Um blogue de tip@s que percebem montes de Economia, Estatística, História, Filosofia, Cinema, Roupa Interior Feminina, Literatura, Laser Alexandrite, Religião, Pontes, Educação, Direito e Constituições. Numa palavra, holísticos.
quinta-feira, 30 de junho de 2016
Viva Moçambique!
A enviada da Destreza em África, acabou de nos informa que, em Moçambique, está tudo a buzinar por Portugal passar às meias-finais. Boas pessoas, portanto! Viva eles...
O comportamento do desemprego em Abril-Maio
O INE divulgou hoje as Estimativas Mensais de Emprego e Desemprego relativas a Maio. O número de desempregados surpreendeu-me (e possivelmente também ao André Lamas Leite), não só o relativo a Maio, mas sobretudo a revisão do valor de Abril, que passou de 611,5 mil para 593,6 mil, uma redução de quase 3% (nota: valores não corrigidos da sazonalidade). O gráfico seguinte mostra o desemprego ao longo dos últimos meses, a minha previsão e o intervalo de confiança dessa previsão (com o valor revisto de Abril fora desse intervalo; Abril_inicial é valor inicialmente divulgado pelo INE para Abril, muito próximo da minha previsão).
O gráfico seguinte mostra duas estimativas da tendência do desemprego.
As estimativas indicam que o ajustamento em Abril foi, pelo menos, um dos mais significativos no último ano. Porém, as estimativas para Maio sugerem a possibilidade de um afrouxamento, ou mesmo inversão, da tendência de diminuição do desemprego. Ou será que deveremos olhar para Abril-Maio em conjunto e a tendência de descida continua a ser clara? De qualquer modo, o valor de Maio é ainda provisório.
O gráfico seguinte mostra duas estimativas da tendência do desemprego.
As estimativas indicam que o ajustamento em Abril foi, pelo menos, um dos mais significativos no último ano. Porém, as estimativas para Maio sugerem a possibilidade de um afrouxamento, ou mesmo inversão, da tendência de diminuição do desemprego. Ou será que deveremos olhar para Abril-Maio em conjunto e a tendência de descida continua a ser clara? De qualquer modo, o valor de Maio é ainda provisório.
The Tragedy of Boris
Macbeth detestava a ideia de regicídio. Sabia que não encontraria nenhuma justificação nos cânones da moral, da filosofia, da religião, que o pudesse alguma vez justificar. No entanto, também sabia que era a única forma de tomar o poder. Depois de consumado o acto, há um solilóquio famoso em que Macbeth, entretantou enlouquecido e esmagado pela dimensão do seu próprio acto, alucina com a imagem da adaga que usou para matar o rei.
Boris detestava a ideia da saída do Reino Unido da União Europeia. Fôra governador de uma das regiões que mais beneficiou da existência da União. Sabia que não havia nenhuma justificação nos cânones da economia, da moral, da filosofia política, que o pudesse alguma vez justificar. No entanto, também sabia que era a única forma de tomar o poder. Depois de consumado o acto, há um solilóquio que ficará famoso em que Boris, entretanto enlouquecido e esmagado pela dimensão do seu próprio acto, alucina com a possibilidade de ter de governar um país com base em todas as mentiras em que teve de fingir acreditar e desiste do poder.
Separação amigável
As notícias dos últimos dias sobre a reacção da União Europeia ao Brexit e os comentários nas redes sociais enchem-me de vergonha e desânimo. Bem sei que é fundamental impedir que os nacionalismos e populismos ganhem ainda mais força, e a situação se torne de todo incontrolável, mas questiono o método usado pelos responsáveis políticos e sinto embaraço e susto pelo nível de indigência política e ética no modo como se fala do tema.
Primeiro: a Alemanha convida os seis fundadores da comunidade europeia para uma reunião de urgência no dia seguinte a saber-se o resultado. Não sei se a reunião estava assim combinada há muito ou se foi uma reacção do momento, mas reuniões a seis, num contexto de crise dos 28, têm um peso simbólico extremamente negativo. Entendo a ideia de, para os fundadores da comunidade, fazer todo o sentido conversarem uns com os outros sobre o modo como a ideia inicial descarrilou. Mas, a partir do momento em que integram novos países no grupo, perdem a possibilidade de continuar a falar entre si, fazendo dos que chegaram mais tarde membros de segunda classe. É certo que, de momento, as erupções nacionalistas mais prementes são na França e nos Países Baixos, que estiveram nessa reunião a seis, mas o descontentamento global gerado pelas circunstâncias deste encontro pode ser muito bem capitalizado por todos os interesses nacionalistas, em todos os países - inclusivamente nesses dois.
Se a ideia era não dar mais força aos extremismos de fundo nacionalista e anti-europeu, correu-lhes mal.
Segundo: o ressabiamento e a maldade que andam por aí à solta, e que são alimentados pelas declarações dos políticos habilmente propagadas pelos meios de comunicação social.
quarta-feira, 29 de junho de 2016
Have the cake; eat it, too!
"“Nós não vivemos de previsões, vivemos de realidades (…) Claro que o cenário internacional pode levar a que em outubro, quando apresentamos o OE de 2017, possa ser necessário fazer alguma atualização sobre evoluções futuras da economia portuguesa. Quanto a 2016, creio que os dados estão lançados e, felizmente, dão contas certas”, assegurou António Costa em Bruxelas, à saída da reunião do Conselho Europeu.
Quanto ao tema das possíveis sanções económicas a Portugal, “nada justifica qualquer risco de preocupação” relacionado com o incumprimento do Pacto de Estabilidade e Crescimento em 2015. “Já temos tantos problemas, e agora acrescentar mais um problema por causa de duas décimas que o anterior governo não terá cumprido, sobretudo num contexto em que a própria Comissão nas suas piores previsões reconhece que este ano estaremos abaixo dos 3%, é algo que as pessoas percebem que não faz sentido”, justificou."
Fonte: Observador, 29/6/2016
A realidade é que, quando este governo entrou em funções, não havia problema de duas décimas. Aliás, quando o problema das duas décimas surgiu, as pessoas até perguntaram coisas como: porque razão ia custar tanto dinheiro o Banif e porque é que se interveio no Banif antes do final de 2015. Não será que este governo teve um incentivo para prejudicar o OE 2015 para que os problemas não surgissem no OE 2016?
O "lapsus linguae" de Schäuble
Em política, quase sempre
o que parece é. As afirmações do todo-poderoso Ministro das Finanças da
Alemanha, sugerindo que o nosso país necessitaria de um novo “programa de
assistência económica e financeira”, eufemismo no jargão económico para resgate
ou salvamento da bancarrota, logo clarificadas, pelo próprio, na condição de
não cumprirmos as regras europeias, podem bem não ter sido um mero lapso ou
falta de tacto político.
O Governo de António
Costa não se pode gabar de resultados económicos consistentes. Provavelmente
também (quase) ninguém o esperaria, sabido como é que as verdadeiras reformas
estão por fazer, na estrutura do Estado e, sobretudo, no reforço do nosso
aparelho produtivo. Portugal não pode ser um conglomerado de prestação de
serviços, na medida em que a riqueza sustentada de uma Nação assim se não
constrói. Do mesmo passo, fruto de políticas da UE e de opções erradas dos
nossos governantes, serão necessárias décadas para que Portugal seja um país
com contas equilibradas e a produzir.
