - é baseado num conto do Oscar Wilde ou será do F. Scott Fitzgerald, não tenho a certeza. Nascer com o corpo de um velho e morrer com o corpo de um bebé, é uma tragédia
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