Pelo que percebi, um dos três vencedores do prémio Nobel da Medicina deste ano morreu. O homem lutava contra um cancro há cerca de quatro anos. E, pelos vistos, na sua luta contra o cancro usou, com o sucesso conhecido, parte das teorias que desenvolveu, e pelas quais recebeu o prémio.
Em Economia também já aconteceu algo semelhante. O Robert Merton e o Myron Scholes receberam o prémio Nobel pelas suas teorias financeiras, mais concretamente sobre os mercados de derivados. Mais tarde, a empresa deles, que diariamente trabalhava com as fórmulas por eles derivadas e que tinham sido a razão do Nobel, iria à falência.
A principal diferença entre os dois casos é que, se a corretora de Merton e Scholes tivesse ido à falência antes da atribuição do Nobel, nunca este lhes teria sido atribuído.
Outra diferença é que Fisher Black morreu pouco antes do prémio ter sido atribuido ao seu co-autor Myron Scholes. Aparentemente o prémio em economia não pode ser atribuido post mortem. Mas vamos ao que interessa: a minha expectativa é que este o prémio seja concedido para a teoria. Sendo assim, prováveis vencedores serão Holstrom, Tirole, Hart ou Milgrom. Até segunda!
ResponderEliminarAté segunda. Imagino que na actual conjuntura, Fama não tenha hipóteses.
ResponderEliminarLA-C
"Mais tarde, a empresa deles, que diariamente trabalhava com as fórmulas por eles derivadas e que tinham sido a razão do Nobel, iria à falência."
ResponderEliminarCaro Luís,
Não é bem assim. A sociedade gestora onde eles trabalhavam (LTCM) usava certamente versões mais bem calibradas daquele que ficou conhecido como o modelo de Black-Merton-Scholes para a avaliação de ativos contingentes como são as opções financeiras. Mas não foi o uso destes modelos que esteve na base da queda da LTCM. Foi a altíssima alavancagem (45x) das operações de quasi-arbitragem em que a sociedade estava envolvida.
Vejamos um exemplo. Se eu acreditasse há dez anos que o diferencial de rendibilidade entre as obrigações do Tesouro lusitano e castelhano andaria à volta de 5 pontos-base (ou 0,0005), quando estivesse perante um diferencial de 15 pontos poderia imaginar que a breve trecho o diferencial iria "apertar". Poderia então posicionar-me no sentido de ganhar com a redução do diferencial. Mas como a diferença é muito pequena, o ganho é pouco. Logo: a alavancagem que no mercado de futuros é imediatamente de cerca de 10 vezes.
Pois bem. A rapaziada da LTCM acreditava tanto na estabilidade dos diferenciais com que trabalhava que se dava ao "luxo" de multiplicar a sua exposição ao risco por 45 vezes.
O que se passou foi que o incumprimento ("default") duma emissão soberana da Rússia no mês de Agosto desse ano perturbou a constelação das várias rendibilidades e destruiu irremediavelmente (durante várias semanas) os diferenciais das rendibilidades dos mercados obrigacionistas e dos mercados de "swaps". Por causa da pressão que os instrumentos usados pela LTCM causaram nos bancos que eram a sua contraparte contratual. Conclusão: a LTCM não podia falir porque arrastava os principais bancos americanos através do incumprimento dos "swaps". Os bancos foram obrigados a tomar conta da LTCM com a garantia federal e a rapaziada da LTCM perdeu o seu capital.
Lembro-me bem deste verão. Houve quem foi capaz com um capital de pouco mais de 125MM de dólares juntar um ganho de 32MM em menos de quatro meses. Porque como é natural era bem conhecida a posição da LTCM.
Já a rapaziada da Goldman Sachs onde imperava o Fischer nunca o deixaram chegar-se ao pé dum terminal de "trading". Eles lá sabiam porquê... Talvez porque era para eles como é para mim, o mais brilhante dos economistas financeiros da segunda metade do século passado.
Muito obrigado.
F
Apostas para o Nobel? I like long odds: Deirdre McCloskey!
ResponderEliminarObrigado.
F
Antes de mais, BEM VINDO, caríssimo F
ResponderEliminar"Mas não foi o uso destes modelos que esteve na base da queda da LTCM."
Tal como não foi o tratamento do cancro que esteve na base da morte do laureado com o Nobel da medicina. Nesse aspecto, parece-me que o seu comentário apenas reforça o paralelismo.
O Fernando tem umas apostas aí à frente. Se Deirdre McCloskey ganhar será um prémio dos tempos modernos, verdadeiramente.
Deirdre McCloskey é um(a) forte candidato(a). Outra possibilidade - against all odds - Rafael Robb!
ResponderEliminarCaro Luís,
ResponderEliminarO visual refrescado da Destreza merece todo o meu aplauso como os anteriores sempre mereceram. Porque mantém a serenidade estética e assegura a vida da prosa do Cristóvão, do Fernando e do Luís.
Voltei a ler a sua nota mas agora com mais cuidado. O Luís tem toda a razão: "se a corretora de Merton e Scholes tivesse ido à falência antes da atribuição do Nobel, nunca este lhes teria sido atribuído."
E é bem verdade que no princípio da sociedade LTCM o modelo BMS era usado correntemente. Quando procuravam fazer a arbitragem das cotações dos outros bancos relativas a opções variadas. E muito em especial das opções oferecidas pela AIG Financial Products onde ainda mandava o muito saber de Howard Sosin. Todo este trabalho de arbitragem dava resultados estáveis mas não eram números para fazer excitar John Merriweather. Por isso o trabalho de quasi arbitragem altamente alavancada prevaleceu. Porque os números eram outros. Eram múltiplos.
O modelo BMS foi porém uma das razões principais da quebra da bolsa de Outubro de 1987. Por causa do uso inapropriado do modelo pelas três casas - Wells Fargo, Chase Manhattan, e State Street. Provocou o desastre dos futuros na célebre manhã de terça-feira depois da perda de 508 pontos na sexta-feira anterior no mercado "cash".
A razão: as versões do modelo então usadas pelos bancos só permitiam reajustamentos (leia-se: aproximações) lineares nas vizinhanças de posições eminentemente não-lineares. Quando o mercado dá um "salto" muito grande para além da vizinhança o ajustamento linear não compensa a força da variação não-linear. E... cá vai disto. (A propósito, com perdas nos bancos que não excederam 8 MM de dólares individualmente. Uma ninharia nos dias de hoje!...)
Muito se progrediu desde então. Mas é interessante constatar que apesar do "crash" de 1987, Merton e Scholes ainda assim obtiveram o prémio (se me permitem: merecido).
Obrigado.
F