Não sou economista nem
pretendo sê-lo. Mas como qualquer cidadão preocupado com o nosso futuro
colectivo e com o mínimo acesso a dados estatísticos oficiais do INE,
resultantes dos apurados em Abril de 2016 e do “Boletim Mensal de Estatística”
de Maio de 2016 (o mais recente), há factores que saltam à vista do observador
comum e que nos devem pôr em estado de alerta. Assim, o saldo altamente
positivo das nossas exportações dá sinais de abrandamento, a taxa de desemprego
cujo valor mais recente é conhecido, relativa ao primeiro trimestre de 2016, é
de 12,4%, maior em 0,2% que no semestre passado, atingindo os 11,9% no 3.º
trimestre de 2015, depois de uns desgraçados 13,7% no 1.º trimestre do mesmo
ano. As exportações diminuíram 2,5% e as importações decresceram 7,3% em termos
nominais face ao mesmo mês de 2015.
Fruto da aposta no
crescimento por via do consumo privado, a capacidade de financiamento da
economia fixou-se em 1,0% do PIB no ano terminado no 1.º trimestre de 2016,
menos 0,1% que a observada no trimestre anterior. Mas os Portugueses parecem
desconfiar – e bem –, visto que a poupança bruta aumentou 1,6%. Porém, a taxa
de poupança das famílias fixou-se em 3,5%, menos 0,8% que no trimestre
precedente, traduzindo o maior aumento do consumo privado comparativamente ao
observado no rendimento disponível. Mais: o crescimento significativo do
consumo privado foi em larga medida resultado da aquisição de bens duradouros.
Voltamos à compra de automóvel novo, ao endividamento privado.
Mas nem tudo são más
notícias: a necessidade de financiamento das Administrações Públicas diminuiu,
passando de 4,4% do PIB no ano acabado no 4.º trimestre de 2015 para 3,8%. Esta
melhoria resultou do efeito conjugado do aumento de 0,5% da receita e de uma
redução de 0,6% da despesa. Contudo, veja-se que para quem acha que Portugal
deve ser quase só um destino de turismo, em Abril de 2016, hóspedes e dormidas tiveram menor crescimento e
as dormidas do mercado interno
encontram-se em desaceleração. Apesar disso, e estando em “exílio dourado” o
responsável pelo “brutal aumento de impostos”, em 2015, a carga fiscal
aumentou 4,4%, após o crescimento de 2,1% observado em 2014, correspondendo a
cerca de 34,5% do PIB.
Advertia Chateaubriand
que “a ambição de quem não tem capacidade é um crime”. Por seu turno, em “Maquiavel
em Democracia”, o experiente Edouard Balladur escreve: “o político deve falar e
agir de forma que o povo acredite, (…) convencido da sua sinceridade, confie na
sua palavra”. Será que o actual Governo o está a fazer? Descontada a evidente
“docilização” da verdade estudada por agências de comunicação e imagem e
batalhões de inefáveis assessores, o que passa é uma festa constante, de um
entusiasmo quase transbordante, com um PR que, cumprindo a sua missão, puxa
pelo país, de um Estado que vibra com a selecção nacional e que, naturalmente
cansado de um ano de trabalho, anseia pela silly
season. E, entretanto, a economia nunca deixa de mover-se.
Voltando a Schäuble,
parecem evidentes as tendências expansionistas (do prisma económico-financeiro)
da Alemanha, as quais vêm já de pouco depois do pós-Guerra. O Brexit está a dar uma ajuda e os
pintainhos assustados procuram refúgio nas amplas saias de Merkel, por isso
chamada pelo seu povo die Mutter (a Mãe). Será este um dos primeiros
sinais de que os germânicos nada aprenderam com a lição britânica e que não
percebem que uma União de directórios apenas, sejam eles de que latitudes, são
mesmo o princípio do fim deste projecto? A tragédia grega, que tanto insufla a
cultura europeia, não acaba naquele país. Alastra-se: para uns, por
incapacidade governativa e por anomia dos seus cidadãos; para outros, por uma
irreprimível vontade de mando que, a longo prazo, também a estes mata.
É ingénuo acreditar que Schäuble
tenha tido um lapsus linguae.
Limitou-se a espelhar o que a maioria do “núcleo duro” pensa dos Estados
periféricos: vamos concentrar-nos no filet
mignon e deixar cair os gordurosos do Sul. Se assim for, a visão do
Ministro ainda é mais pequena do que o conhecido. Se Portugal fosse um coelho,
provavelmente morreria atropelado a dez metros de Schäuble.
Expliquem lá isto...
O sistema de impostos é bastante diferente nos EUA, comparado com o resto da Europa. Por exemplo, nos EUA, não há deduções de despesa de renda; mas as despesas de juros na aquisição de casa própria são dedutíveis a 100% do rendimento sujeito a impostos. Julgo que quem olha para isto pensa que os americanos prejudicam as classes mais desfavorecidas e beneficiam as classes mais favorecidas, mas a verdade é um bocado mais complexa.
Em primeiro lugar, cada pessoa nos EUA tem direito a uma isenção. Para 2015, a isenção era de $4.000 por pessoa. Ou seja, um solteiro tem direito a $4.000 de isenção, uma família de duas pessoas a $8.000, de três pessoas $12,000, etc. logo esse dinheiro não está sujeito a impostos.
Em segundo lugar, temos de ver como funcionam as deduções. Em 2015, a dedução normal (standard deduction) para pessoas solteiras era de $6.300 -- isto é o valor mínimo, depois a pessoa compara este valor com as despesas que teve com coisas que podem ser dedutíveis. Por exemplo, no caso dos juros dos empréstimos para comprar casa, se a pessoa paga menos juros do que $6.300 por ano e não tem outras despesas dedutíveis, então a sua dedução é $6.300, mesmo que só tenha pago $5.000 em juros. Para um casal, a dedução normal é de $12.600, para 2015, logo só dá para deduzir as despesas de juros de compra de casa que estejam acima de $12.600, porque se estiverem abaixo, são apanhadas pela dedução normal.
Então façam lá as contas: uma pessoa solteira, nos EUA, só começa a pagar impostos se tem rendimento acima de $10.300; um casal com um filho, só começa a pagar impostos no rendimento acima de $24.600. (A realidade ainda é mais complexa, pois se as pessoas receberem seguro de saúde pelo emprego, o dinheiro que gastam no pagamento do prémio não está sujeito a impostos.)
No sistema americano, é possível que uma família não só não pague imposto sobre o rendimento, como ainda tenha a haver uma devolução de impostos que não pagou.
Então, no papel, diz-se que os americanos permitem deduções de despesas de juros com a casa, mas não permitem deduções de despesas com as rendas, logo pensamos que nos EUA, o sistema favorece a aquisição de casa própria muito mais do que o arrendamento. Só que os dados não demonstram isso, pois os americanos têm taxas de aquisição de casa própria que são mais baixas do que a grande maioria dos países da União Europeia:
Ver estudo aqui.
