Muita gente achou de mau gosto o cartaz da JSD, no qual
Mário Nogueira aparece com as vestes de Estaline, um dos santinhos adorados
pelo PCP. Não discuto. A mim, causou-me mais espanto a reacção da Fenprof e de Mário
Nogueira em particular. Não, não é por Mário Nogueira considerar a
possibilidade de processar os jovens laranjinhas. Ou por no passado a Fenprof
ter usado cartazes do mesmo género para gozar com ministros ou
primeiros-ministros. Esqueçamos esses pormenores da liberdade de expressão, da
coerência, etc. O meu espanto é outro. Desde quando Estaline passou a ser uma persona non grata para os comunistas portugueses? Deixaram de venerar o homem de
aço? Se calhar António Costa tinha mesmo razão quando há uns tempos disse que o
muro de Berlim estava (finalmente) a cair lá para os lados da Soeiro Pereira
Gomes. Ou talvez, como sugere hoje Francisco Assis no "Público", Mário Nogueira
se sujeite a um “processo disciplinar” instaurado pelo PCP e se transforme,
involuntariamente, num “verdadeiro herói”.
Não, não vai haver processo disciplinar contra o Mário Nogueira. Mas pode ter essa fantasia, se quiser. Já agora, o Estaline não é um santinho devoto do PCP. Não encontra nenhum documento atual do PCP a incensar o Estaline. Nem o Cunhal o fazia, e era o Cunhal, a não ser na juventude. Poderá haver comunistas que gostem do Estaline. Mas, como já reparou, não é o caso do Mário Nogueira, não é assim? Obviamente, o Alexandre não discute o gosto do cartaz da JSD.
ResponderEliminarAi sim, diga-me lá então o nome de um dirigente comunista português que tenha denunciado e criticado os crimes de Estaline. Querem ver que agora já nem Cunhal era estalinista. Estão a reescrever a história (uma das especialidades dos comunistas), é isso?
EliminarA primeira critica clara ao Estaline pelo PCP foi feita no seu V congresso, em 57. Já depois do 25.A, o Cunhal dá uma entrevista em que que repudia o Estaline. Repare, Alexandre, eu já fui na juventude da JCP, já sai, por divergências com o partido, já estou noutra, mas continuo a ser amigo de antigos camaradas. Há lá de tudo, estalinistas e anti-estalinistas, que se mantém no partido e não foram por isso alvo de qualquer processo. Entende agora porque é que o Mário Nogueira não vai ser alvo de processo disciplinar? O Mário Nogueira é um sindicalista duro, combativo (se conhecesse alguns dirigentes sindicalistas ingleses, franceses e alemães, devia achá-lo muito mole ;)). Mas nunca me tinha ocorrido que isso seria equivalente a purgas sanguinárias no partido ou ao massacre dos kulaks. Enfim...
EliminarClaro que não vai ser alvo de nenhum processo disciplinar.
EliminarO PCP nunca repudiou Staline, pelo menos não a sério. O que o PCP faz é dizer que houve desvios do ideal socialista e que a solução que preconizam para Portugal é diferente daquela. Isto é o mais que consegue arranjar. E, sem ter na memória a entrevista de Cunhal que refere, tenho a certeza absoluta de que ele não foi além de umas palavras como as que estou aqui a dizer.
Entrevista ao Independente, 90, e a palavra foi mesmo repúdio, como ideologia, acção politica, etc. Cuidado com as certezas absolutas, Luís ;)... Marxista-Leninista, sim, sempre.
EliminarEssa entrevista está disponível algures ou tenho de ir a uma hemeroteca?
EliminarA única entrevista de Cunhal em 90 que tenho guardada: https://drive.google.com/file/d/0BzLlVRSYwg-qU0VibHdSQWgtTjQ/view?usp=sharing
EliminarLuís:
EliminarRoma e Pavia não se fizeram num dia.
Ouvir o Mário Nogueira dizer aquilo em público, em resposta a esta provocaçãozinha da jota laranja, que tem esta visibilidade pública, é uma verdadeira lança em África.
Como o Renato diz, naquela tasca há muitos géneros de amantes do tintol.
Ainda há pouco tempo o presidente da minha câmara comunista, de maioria absoluta desde 1976, disse numa sessão camarária que tinha muito apreço pelo regime da Coreia do Norte.
Ouvi e vi com estes que a terra me há-de comer.
Nem queria acreditar.
Portanto, há lá gente para tudo.
Como em todos os partidos e fora deles.
Não queira meter o Rossio na rua da Betesga... pelo menos para já.
Como sabe, o PCP está num dilema: se se moderniza é comido pelo PS e pelo BE, pois deixa de ser muito diferente (e puro) e deixa de ser útil operativamente como solução política para os eleitores.
Se se mantém na ortodoxia cada vez tem menos clientes: os velhinhos vão morrendo.
Escolha difícil.
O PCP repudiou Staline na sequência do XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética, em 195, onde Khrushchev o denunciou também (essencialmente, por perseguir e matar comunistas, note-se). O PCP fez esse repúdio por fidelidade a Moscovo, e não necessariamente por convicão.
EliminarEntrevista fantástica, essa. Inacreditável o que diz sobre a Coreia do Norte (bem como a defesa que faz das conquistas socialistas a leste). E esta entrevista é de 1990.
EliminarCongresso PCURSS em 1956. Faltou o 6.
EliminarBasicamente, a posição do PCP em relação a Staline, depois do XX Congresso do PCURSS, foi: "matar sim, mas tanto também não".
EliminarEm 1990, Cunhal já soava com aqueles salazaristas empedernidos que, por volta de 1970, consideravam Marcelo Caetano um "perigoso democrata".
EliminarPode consultar na hemeroteca, Luis. Mas isto é acerca das certezas absolutas sobre o que fez ou disse alguém. Claro que a motivação mais direta foi a guinada do Krutchev, mas isso não impede que sempre tenham existido militantes e dirigentes comunistas portugueses a quem sinceramente repugnaram os crimes do Estaline. Para além de existir uma antiga tradição de oposição marxista leninista e bolchevique ao Estaline (paga bem cara), estamos a falar de homens com sensibilidades pessoais sobre o que é certo e o que é errado. Daí que não entenda o espanto com o caso Mário Nogueira.
Eliminar"Claro que a motivação mais direta foi a guinada do Krutchev"
EliminarIsso foi nos anos 60, depois de Bresnev voltaram a gostar de Stalin. Aquilo em que não acredito não é sobre o que foi nos anos 60. Escrevi "nunca", mas não o deveria ter escrito. Na verdade, estava na Perestroika e no que se passou depois disso. E estou como o Zé Carlos ali em cima, que dirigente destacada do PCP é que alguma vez disse o que Mário Nogueira disse agora sobre Stalin?
Mas, confesso, depois de ver a entrevista que o Luís Gaspar aqui postou, e a forma como Cunhal lava o regime da Coreia Norte nessa mesma entrevista de 1990, quase que me estou nas tintas para esse repto.