Ignazio Silone assistiu ao Comintern na década de 20 como
delegado do partido comunista italiano. Um dia, numa comissão especial do
executivo, discutia-se o ultimato de um sindicato britânico aos seus
militantes, segundo o qual as secções locais que apoiassem o movimento minoritário dirigido
pelos comunistas seriam expulsas. A situação era complicada, lamentava o representante
do partido comunista inglês. Tanto a adesão aos princípios como a saída do
sindicato poderiam levar à liquidação da minoria comunista. O delegado russo
Piatnisky apresentou uma solução que lhe parecia tão óbvia como o ovo de
Colombo. “As secções”, disse ele, “devem declarar que se submetem à disciplina
exigida, e depois na prática fazem exactamente o contrário”. O comunista inglês
replicou: “Mas isso seria uma mentira”. A sala irrompeu numa estrondosa
gargalhada, que parecia não ter fim, sombria como as salas da Internacional
Comunista. A anedota espalhou-se rapidamente por toda a cidade de Moscovo. A
inacreditável e ingénua resposta do inglês foi imediatamente contada por
telefone a Estaline e a importantes figuras do Estado, provocando por toda a
parte novas ondas de galhofa.
Anos mais tarde, Silone diria que, na sua memória, esta tempestade
de gargalhadas se sobrepôs a todos os discursos longos, pesados e opressivos que
ouviu durante as reuniões da Internacional Comunista. A gargalhada
transformou-se para o italiano numa espécie de símbolo. Geralmente, o riso está
do lado da liberdade e tantas vezes a ironia lançada aos autocratas é a única
forma de oposição possível. Mas aquela não era uma gargalhada saudável de
homens livres. Era uma gargalhada trocista, a gargalhada do cinismo total, que
não vê mais nada no mundo além do poder puro e simples.
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