Em primeiro lugar, cada pessoa nos EUA tem direito a uma isenção. Para 2015, a isenção era de $4.000 por pessoa. Ou seja, um solteiro tem direito a $4.000 de isenção, uma família de duas pessoas a $8.000, de três pessoas $12,000, etc. logo esse dinheiro não está sujeito a impostos.
Em segundo lugar, temos de ver como funcionam as deduções. Em 2015, a dedução normal (standard deduction) para pessoas solteiras era de $6.300 -- isto é o valor mínimo, depois a pessoa compara este valor com as despesas que teve com coisas que podem ser dedutíveis. Por exemplo, no caso dos juros dos empréstimos para comprar casa, se a pessoa paga menos juros do que $6.300 por ano e não tem outras despesas dedutíveis, então a sua dedução é $6.300, mesmo que só tenha pago $5.000 em juros. Para um casal, a dedução normal é de $12.600, para 2015, logo só dá para deduzir as despesas de juros de compra de casa que estejam acima de $12.600, porque se estiverem abaixo, são apanhadas pela dedução normal.
Então façam lá as contas: uma pessoa solteira, nos EUA, só começa a pagar impostos se tem rendimento acima de $10.300; um casal com um filho, só começa a pagar impostos no rendimento acima de $24.600. (A realidade ainda é mais complexa, pois se as pessoas receberem seguro de saúde pelo emprego, o dinheiro que gastam no pagamento do prémio não está sujeito a impostos.)
No sistema americano, é possível que uma família não só não pague imposto sobre o rendimento, como ainda tenha a haver uma devolução de impostos que não pagou.
Então, no papel, diz-se que os americanos permitem deduções de despesas de juros com a casa, mas não permitem deduções de despesas com as rendas, logo pensamos que nos EUA, o sistema favorece a aquisição de casa própria muito mais do que o arrendamento. Só que os dados não demonstram isso, pois os americanos têm taxas de aquisição de casa própria que são mais baixas do que a grande maioria dos países da União Europeia:
Ver estudo aqui.
Ora bolas...
"Friday was also a trying day for Ben Farren. The founder of Spoke, a London online retailer of trousers and shorts, sources his wares in Portugal, paying his invoices in euros. “Literally there were bills to be paid on Friday and Monday, and I am absolutely kicking myself for not paying those a few days earlier,” said Farren, 38. “I’m eating it because I don’t want to pass the cost on to my customers.”
Invoices weren’t Farren’s only headache. Friday, as he was days away from finalizing the sale of his two-bedroom London flat, the buyer asked for a 10 percent price cut because of the referendum result. By Monday, the sale was off, and so was Farren’s purchase of a larger home for his wife and two children. For now, they’ll have to stay put in their current place."
Fonte: Bloomberg, 6/29/2016
Aparecemos na Bloomberg! Mas parece-me que o Made in Portugal vai dar lugar ao Made in Vietnam. E logo agora que o salário mínimo tinha aumentado e as coisas iam tão bem encarreiradas...
Thanks to Brexit
"Dublin’s commissioner for startups, Niamh Bushnell, reacted to the U.K.’s shock decision to exit the European Union by issuing a press release with “Thanks to Brexit” as a headline. Her point was that after last week’s vote, question marks hang over almost all the key ingredients that make London so attractive for technology companies.
[...]
Dublin has a number of soon-to-be-unique attractions within the EU. A young, native English-speaking, tech-savvy population of 4.6 million people, an openness to overseas talent and a government largely in thrall to tech companies. But perhaps most notably, Ireland offers the lowest corporate tax in Western Europe: 12.5 percent.
It also offers an attractive place for licensing intellectual property rights, with patent and copyright income subject to just 6.25 percent tax in many circumstances, and 25 percent tax credits available for research and development spending. That's why many U.S. tech companies use Ireland as the base for licensing their technology to all their European subsidiaries."
Fonte: Bloomberg, 29/6/2016
Enquanto isso, Portugal tem uma população cada vez mais envelhecida. Foda-se! (Literal e figurativamente...)
Qual política expansionista?
"O défice orçamental em contas públicas fixou-se nos 395 milhões de euros até maio, menos 453 milhões do que no mesmo período do ano passado, segundo divulgou hoje o Ministério das Finanças.
[...]
As Finanças justificam esta melhoria de 435 milhões de euros, face ao défice dos primeiros cinco meses de 2015, com um crescimento da receita em 1,6% e a "estabilização da despesa", em 0,1%.
[...]
O comportamento da despesa, escreve o ministério, foi "condicionado pelo aumento de juros pagos, em 275 milhões de euros, na sequência da emissão de obrigações de fevereiro de 2015, já que a despesa primária das Administrações Públicas registou uma redução em 232 milhões de euros"."
Fonte: LUSA/DN, 27/6/2016
Para quem ainda não percebeu, eu explico:
- Há austeridade: os impostos cresceram mais do que os gastos públicos e do que a economia
- Portugal paga mais em juros, mas a despesa está estável, logo há gastos públicos que estão a ser reduzidos para acomodar a maior despesa em juros.
- Isto não é política expansionista; nem sequer é austeridade que valha a pena. É apenas a estupidez mais recente de Mário Centeno.
Brexit, incerteza e a entrevista ao Público do Ministro das Finanças
Em ambiente de grande incerteza as variações na política económica devem ser mitigadas, de forma a reduzir os riscos de divergência dos objectivos fixados. A sucessiva revisão das previsões do PIB e do défice orçamental durante a aplicação do PAEF aconselha prudência nas mudanças na política orçamental. No entanto, a necessidade de mostrar aos mercados que o Governo português estava determinado a corrigir o défice das contas públicas (e alguma crença na ‘austeridade expansionista’) levou à adopção do discurso de ‘ir além da troika’ e a medidas demasiado ousadas como o corte dos dois subsídios e a proposta da TSU em 2012 ou os plafonds orçamentais negociados com a troika para 2014. Claro que o contexto era muito diferente do actual e a troika teve muitas responsabilidades na forma como impôs essas medidas. Não fosse a grande capacidade de acomodação aos cortes que os portugueses demonstraram e o programa de ajustamento podia ter falhado por completo.
Dado o desempenho económico dos nossos parceiros comerciais e incerteza decorrente do BREXIT o Ministro das Finanças admite na entrevista de hoje ao Público rever as projecções do PIB para 2016 – fiquei com a impressão que já não acredita na previsão de 1,2%... Não tenho dúvidas de que do ponto de vista técnico, no actual contexto, as medidas para o segundo semestre que vão significar mais despesa (reposição dos salários) e menos receita (descida do IVA da restauração) deveriam ser mitigadas. E acredito que seja também essa a opinião do Ministro das Finanças. Mas, obviamente, não há condições políticas para que seja dessa forma. E quando não há condições políticas para fazer as mudanças que têm de ser feitas, porque o contexto mudou, não há também grande futuro para os políticos.
História gótica
87. Dilúvios, furúnculos, gafanhotos. Muito maior ainda é o domínio de Zephaniah, A Grande. Muito mais vasto, muito mais populoso.
terça-feira, 28 de junho de 2016
Departugal: Já sei para onde irei!
