Genebra, 1992. O último filme da trilogia das cores do
realizador polaco Krzysztof Kieślowski e que, na verdade, foi a sua última
produção (o cineasta morreria em 1996) é, na sequência do revisitar das três
cores da bandeira francesa, às quais se associa o ideal também tríptico da Revolução
de 1789, o que se exprime sobre a “fraternidade”.
Os laços humanos nesta sociedade pós-moderna são o mote para
uma intensa trama psicológica em que a proximidade física e existencial entre
pessoas, objectos e animais é, “malgré tout”, exaltada. Tal como o é o destino,
essa “faída” entrelaçada e em que as histórias pessoais dos personagens se
entrecruzam numa fotografia irrepreensível, com uma Irène Jacob deslumbrante em
emoções e em capacidade quase camaleónica de se fundir nos espaços mais
iluminados ou mais soturnos.
“Rouge” é uma reflexão pungente sobre a solidão, o “voyeurismo”,
o conceito de verdade, as relações que perduram para a vida mesmo quando uma
das partes decide não mais com ela prosseguir. Em todo este ciclo de Kieślowski
somos nós que nos encontramos connosco mesmos, nas grandezas e fraquezas
humanas. Nesta última parte, é a Amizade e não o Amor que nos salva de uma vida
indigna, porque infeliz.
E no desastre do ferry, em que os protagonistas de “Azul”,
“Branco” e “Vermelho” se salvam, é a humanidade que vai condensada nesse mesmo
salvamento, como que pretendendo mostrar a actualidade da liberdade, igualdade
e fraternidade, o que não deixa de ser particularmente hodierno depois dos atentados
em Paris e da esperada escalada da extrema-direita.
Mais de 20 anos depois, a mensagem do cineasta permanece
actualíssima. Não podia ser de outro modo: a mole humana é a mesma, a
solidariedade permanece, ainda que em tímidos acessos de quase loucura, a
igualdade está por construir e a liberdade, essa, permanece como uma útil
construção social.
O ciclo do realizador polaco devia integrar qualquer
licenciatura. Aprende-se mais nele e com ele que em muitos manuais e “powerpoints”. E com as maravilhosas bandas sonoras de cada um dos filmes que o integram.
Vi o trailer e as imagens evocam uma influência de David Lynch, não sei se permanece no filme.
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