Não há respostas. Não faço perguntas. É por isso.
Cruzo
as pernas sentado sobre cascalho e urze, a montanha abriga-me há décadas. Vim
perguntar. É verdade. Os primeiros dez anos passei-os em pé, de cume em cume.
Uma cabra montesa por trás de um penedo parecia-me ir a algum lado e segui-a. Descobri
que é impossível seguir uma cabra montesa, há milénios que aperfeiçoam saltos
sobre escarpas e desfiladeiros, as pernas finas muito juntas alçam-nas e os
cascos fincam-nas na parede de rocha. Desisti, mas foram dez os anos durante os
quais subindo penhascos escapei por pouco às avalanches que as cabras montesas
não temem. A segunda década foi a década dos milhafres. Passei dez anos de
pescoço esticado e cabeça inclinada para os céus quase vazios. Nunca se
aproximaram de mim, a barba desgrenhada não enganou as aves que caçam pequenos
animais de pêlo castanho. A minha barba que passou de ruiva a branca ao longo
dos vinte anos entre as pedras. Ao fim deles, decidi procurar aquelas flores
raras de que falam os aldeões supersticiosos dos vales, as flores com que se
curariam todas as febres e todas as mazelas. Não encontrei nenhuma. Não saberia
reconhecê-las, receio. Os aldeões fizeram sempre relatos vagos e discordantes e
na terceira década na montanha a minha memória continha muito pouco para além
das fragas vistas ontem e das ervas da primavera passada. Não tenho a certeza
de estar já na quarta década entre penhascos. Mas a julgar pelo frio penso que
sim.
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