Se houver um Departugal, eu vou pedir cidadania a Espanha. Viva a sangria!
[E, neste momento, Catarina Martins ganhou ainda mais fôlego para fazer campanha pelo seu referendo! Já está a escrever um email aos restantes bloquistas para se ver livre da Rita do Texas...]
[E, neste momento, Catarina Martins ganhou ainda mais fôlego para fazer campanha pelo seu referendo! Já está a escrever um email aos restantes bloquistas para se ver livre da Rita do Texas...]
Ricos e forretas
No início do mês, bem antes da Sexta-feira negra do Brexit, houve a Sexta-feira negra da Rita. Tudo correu mal e foi tão glorioso, que, nestas situações, eu encho-me de admiração por as peças do desastre encaixarem tão bem. [Tenho um enorme fascínio pela cauda má da distribuição probabilística -- aquela onde aparecem os desastres.] Então nesse dia, como foi um bocado stressante, um amigo meu convidou-me para ir ao cinema no Sábado.
A última vez que eu tinha ido a um cinema foi em Memphis, onde há um cinema pequenino que passa filmes independentes, ou que já não são novos, e que não tem muita gente. O público também é mais maduro e a atmosfera menos liceal. Ao dizer isto ao meu amigo, ele sugeriu ir ao River Oaks Theatre porque ele reconheceu, neste espaço, a mesma atmosfera do cinema que eu frequentava em Memphis. Decidimos ver "The Man who Knew Infinity", um filme biográfico, que saiu em Abril, acerca do matemático Srinivasa Ramanujan, de origem indiana, e que trabalhou no Trinity College ao lado de G.H. Hardy.
A última vez que eu tinha ido a um cinema foi em Memphis, onde há um cinema pequenino que passa filmes independentes, ou que já não são novos, e que não tem muita gente. O público também é mais maduro e a atmosfera menos liceal. Ao dizer isto ao meu amigo, ele sugeriu ir ao River Oaks Theatre porque ele reconheceu, neste espaço, a mesma atmosfera do cinema que eu frequentava em Memphis. Decidimos ver "The Man who Knew Infinity", um filme biográfico, que saiu em Abril, acerca do matemático Srinivasa Ramanujan, de origem indiana, e que trabalhou no Trinity College ao lado de G.H. Hardy.
Tantas medalhas!
Já perdi a conta das medalhas de ouro, prata, e bronze que Portugal já ganhou no Dance World Cup -- podem acompanhar pelo Facebook. Se não estou em erro, já temos 9 de ouro, 3 de prata, e 6 de bronze. A ver se os futebolistas homens conseguem fazer melhor do que as bailarinas jovens e crianças...
Benefícios do Brexit
- Toda a gente fala em Lisboa, mais precisamente no Tratado de Lisboa, artigo 50.
- Os ricos estão menos ricos.
- Contra todas as expectativas, muitos cidadãos britânicos demonstraram que se sentem mais europeus do que britânicos. Alguns até estão a pedir a cidadania irlandesa para não estarem fora da UE. Sabemos agora que há, realmente, quem se sinta cidadão europeu e esteja disposto a sacrificar-se pela UE.
- A Catarina Martins, do Bloco de Esquerda, demonstrou -- outra vez -- que está mais interessada no seu progresso político, do que no bem-estar dos portugueses.
- Ao fazer a busca "Catarina Martins", no Google, descobri que havia uma marca de botas "Catarina Martins", que é portuguesa e está à venda em 400 pontos no mundo e até tem uma loja em Itália.
- O George Soros demonstrou que, afinal, não é tão abutre como se pensava e não fez um short à libra esterlina; mas ganhou na mesma porque estava long ouro.
- António Costa tem uma diversão nova com a qual trabalhar.
- A Inglaterra conseguiu a proeza de se divorciar dos europeus duas vezes numa semana.
- A UE finalmente percebeu que tem de mudar qualquer coisinha.
- Segundo a RT (uma fonte de notícias russa, logo questionável), Alemanha e França tencionam liderar o processo de reforma, mas agora será uma boa oportunidade para os líderes portugueses (será que eles existem?) participarem activamente no processo e garantirem que a participação de Portugal na UE é sustentável, i.e., temos de crescer e não sobrevivermos à base de dívida.
- O John Oliver esteve muito engraçado depois do Brexit e disse muitos palavrões.
- Arranjei um nome giro para a minha sapinha.
- Como americana, estou muito orgulhosa do grande SNAFU criado pelos britânicos. Quem sai aos seus, não degenera. O 4 de Julho, este ano, terá um sabor muito especial.
Enviado (Pouco) Especial da Destreza ao Euro 2016: Jogo 3
No primeiro jogo a que este vosso enviado pouco especial ao Euro 2016 assistiu, um dos factos mais chocantes - para além do resultado - foi a maneira como, durante a maior parte do jogo, os adeptos islandeses, em clara minoria, abafaram completamente os portugueses.
À primeira vista pensei que fosse ou pela novidade de estarem numa fase final, ou pelos emigrantes portugueses saberem maioritariamente cânticos em francês - por alguma razão "allez allez Portugal allez" é um dos cânticos mais ouvidos no estádio. De uma maneira ou de outra, este facto continuou a parecer-me incrível.
No segundo jogo, o mesmo se passou com os adeptos húngaros, embora neste caso a maior surpresa tenha sido o facto de a massa adepta húngara compor pelo menos metade das bancadas. No caso deste jogo em particular, o facto de já terem o apuramento garantido combinado com o facto de terem passado uma grande parte do jogo a vencer justificava, a meu ver, os adeptos húngaros abafaram os portugueses durante grande parte do jogo.
Eis que chega o jogo 3: Hungria - Bélgica. Durante o fim de semana, pelas ruas e bares de Toulouse, os belgas não só são mais numerosos como ruidosos, fazendo-se ouvir um pouco por toda a parte - todos curiosamente apoiando a Croácia, sabe-se lá porquê. A fila demasiado lenta para a entrada do estádio traz-nos mais do mesmo - adeptos Belgas vestidos a rigor, como diabos, pintados dos pés à cabeça, quase tão ruidosos quanto embriegados.
Mas no estádio tudo muda. Os belgas tentam começar a cantar, mas os húngaros não dão tréguas. Os belgas até podem ser quase tão ruidosos, mas a resistência destes adeptos húngaros não lhes dá hipóteses. Mas eis que, 10 minutos passados, a bélgica marca. Golo, festa imensa dos diabos vermelhos. Os adeptos húngaros olham para o chão. Respiram fundo. Olham uns para os outros. Levantam os braços. E continuam a dominar o estádio por 80 minutos. Mesmo depois do 2-0. E do 3-0. E do 4-0. E depois do apito final.
O vídeo que se segue começa sensivelmente dois minutos depois dos jogadores húngaros se aproximarem dos adeptos para lhes agradecer.
Para quem não teve paciência para ver o vídeo todo, o vídeo dura cerca de dois minutos. Isto implica que por sensivelmente 5 minutos depois de serem eliminados por 4-0 do Euro 2016, os adeptos húngaros aplaudiram os seus jogadores de pé, como heróis.
