Evolução do Cambio Euro-dólar – valores médios mensais.
Artigo publicado no Jornal de Negócios
O Euro está a 1,15 dólares, o valor mais baixo desde 2003, quase
20% abaixo do de há seis meses atrás. Esta descida é positiva, quer por
estimular a competitividade e no curto prazo e dar um impulso ao crescimento,
quer por contribuir para atenuar os riscos de deflação na zona euro (ZE).
O impacto da depreciação do euro deverá ser mais relevante
do que a análise mais simplista baseada no peso das exportações para fora da
zona euro pode sugerir.
A análise dos efeitos da depreciação do euro tem de começar
pelo efeito que esta tem directamente nos bens exportados para fora da Zona
Euro. São cerca de 40% das exportações, e quase 50% do valor acrescentado das
mesmas. Neste caso o efeito é directo e pode ser muito relevante para conseguir
inverter a tendência de abrandamento das exportações dos últimos três anos.
Mas os efeitos não se esgotam aí. Mesmo nos 60% de
exportações que têm como destino a ZE, as exportações portuguesas concorrem com
produtos oriundos da China, Vietname, México ou Turquia. Há assim um efeito de
melhoria da competitividade que é importante considerar, em particular no caso
português que, dentro da ZE, é o país com a estrutura de exportações mais
próxima da dos países extracomunitários.
Há ainda o efeito de arrastamento das empresas fornecedoras
de grupos que exportam para fora da zona euro. Os exemplos de empresas
portuguesas fornecedoras dos grandes grupos automóveis europeus são os mais
óbvios. Uma proporção elevada das exportações portugueses são componentes para
empresas europeias, que depois são exportados para fora da ZE.
Por último há ainda o efeito de substituição no mercado
doméstico e os efeitos nas exportações de serviços. No caso do Turismo, o maior
mercado continua a ser o inglês, um país fora da ZE.
Considerando todos estes efeitos podemos dizer que, se a depreciação
do euro não é a cura ou a solução de todos os nossos problemas, tem potencial
para dar um contributo positivo muito relevante.
Podemos também perguntar porque é que esta depreciação não
veio mais cedo, questionando porque é que se permitiu que durante uma década se
assistisse a uma tão forte apreciação do euro, que passou de mínimos próximos
dos 0,8 dólares, entre 2000 e 2002, para valores máximos próximos dos 1,6, em
2008, situando-se entre os 1,3 e os 1,5 dólares na maioria do período entre 2007
e 2014 – ver gráfico.
A resposta é ao mesmo tempo complexa e bastante simples. É
complexa porque os factores que influenciam a evolução cambial num regime livre
são complexos, resultando das expectativas e da combinação e articulação da
política monetária, evolução dos preços, crescimento relativo, saldos externos,
etc.
No entanto, também é relativamente simples. Em grande medida
a forte valorização do euro no período entre 2001 e 2008, reflectiu as
prioridades e preocupações do BCE nesse período.
Numa altura em que uma parte importante dos países do Euro
apresentavam défices externos elevados, que recomendavam uma desvalorização da
moeda, prevaleceu a ideia de combater por todos os meios o risco de uma
aceleração da inflação que nada indicava que pudesse acontecer.
De facto, até 2010, o discurso oficial do BCE desvalorizou
os riscos e problemas criados pela existência e agravamento dos défices das
balanças de transacções correntes dentro da Zona Euro, mantendo uma política
monetária conservadora consistente com a valorização.
Não se trata de atribuir todas as culpas de tudo o que
aconteceu aos países do Sul da Europa às opções de política monetária, que lhes
foram particularmente negativas. Outras instituições fizeram outros erros, e estes
países fizeram os seus próprios erros.
Mas pode-se perguntar se foi razoável as instituições
europeias esperarem que os países do Sul da Europa podiam resolver os seus
problemas de competitividade e de desequilíbrio externo, num contexto em que em
simultâneo à abertura do mercado europeu à entrada de produtos concorrentes das
suas exportações, assistiam a uma duplicação do valor da sua moeda (de 0,8,
para 1,6 dólares).
Com uma valorização galopante desta natureza, só empresas
que conseguissem ganhos de produtividade de 10% ao ano poderiam manter as suas
margens. Não é assim estranho que tenha sido difícil atrair nesses anos mais
investimentos para a área dos transaccionáveis. No caso português o mais estranho
e surpreendente é que, mesmo com a valorização do euro que aconteceu, se tenha
conseguido nesse período aumentar as exportações e reduzir, mesmo que de forma
insuficiente, o défice da balança de bens e serviços.
A depreciação do Euro é assim uma boa notícia, que vindo
tarde, esperemos se possa manter por um período relevante, dando o seu
contributo para facilitar a melhoria da competitividade e do crescimento numa
Zona Euro, que para tantos dos seus elementos tem tido uma política monetária
muito longe da que seria óptima.
Posso estar a recordar-me mal, mas a ideia quando o Euro apareceu era ester ter paridade ou estar ligeiramente abaixo do dólar. Euros a 1,3 USD, como foi durante anos, é uma anormalidade fomentada pelo Norte da Europa.
ResponderEliminarSendo a Europa importadora líquida de energia, seria também interessante analisar o impacto que a desvalorização do euro (especialmente face ao dólar) tem no sentido da redução da competitividade uma vez que um euro mais fraco significa energia importada mais cara.
ResponderEliminarNão tem impacto. A energia importada está "indexada" (directamente ou indirectamente) ao crude, que está em queda. A soma dos efeitos resulta num efeito neutro.
EliminarDesculpe, mas tem impacto na perda de competitividade relativamente aos países cujas moedas mantiveram, a paridade, ou tiveram menor depreciação, relativamente ao USD, e relativamente aos EUA.
EliminarSe esses outros países mantiveram a paridade com o dólar, são menos competitivos à partida (em função da desvalorização do Euro). O custo da energia acaba por ser secundário (especialmente nos processos com menos intensidade energética).
EliminarAliás, em termos de energia, a competitividade apenas entra na comparação entre países produtores primários de energia (petróleo, gás, etc) e países que a consomem. Preços energéticos altos favorecem os primeiros (até porque podem "subsidiar" os outros sectores), enquanto preços mais baixos favorecem os segundos. Depois há "coisas" no meio, como petro-economias (que só vivem da energia) e países exportadores para estas (em que uma baixa do custo energético pode representar perda de mercado).
Bom artigo. Assenta a poeira e e cada vez mais claro, apesar de ser meio tabu, que aderir ao euro foi um erro monumental. E nao so por argumentos economicos, que ha e sao fortes (p.ex. fraca mobilidade laboral), mas por uma razao politica: a politica monetaria do BCE tera sempre uma forte influencia alema, e os alemaes tem uma visao da politica monetaria muito redutora e que tem sido desastrosa para os paises do Sul. Nada indica que isso va mudar. Assim que a inflacao subir uma nesga que seja, a pressao para acabar com o QE vai ser enorme.
ResponderEliminarA política do Trichet teve fortíssimas responsabilidade na atual crise económica da UE! A sua desastrada gestão das taxas de juro destruiu grande parte do tecido empresarial europeu. Mas...que me recorde, não teve contestação, à época!
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