Na semana que antecedeu o primeiro aniversário
da eleição de Donald Trump como
Presidente dos EUA, Donna Brazile publicou um excerto do seu novo livro na revista
“Politico”. Brazile , que foi a presidente temporária do
Comité Nacional do Partido Democrata (Democratic National Committee, DNC) americano,
demitiu-se como comentadora habitual da CNN, em Março passado, depois de se
descobrir, em fugas da Wikileaks, que tinha informado a campanha de Hillary
Clinton dos tópicos das perguntas que seriam abordados no debate de Hillary
Clinton com Bernie Sanders durante das primárias dos Democratas.
No novo livro, Brazile
insinua que a campanha de Hillary Clinton pecava por ser bastante mal
organizada e por ter feito um acordo com o Comité Nacional do Partido Democrata
para captar os fundos do partido em benefício da própria campanha, diminuindo
assim a probabilidade de Bernie Sanders ganhar as eleições primárias dos
Democratas. A motivação para esta investigação de Brazile foi uma promessa que
fez a Bernie Sanders de tentar descortinar o que se tinha passado durante a
campanha das primárias que o tivesse prejudicado. Note-se que a própria assume que
nada do que foi feito pela campanha de Clinton tinha sido ilegal; apenas
parecia ser uma falta de ética. Convenhamos que Brazile é especialista em falta
de ética.
Aos que criticam
Brazile pelas revelações do seu livro, que, dizem os seus críticos, não adiantam
nada a não ser dividir os Democratas, ela oferece um conselho: “vão para o inferno!” Quem parece estar contente é o Presidente Trump que, num tweet na
Sexta-feira, proferiu “A verdadeira história de Colusão está no novo livro de Donna B. A
Crooked Hillary comprou o DNC & e roubou as Primárias dos Democratas do
Crazy Bernie!”,
aproveitando assim a deixa para desviar a atenção da investigação da
interferência da Rússia nas eleições americanas, que, soube-se na Segunda-feira
da semana passada, tinha produzido acusações no final de Outubro, a três pessoas
envolvidas na campanha de Trump: Paul Manafort, Rick Gates, e George
Papadouplos. Suspeita-se que Michael Flynn e respectivo filho estejam também na
mira de Mueller.
No meio da avalanche
vertiginosa de reviravoltas, há duas questões prementes: (1) poderá ser Donald
Trump destituído; e (2) que partido está em maiores apuros: os Democratas ou os
Republicanos. A resposta à primeira pergunta é “Não!” Independentemente do
que se descobrir durante a investigação, não há vontade política dos Democratas
em destituir Trump, mesmo que consigam maioria no Senado ou até na Câmara dos
Representantes nas eleições do ano que vem, como afirmou Nancy Pelosi
recentemente. A razão é simples: se Trump for destituído, Mike Pence, que é
bastante conservador e agradará a muitos Republicanos, tornar-se-á Presidente e será o candidate do
GOP nas próximas eleições, aumentando a probabilidade de o GOP voltar a eleger
um Presidente em 2020 e até em 2024. Se
Trump continuar Presidente, então será ele o próximo candidato republicano e
continuará a semear discórdia dentro do GOP. Entre um candidato que une o
partido e um que o enfraquece, os Democratas preferem o segundo.
No primeiro
aniversário de ser eleito, a popularidade de Donald Trump é a menor de todos os
Presidentes desde 1970, altura em que se começou a medir. Até agora, não
conseguiu passar nenhum marco legislativo e muitas das suas iniciativas
presidenciais têm sido bloqueadas pelos tribunais. O próximo teste será a
reforma fiscal, que Paul Ryan, o porta-voz da Câmara dos Representantes, acha
que conseguirá passar antes do Dia de Acção de Graças (23 de Novembro), mas até
agora há bastante oposição dos próprios representates republicanos porque mexe
em vacas sagradas, como a dedução de impostos locais e estatais no imposto de
rendimento federal. O que se tem revelado é que há poucos sítios onde arranjar
receita para financiar o corte de impostos prometido por Donald Trump.
Uma modificação que foi
considerada e posta de parte por ser potencialmente muito pouco popular e ter o
potencial de causar um pequeno abalo no mercado accionista foi a redução da
dedução dos planos poupança-reforma, vulgo 401K, que é o principal veículo
através do qual muitos americanos poupam para a reforma. Outra opção é a
redução temporária de alguns impostos de forma a não pôr em causa a
estabilidade orçamental de longo prazo, que é algo semelhante aos cortes
temporários de impostos da Segurança Social promulgados por George W. Bush que,
apesar de terem partido de uma situação orçamental bastante favorável, pois
projectava-se um excedente na Segurança Social de várias décadas, esta
deteriorou-se com o fraco crescimento da economia, apesar do estímulo fiscal. A actual expansão da economia
Americana é a terceira mais longa da história e, para se tornar na segunda,
precisa de durar até Maio de 2018; se continuar além de Julho de 2019, ultrapassará
a duração da expansão de 1991-2001. É duvidoso que qualquer estímulo fiscal tenha o potencial de acelerar
grandemente a economia, mas no curto prazo há algum “estímulo fiscal”
acidental.