Depois do vídeo acabar, os jogadores dirigem-se lentamente para os balneários. Mas quando estão perto do túnel, são obrigados a voltar pelos adeptos que continuem com o mesmo vigor, como se celebrassem o apuramento para os quartos de final:
Este vídeo mostra o fim dos adeptos e jogadores entoarem o hino húngaro a uma voz, perante um estádio repleto de belgas completamente mudos, e já sem jogadores belgas por perto.
Embora tenha um grande amigo húngaro, esta nunca foi nação que me despertasse particular simpatia. A partir de Domingo, o caso mudou de figura.
Depois do Euro 2016, nada me resta a dizer, senão: RIA, RIA, HUNGÁRIA!
PS: Houve relatos de desacatos com adeptos húngaros em Marselha. Dos dois jogos que vi da seleção, nada tenho a apontar senão um apoio fantástico. O único factor que pode causar alguma insegurança é eles serem na maior parte dos casos 20 cm mais altos que nós. Mas o mesmo se passa com metade das outras equipas. Além disso, parece um pouco coincidência a mais que (quase?) todos os desacatos relatados durante o Euro se tenham desenrolado em Marselha. Esperemos que esta quinta-feira seja diferente. Este enviado especial vai agora às compras para comprar o equipamento da Islândia antes de se por a caminho de Paris. Até pra semana!
segunda-feira, 27 de junho de 2016
Olha que bom!
Uma rapariga portuguesa, que foi entrevistada acerca do #Brexit, aparece no John Oliver... [Até no elevador do prédio onde eu trabalho, as pessoas abanam a cabeça...]
Isto vai ser lindo...
A geração de baby-boomers, pessoas nascidas entre 1946 e 1964, começou a completar 70 anos este ano. Esta geração é a mais rica, em termos de poupanças, de toda a humanidade e é provável que a geração a seguir não os ultrapasse, pois não terão tido um mercado de trabalho tão generoso. As regras do Internal Revenue Service (a Autoridade Tributária aqui do burgo) exigem que, quando as pessoas completam 70,5 anos, são obrigadas a retirar dinheiro das contas poupança-reforma com impostos deferidos (isto quer dizer que as pessoas depositavam dinheiro na conta antes de impostos, só pagando impostos quando o dinheiro fosse levantado). O plano de liquidação destas contas presume que todo o dinheiro será levantado em 27,4 anos. Se as pessoas não retirarem o dinheiro e pagarem os impostos que devem voluntariamente, o IRS fá-lo-á por elas e ficará com metade do dinheiro levantado, depois de impostos liquidados (leiam a Bloomberg para mais detalhes). Os americanos podem parecer malucos e estúpidos, mas asseguro-vos que não são. Ou seja, este pessoal todo vai ter de liquidar mesmo estas contas.
Gostaria que vocês pensassem nas consequências disto dentro do enquadramento da economia mundial. Os EUA não tinham aumentado as taxas de juro para que as condições fossem acomodativas para o Brexit, que parece que irá acontecer. Os mercados estão assustados, logo as taxas de juro vão continuar baixas para assegurar liquidez. Mas mesmo que a Reserva Federal aumente as taxas de juro, os bancos americanos irão receber os depósitos dos baby-boomers, logo isso irá pressionar a descida das taxas de juro de mercado. Onde é que os bancos irão alocar esse dinheiro?
O capital não sabe onde se há-de enfiar, porque a Grã-Bretanha e a União Europeia estão em mares incertos. A China também não está lá muito bem, pois anda a insuflar uma bolha enorme de crédito, onde novos empréstimos a juros cada vez mais altos são contraídos para liquidar empréstimos anteriores, ou seja, os novos empréstimos não estão correlacionados com a capacidade de pagamento de quem os contrai. Na América do Sul não há grandes opções, o Brasil está caótico e a Argentina, que depende muito do mercado de commodities, está a recuperar da administração de Kirchner. No Médio Oriente, a quebra do preço do petróleo mostrou que as poupanças desses países não eram tão grandes como pareciam, logo não se same muito bem como é que essas economias irão crescer. A Rússia depende de uma só pessoa: Putin. O Japão está estagnado.
Dado este cenário, para onde irá o capital? Para os EUA. Os EUA irão ter liquidez a mais e irão aparecer bolhas. O cenário perfeito para revisitarmos uma crise financeira à escala mundial...
Gostaria que vocês pensassem nas consequências disto dentro do enquadramento da economia mundial. Os EUA não tinham aumentado as taxas de juro para que as condições fossem acomodativas para o Brexit, que parece que irá acontecer. Os mercados estão assustados, logo as taxas de juro vão continuar baixas para assegurar liquidez. Mas mesmo que a Reserva Federal aumente as taxas de juro, os bancos americanos irão receber os depósitos dos baby-boomers, logo isso irá pressionar a descida das taxas de juro de mercado. Onde é que os bancos irão alocar esse dinheiro?
O capital não sabe onde se há-de enfiar, porque a Grã-Bretanha e a União Europeia estão em mares incertos. A China também não está lá muito bem, pois anda a insuflar uma bolha enorme de crédito, onde novos empréstimos a juros cada vez mais altos são contraídos para liquidar empréstimos anteriores, ou seja, os novos empréstimos não estão correlacionados com a capacidade de pagamento de quem os contrai. Na América do Sul não há grandes opções, o Brasil está caótico e a Argentina, que depende muito do mercado de commodities, está a recuperar da administração de Kirchner. No Médio Oriente, a quebra do preço do petróleo mostrou que as poupanças desses países não eram tão grandes como pareciam, logo não se same muito bem como é que essas economias irão crescer. A Rússia depende de uma só pessoa: Putin. O Japão está estagnado.
Dado este cenário, para onde irá o capital? Para os EUA. Os EUA irão ter liquidez a mais e irão aparecer bolhas. O cenário perfeito para revisitarmos uma crise financeira à escala mundial...
Quinto lugar no Mundial de Dança
Já temos uma classificação no Mundial de Dança, que está a decorrer na Ilha de Jersey. A Gabriela Agostinho, da Academia de Ballet da Lousã e a segunda mais nova bailarina num grupo de 17, conseguiu a quinta melhor qualificação.
Portugal é representado por várias escolas de ballet. A Associação de Dança de Lagos também nos está a representar. Podem ver a competição ao vivo neste link.
Parabéns à Gabriela e boa sorte a todos os bailarinos que nos representam.
Portugal é representado por várias escolas de ballet. A Associação de Dança de Lagos também nos está a representar. Podem ver a competição ao vivo neste link.
Parabéns à Gabriela e boa sorte a todos os bailarinos que nos representam.
Do meu almoço em Portugal
Bom, não me apetece falar do referendo no RU. Por agora. Para algo completamente diferente, hoje fui ao Consulado português em Londres, pela primeira vez. Há cerca de dois meses e meio, pela internet, consegui uma marcação para hoje, ao meio dia. Não havia nada para antes. Por falta de pessoal, o Consulado há muito que não recebe ninguém que simplesmente lá apareça sem marcação.
