sexta-feira, 12 de julho de 2013

Mas não há ninguém que lhes esfregue com as folhas de Excel na cara?

O único aspecto bom da crise política que vivemos é que os cortes adicionais de 4,7 mil milhões de euros que a tróica exige passaram a ser impossíveis de concretizar. Se antes já poucas havia condições políticas para os aplicar, agora estes cortes são verdadeiramente inexequíveis.

E ainda bem. Há uns tempos fiz um exercício considerando um multiplicador orçamental de 1,3. Pelos vistos, fui modesto. Economistas do Banco Portugal estimaram que em tempos de forte recessão como os actuais, no prazo de um ano, o multiplicador da despesa é 2. Valor que parece algo exagerado, mas a verdade é que está em linha com vários outros estudos internacionais. No pressuposto de que está correcto, levemos as contas até ao fim.

4,7 mil milhões de euros de cortes adicionais representam cerca de 2,85% do PIB. Considerando o multiplicador estimado pelo Banco de Portugal, este corte no orçamento provocaria uma queda no PIB 9,4mil milhões. Ou seja, cerca de 5,7%.

Só a queda no PIB provocaria um aumento da dívida pública de 125% para 132% do PIB. Adicionalmente, seria de esperar uma redução das receitas fiscais de cerca de 3,3 mil milhões. Possivelmente, estarei a exagerar na queda das receitas fiscais (35% da queda do PIB), mas a verdade é que também não estou a ter em conta a subida da despesa com subsídios de desemprego. Juntando todas estas contas, e admitindo que tudo isto é bastante grosseiro, reduziríamos o défice em cerca de 0.6 pontos percentuais.

Ou seja, com estes cortes, provocar-se-ia uma recessão brutal e sem precedentes, fazendo disparar o desemprego. Para no fim conseguir reduzir o défice público em menos de 1 ponto percentual do PIB e aumentar brutalmente o rácio da dívida pública. Seria uma loucura.

2 comentários:

  1. Eu só não consigo compreender como é que este argumento, de fácil compreensão, não é clarificado na discussão política. Como é evidente, não há neste momento possibilidades de uma política macroeconómica expansionista mas a austeridade tem de fazer sentido e ponderar ganhos e perdas. E a austeridade que temos tido e que, parece, continuaremos a ter não faz sequer sentido no plano das finanças públicas, como o seu texto expõe. Até parece que a variável objectivo é a despesa pública e não o défice público - e já nem falo na dívida pública...

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  2. Teoria (assumida) da conspiração:

    Suponhamos, por hipótese, que o objectivo das classes e instituições dominantes na zona do Atlântico Norte - o sistema financeiro e as oligarquias rentistas hereditárias - não é tanto enriquecer em termos absolutos como enriquecer em termos relativos. Faz sentido: é da desigualdade económica que decorre o verdadeiro poder político, e é da pobreza extrema que decorre a submissão extrema.

    Suponhamos também, por hipótese, que estas forças têm em mente um jogo de soma negativa, não se importando mesmo de empobrecer um pouco desde que os mais pobres empobreçam ainda mais.

    Confirmando-se estas hipóteses, o absurdo passa a fazer sentido e a loucura torna-se racional.

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