Depois da avalanche de
catástrofes naturais que assolaram os EUA em 2016, será difícil quantificar a
parte do crescimento que se deverá ao esforço de reconstrução, mas o seu custo
irá cair parcialmente no orçamento federal. Por exemplo, o governador do Texas, Greg Abbott,
pediu ao governo federal, no final de Outubro, mais $61 mil milhões para gastar
em infraestrutura devido aos custos com o furacão Harvey, que se juntam aos $51
mil milhões que já foram prometidos. O total corresponde a sensivelmente 6,9% do PIB do Texas de 2016 (as
últimas estimativas do U.S. Bureau of Economic Analysis indicam que, em 2016, o
PIB do estado tenha sido de $1.617 mil milhões) e a 0.6% do PIB dos EUA em 2016
($18.624 mil milhões em 2016). No entanto, crescimento devido a catástrofes não
é um crescimento sustentável, pois os seus objectivos principaais são a
restauração da riqueza que foi destruída e prevenção de futura destruição, e o
seu financiamento usa recursos desviados de outras partes da economia ou dívida.
Um risco para os
Republicanos são as modificações no Affordable Care Act, conhecido por
Obamacare. A revista Time estimou, em Março de
2017, que 55% dos indivíduos que beneficiam de acesso a cuidados de saúde através
deste programa estão em distritos representados por Republicanos na Câmara dos
Representantes. Trump
criou bastantes incertezas relativamente à manutenção do programa e à
continuação de subsídios para os mais desfavorecidos – 80% dos participantes
recebem subsídios – chegando a anunciar que iria deixar o Obamacare morrer por
si próprio. Isto levou a que muitas seguradoras desistissem de participar no
programa e as que ficaram aumentaram o preço dos seguros. No final, os
subsídios acabaram por não ser eliminados, mas os efeitos desta incerteza sobre
os preços já estão incorporados nos novos preços para 2018.
O período de inscrição
no Obamacare começou em 1 de Novembro, mas este ano irá ser mais curto e
terminará a 15 de Dezembro, quando tradicionalmente as pessoas tinham até 31 de
Janeiro do ano seguinte para se inscrever. Alguns estados, como a Califórnia e
Nova Iorque, tomaram a iniciativa de alongar o período de inscrição. Se os
participantes não fizerem nada, ficarão inscritos no mesmo seguro que tinham
antes, mas que poderá ser mais caro. Há três grupos de planos: Bronze, Prata, e
Ouro. Os planos mais populares são os do grupo Prata, que cobrem mais coisas do
que os de Bronze, mas menos do que os de Ouro, mas são mais caros do que os de
Bronze e mais baratos do que os de Ouro. No entanto, com o efeito dos subsídios
este ano (a qualificação para se receber subsídio varia de ano para ano porque
está indexada ao valor limite da pobreza, que este ano é mais alto), pode haver
planos Bronze e Ouro, que sejam mais baratos do que os de Prata. No geral, não
se sabe muito bem como é que as pessoas irão reagir às mudanças; mas, se
funcionar mal, Trump será culpado por não ter feito nada.
As próximas eleições
presidenciais serão em Novembro de 2020; até lá, a probabilidade da economia
americana enfraquecer ou entrar em recessão é bastante considerável e
beneficiaria os Democratas irem a eleições contra um presidente republicano pouco
popular especialmente se, entretanto, a economia se revelar fraca. A única coisa que os Democratas
precisam de fazer é ter um candidato que seja menos controverso do que Hillary
Clinton e isso é quase certo, ou seja, para responder à segunda pergunta, comparados com os Republicanos, os
Democratas não estão assim tão mal como parecem.
Isso de 55% dos beneficiários do ACA viverem em distritos representados por Republicanos será assim tão relevante? Afinal, se os Republicanos têm 240 Representantes em 435 (55,17%, portanto), isso quer apenas dizer que os beneficiários do ACA estão distribuídos quase uniformemente pelo país.
ResponderEliminarEm termos políticos, o que talvez seria mais interessante seria saber qual a percentagem de beneficiários do ACA que vivem em distritos eleitorais não-seguros (em que, por exemplo, o vencedor das últimas eleições tenha ganho por uma diferença inferior a 10 pontos, ou algo do género), para saber qual o impacto que revogá-lo poderia ter nas próximas eleições.
A dispersão dos beneficiários do ACA é relevante porque um dos argumentos dos Republicanos é que a pobreza é maior nos estados sítios representados por Democratas. É difícil saber o que são distritos seguros hoje em dia por causa dos efeitos demográficos, especialmente porque Trump não tem sido muito sensível às minorias étnicas.
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