Bom, dois meses e meio volvidos, lá cruzo eu metade da cidade para ir para a sempre tão aprazível zona de Oxford Circus. Após derrubar dezasseis turistas, dois ciclistas e absorver uma bela golfada de ar na artéria que, nos dois primeiros dias do ano, esgotou o limite de poluição do ano inteiro, lá cheguei ao Consulado. Que é, verdadeiramente, como quem chega a Portugal. Tem todas as várias camadas de portugalidade, tão caras ao emigrante - serviço público é assim as manter e oferecer ao emigrante saudosista. Ao lado da porta de entrada está uma placa dourada, pomposa, onde se gravou o escudo da República e o horário de funcionamento, que viria entretando a ser riscado, a marcador preto, e devidamente corrigido com um horário novo, com letras ligeiramente descaídas, a derramar para a tinta branca da parede. Entrando, numa espécie de antecâmara, o utente é confrontado com o mais sofisticado aparato de segurança. São vários os detetores de metais, daqueles portáteis, que estão sossegadamente arrumados em cima de uma mesinha, novinhos em folha. Não são usados. O segurança confere o nome numas folhas escritas à mão, e dá-nos uma senha com um número. E informa-me que o meu amigo, inglês, que trabalha ali perto e veio comigo porque eu já antecipava que ia apanhar seca, não pode entrar. E assim o amigo teve a oportunidade de, como disse Pessoa, estranhar a condição de português, mas sem se entranhar, que não deixaram. Ficou à porta. Sorte a dele.
Lá dentro, o doce e suado mundo português de um dia de junho, quente, sem janelas abertas ou ar condicionado. Contei cerca de duzentas pessoas, à espera, em cadeiras daquelas de tampo de fórmica que se via nas tascas. Olhei o ecrã e percebi que, apesar de ter feito marcação para o meio dia, ao meio dia e cinco estava com 40 números à minha frente, para a categoria Cartão de Cidadão. Perguntei se aquilo era coisa para demorar. O melhor era ir lá fora ter com o meu amigo e de vez em quando vir conferir o número no ecrã. Certo. Passado 15 minutos, já só faltavam 35 números. Passado meia hora, 30. Ao fim de uma hora, ia em 20 números. Resolvi ir com o meu amigo comprar uma sandes. Quando voltei, uma hora e meia depois, só faltavam 10 números. Perguntei se aquilo era normal a alguém por lá estava, que me respondeu um pouco bruscamente, porque estava ocupado a escrevinhar qualquer coisa. Era uma reclamação. O coitado tinha um número ainda superior ao meu, e já tinha desistido. Resolvi ligar para o meu chefe a informar que ia chegar atrasado. Ele pediu apenas para confirmar que eu ia voltar ao trabalho, e que não tinha pedido asilo em retaliação pela saída do RU da UE. E, já agora, que estava ali assim à espera, se eu não podia discretamente indagar como é que ele, o meu chefe, podia adquirir nacionalidade portuguesa para se pirar daqui. Desculpem, acabei por falar do referendo, não foi? É para distrair. Está muita gente, muito calor, e já não estou a ver bem. Parece-me ver ali ao fundo um sinal de proibido usar telemóvel. Ao lado está uma rapariga a falar alto a uma coisa preta que me parece, à vista desarmada, um telemóvel. Eis as camadas da portugalidade: regras estúpidas; ninguém as cumpre; ninguém se preocupa que ninguém as cumpra. E agora? Espero?
Perguntei no guichet se a abordagem acertada, numa próxima vez que lá fosse, era tirar um dia de férias para poder esperar à vontade. A senhora, simpatiquíssima, a desdobrar-se em pedidos de desculpa, e a dizer que ia ligar lá para cima (não sei bem o que fica lá acima, mas imagino que a Redenção) para tentar explicar a minha situação injusta. Eis outra camada da portugalidade. É impossível não amar o meu país. Nada. Não havia nada a fazer. Mas o que é que o senhor precisa? Ah, não é um novo Cartão? Então espere lá, se é só morada, preencha aqui este formulário, entregue-me, que eu trato disso. Lá vou eu preencher o formulário, à antiga, coisa para pedir nome da mãe por extenso, freguesia de nascimento e estado civil. Pronto, aqui tem. Entretanto já tinham passado cerca de duas horas. Ah, trouxe consigo o PIN? Qual PIN? O PIN que é essencial para efetuar a mudança de morada. Então, mas no site não dizia nada. Pois, mas sem ele nada feito.
O "slot" mais próximo disponível para marcações é em Setembro. Calha bem, estarei de férias. Lá irei passar um dia a Portugal. Quite fitting. Claro que não faz nenhum sentido que, no país com a terceira comunidade emigrante portuguesa mais populosa, que envia cerca de 250 milhões de euros por ano em remessas, se ande a gastar dinheiro inútil a contratar mais 10 ou 20 funcionários para que se possa prestar um serviço minimamente decente. Isso se calhar ainda implicaria ter de arrendar um edifício maior para acomodar o acréscimo de funcionários, e sei lá, ter de assim mudar para um bairro que não fosse, como é o caso, o mais caro da Europa. Mas isto são ideias estúpidas, de quem acha que se pode andar a esbanjar dinheiro público à maluca.
Vivemos num mundo chocante
Os efeitos do Brexit na economia europeia são imprevisíveis e irão sentir-se por muito tempo. Como acontece com todos os choques e mudanças, alguns países serão mais afectados do que outros por aquela decisão do Reino Unido.
As economias são diariamente afectadas por milhares de choques e mudanças com milhares de proveniências. A inovação nas tecnologias de informação e comunicação, a globalização e a liberalização económica e financeira, e a integração europeia aceleraram a mudança e a transmissão dos choques na economia mundial, como bem demonstraram a crise financeira internacional de 2007/2008 e a crise das dívidas soberanas.
No entanto, o nosso mundo foi, nos últimos séculos, um local de grandes mudanças e esteve sempre muito exposto a choques. Se nos concentrarmos nas últimas décadas podemos, sem ser exaustivos, elencar um conjunto de mudanças e choques a que a economia portuguesa não ficou imune: a adesão à EFTA e a guerra colonial (anos 60); o fim do Sistema de Bretton Woods (71/73); a revolução de 25 de abril, a descolonização e o processo de nacionalizações (74/75); choques petrolíferos de 73, 79/80, 90/91 e 2008; a adesão à CEE em 1986; a Perestroika, o fim da Guerra Fria e a reunificação alemã na segunda metade dos anos 80; o fim do império Soviético e a guerra civil na ex-Jugoslávia no início dos anos 90; a adesão ao SME em 1992; a invasão do Kuwait pelo Iraque em 1990; as crises do SME de 92 e 93; a criação do euro em 1999; o 11/09/2001; a entrada da China na OMC em 2001; a invasão do Iraque pelos EUA em 2003; o excesso de liquidez nos mercados internacionais e as baixas taxas de juro; a Primavera árabe; as dificuldades de acesso ao financiamento durante a crise financeira internacional e a crise das dívidas soberanas; o conflito na Ucrânia; a incerteza política em relação à solução governativa em Espanha; etc.
Muitos destes choques e mudanças tiveram efeitos negativos na economia portuguesa; outros tiveram efeitos positivos. Com uma estagnação que já dura há 15 anos a tentação para culpar o contexto externo é muito grande: é por causa do Pacto de Estabilidade e Crescimento (que violamos ininterruptamente desde 2001…), é por causa do euro, é por causa da China, é por causa da Alemanha que privilegia como área económica o centro e o Leste da Europa, foi por causa das baixas taxas de juro e foi por causa das altas taxas de juro, foi por causa do aumento do preço do petróleo, é o Tratado Orçamental e as sanções (que nunca sofremos até hoje), é a União Europeia que não respeita a soberania dos países, é a União Europeia que é ainda incompleta, é a crise em Angola e no Brasil… e pode ser agora a instabilidade nos mercados por causa do Brexit…
Uma pequena economia como a portuguesa, que pertence à zona euro e cujo processo de desenvolvimento passa necessariamente por aumentar o peso das exportações no PIB, estará cada vez mais exposta aos choques provenientes dos seus parceiros comerciais. Podemos tentar ajudar a melhorá-lo – dar contributos para a zona euro e as instituições europeias funcionarem melhor. Mas o desafio que se coloca aos nossos decisores de política económica é encontrar as políticas adequadas para fazer crescer a economia tendo em conta as restrições, mas também as oportunidades, que a integração na economia europeia e mundial coloca.
Como podemos melhorar o nosso sistema político? Como podemos melhorar a organização e eficiência do Estado? Será que as nossas crianças, independentemente dos níveis de escolaridade e rendimento da família em que nascem, têm as mesmas oportunidades? As nossas empresas têm a mão-de-obra de que necessitam para serem competitivas no mercado internacional? A estrutura de financiamento das empresas garante os incentivos adequados? São estas algumas das questões que eu gostava de ver mais discutidas, tendo sempre em conta o mundo que vivemos.
História gótica
86. "Não temos." Quem falava era um homem com uma argola de ouro na orelha esquerda e uma pala num olho, o esquerdo também.
Thank you, thank you very much!
Esta semana, enquanto olhava especadamente para as estatísticas da DdD (Shhhh, não digam ao LA-C, senão ele casca-me, pois as estatísticas são "irrelevantes", mas eu gosto delas porque me relaxam. É um bocado como quando eu passava horas a contar o dinheiro que tinha no mealheiro quando era criança, e fazia tabelas em que escrevia quantas moedas e notas tinha de cada valor, quais as poupaças totais, etc.), encontrei uma pérola que me deixou muito feliz.
Alguém procurou no Google informação acerca de como "desapertar o sutiã" e chegou à DdD. Ai, tão bom! Senti que tinha contribuido qualquer coisinha para a felicidade da humanidade porque fui eu que escrevi esse post. E agradeci logo aos deuses, à la Elvis, o meu vizinho de Memphis...
P.S. Um dias destes, terei de voltar a escrever sobre sutiãs (ou soutiens) e introduzirei também cuecas (ou calcinhas), lingerie, portanto.
Alguém procurou no Google informação acerca de como "desapertar o sutiã" e chegou à DdD. Ai, tão bom! Senti que tinha contribuido qualquer coisinha para a felicidade da humanidade porque fui eu que escrevi esse post. E agradeci logo aos deuses, à la Elvis, o meu vizinho de Memphis...
P.S. Um dias destes, terei de voltar a escrever sobre sutiãs (ou soutiens) e introduzirei também cuecas (ou calcinhas), lingerie, portanto.
domingo, 26 de junho de 2016
Votam os estúpidos, entornam o caldo...
Frequentemente, ouço que o povo americano é estúpido. [Não vou ser politicamente correcta, mas vocês sabem que eu não sou, normalmente.] Concordo que há pessoas estúpidas nos EUA porque as há em todo o lado; mas os Estados Unidos são um país que está construído para que até os estúpidos tenham oportunidades. É normal ir a restaurantes e serviços públicos e encontrar pessoas, que têm problemas mentais, a trabalhar. Na verdade, até quem é estúpido e quer fazer mal a outras pessoas, como quem é suspeito de terrorismo ou tem problemas mentais, pode comprar armas nos EUA. [Parece que não há mesmo maneira pacífica de mudar a lei. Terão de morrer mais umas centenas ou milhares de pessoas até que mude. O curioso é que nas sondagens de opinião pública, a maioria dos americanos apoia que haja um maior cuidado na avaliação das pessoas que querem comprar armas.] Eu própria considero que só estúpidos é que permitem que cegos, suspeitos de terrorismo, e pessoas com problemas mentais possam comprar armas sem que ninguém lhes faça grandes perguntas. Mas muitos políticos acham que pessoas como eu estão erradas [quiçá estúpidas], porque o que eu penso restringe a liberdade dessas pessoas e a liberdade é uma coisa que não tem preço.
A “Europa” dos vencedores
Por
toda a Europa, grande parte das elites vertem lágrimas de tristeza pelo Brexit.
São lágrimas sinceras. Pudera, sempre foram eles os grandes beneficiados do
processo de integração europeia. Viajam livremente pelas capitais europeias,
têm acesso a “projectos” e a dinheiros europeus. A “Europa” é um pólo magnético
para os seus cidadãos de maior êxito, para os vencedores. Desgraçadamente, suspeito
que não é esse o sentimento de uma larga maioria de cidadãos, os que vivem afastados
dos centros abastados, os perdedores, os desvalidos, os desprezados.
Para estes, a “Europa” é uma abstracção administrativa ou, na melhor das
hipóteses, são uns senhores lá em Bruxelas ou Frankfurt ou coisa que o valha
que parecem ditar as regras e ameaçar com castigos os mal-comportados. Os
castigos até podem ser justos, mas o povo desconfia, cada vez mais, desta gente
que não lhe diz nada e em quem não votou. O problema é que a “Europa” não
aprende. Basta ver a soberba e a arrogância com que são tratados os que votaram
pelo Brexit: coitadinhos, são uns atrasados, uns reaccionários, uns falhados, a
quem nunca devia ter sido dada a oportunidade de votar. A arrogância e a
soberba dos “vencedores” estão a matar a “Europa”.
O nascimento de um país
A questão central que a União Europeia nos coloca é "Será que é possível formar uma nação por via da paz?" A regra é as nações formarem-se por via de conflito. Se considerarmos a celebração do Tratado de Roma como o evento que marcou a criação do embrião que iria dar origem à UE, estamos a assistir a um processo de nascimento de uma nova "nação" que já dura há 59 anos. Se consultarmos os livros de história, verificaremos que uma nação aos 59 anos é completamente diferente de aos 100, 200, ou mais.
Em 1202, ano em que Portugal completou 59 anos e era governado por D. Sancho I, cognome o Povoador, nada previa que se tornaria na nação que é hoje. O preço que pagámos pelo Portugal actual foi sangue e morte: guerras, golpes de estado, naufrágios durante a expansão além-mar, etc. Hoje, Portugal é uma das nações mais antigas do mundo e são raros os portugueses que dizem que Portugal como nação não deveria existir; mas há quem sugira que certas partes do país deviam ser independentes, como o Arquipélago da Madeira. No entanto, quem defende a independência não gosta muito da independência pura: há sempre a manifestação de que se deseja também laços preferenciais com Portugal.
Mesmo os Estados Unidos, que é considerada uma nação jovem, não foi formada instantaneamente. Parte do seu espaço geográfico foi colonizado por europeus desde o século XVI. A revolta americana, iniciada em 1775, culmina com a declaração de independência das 13 colónias iniciais no ano seguinte, mas a sua independência só foi reconhecida em 1783 pela Grã-Bretanha, a potência colonizadora. Nos primeiros 59 anos, os EUA iniciaram uma expansão em direção a oeste, durante a qual travaram as Guerras Indías Americanas; compraram a Louisiana dos franceses; declararam guerra à Grã-Bretanha em 1812; enviaram expedições militares à Florida até que a Espanha a cedesse, juntamente com outros territórios; etc. O último estado a entrar na União, foi o Havaí, em 1959, quando o país já tinha 183 anos, mas discute-se se fará sentido que o México se torne no próximo estado a unir-se aos EUA.
Os eurocépticos acusam a União Europeia de ser uma construção que limita as liberdades nacionais, mas todos os países impõem restrições dentro do seu próprio país muito maiores do que a UE. Fazer qualquer coisa na UE é complicado porque muitas vezes é necessário que todos os países estejam de acordo: que qualquer país tenha poder de veto, em vez de sujeitar todos os membros da União a decisões da maioria, é um sinal de que a liberdade das nacões foi preservada, mesmo que isso se traduza em alguma disfuncionalidade. Para além disso, o parlamento de cada país tem de votar a adopção da legislação produzida na UE.
Por exemplo, considere-se o processo de legalização do casamento homossexual nos EUA: quando uma decisão de um estado (Ohio) que não permitia o casamento homossexual (caso Obergefell v. Hodges) foi submetida ao Supremo Tribunal dos EUA e foi dada como inconstitucional, tornou-se vinculativa para todos os outros estados da União. Outro exemplo: a Constituição americana tem uma cláusula de comércio (artigo 1, secção 8, cláusula 3) que proíbe os estados da União de instituírem leis que afectem o livre comércio entre os estados.
O que é surpreendente na formação da UE é exactamente a manutenção da paz durante tanto tempo, o que é uma aberração histórica. Quantos mais anos passarem desde que a UE nasceu, mais provável será de que haverá um conflito armado para decidir se o projecto de nação consegue avançar ou se se desmorona pelo caminho. Que os britânicos que discordam com o Brexit tenham decidido iniciar petições dirigidas aos seus representantes que foram eleitos democraticamente, que a Escócia queira novamente submeter a questão da independência a referendo, são sinais de que, por enquanto, os processos pacíficos, que são o ponto fulcral da formação da UE, estão a funcionar.
A democracia não é apenas o voto popular; é também todo o conjunto de ferramentas que os cidadãos têm para manifestar a sua opinião. Quer se queira, quer não, a legislação do Reino Unido, em questões de referendo, não obriga a que a decisão da maioria se torne lei imediatamente. Há um processo intermédio, em que as decisões dos referendos têm de passar pelo Parlamento. Não respeitar o voto popular não é novidade em democracia: nos EUA, não é o candidato que tem a maioria do voto popular que é automaticamente eleito Presidente.
Em 1202, ano em que Portugal completou 59 anos e era governado por D. Sancho I, cognome o Povoador, nada previa que se tornaria na nação que é hoje. O preço que pagámos pelo Portugal actual foi sangue e morte: guerras, golpes de estado, naufrágios durante a expansão além-mar, etc. Hoje, Portugal é uma das nações mais antigas do mundo e são raros os portugueses que dizem que Portugal como nação não deveria existir; mas há quem sugira que certas partes do país deviam ser independentes, como o Arquipélago da Madeira. No entanto, quem defende a independência não gosta muito da independência pura: há sempre a manifestação de que se deseja também laços preferenciais com Portugal.
Mesmo os Estados Unidos, que é considerada uma nação jovem, não foi formada instantaneamente. Parte do seu espaço geográfico foi colonizado por europeus desde o século XVI. A revolta americana, iniciada em 1775, culmina com a declaração de independência das 13 colónias iniciais no ano seguinte, mas a sua independência só foi reconhecida em 1783 pela Grã-Bretanha, a potência colonizadora. Nos primeiros 59 anos, os EUA iniciaram uma expansão em direção a oeste, durante a qual travaram as Guerras Indías Americanas; compraram a Louisiana dos franceses; declararam guerra à Grã-Bretanha em 1812; enviaram expedições militares à Florida até que a Espanha a cedesse, juntamente com outros territórios; etc. O último estado a entrar na União, foi o Havaí, em 1959, quando o país já tinha 183 anos, mas discute-se se fará sentido que o México se torne no próximo estado a unir-se aos EUA.
Os eurocépticos acusam a União Europeia de ser uma construção que limita as liberdades nacionais, mas todos os países impõem restrições dentro do seu próprio país muito maiores do que a UE. Fazer qualquer coisa na UE é complicado porque muitas vezes é necessário que todos os países estejam de acordo: que qualquer país tenha poder de veto, em vez de sujeitar todos os membros da União a decisões da maioria, é um sinal de que a liberdade das nacões foi preservada, mesmo que isso se traduza em alguma disfuncionalidade. Para além disso, o parlamento de cada país tem de votar a adopção da legislação produzida na UE.
Por exemplo, considere-se o processo de legalização do casamento homossexual nos EUA: quando uma decisão de um estado (Ohio) que não permitia o casamento homossexual (caso Obergefell v. Hodges) foi submetida ao Supremo Tribunal dos EUA e foi dada como inconstitucional, tornou-se vinculativa para todos os outros estados da União. Outro exemplo: a Constituição americana tem uma cláusula de comércio (artigo 1, secção 8, cláusula 3) que proíbe os estados da União de instituírem leis que afectem o livre comércio entre os estados.
O que é surpreendente na formação da UE é exactamente a manutenção da paz durante tanto tempo, o que é uma aberração histórica. Quantos mais anos passarem desde que a UE nasceu, mais provável será de que haverá um conflito armado para decidir se o projecto de nação consegue avançar ou se se desmorona pelo caminho. Que os britânicos que discordam com o Brexit tenham decidido iniciar petições dirigidas aos seus representantes que foram eleitos democraticamente, que a Escócia queira novamente submeter a questão da independência a referendo, são sinais de que, por enquanto, os processos pacíficos, que são o ponto fulcral da formação da UE, estão a funcionar.
A democracia não é apenas o voto popular; é também todo o conjunto de ferramentas que os cidadãos têm para manifestar a sua opinião. Quer se queira, quer não, a legislação do Reino Unido, em questões de referendo, não obriga a que a decisão da maioria se torne lei imediatamente. Há um processo intermédio, em que as decisões dos referendos têm de passar pelo Parlamento. Não respeitar o voto popular não é novidade em democracia: nos EUA, não é o candidato que tem a maioria do voto popular que é automaticamente eleito Presidente.
Frases famosas 74
74. Sacrilégio. Heresia. Cisma. Cisão. Seita. Num mosteiro de Agostinhos que vivem das vinhas e do licor de cereja não há tempo nem espaço para sacrilégio, heresia, cisma, cisão, ou seita.