domingo, 15 de junho de 2014

Para reduzir as rendas das PPP

De acordo com o PÚBLICO, o Governo pretende aprovar rapidamente a lei que altera o regime de pensões, bem como aprovar a nova tabela salarial dos funcionários públicos. O objectivo é simples: ter tempo suficiente para que estas leis sejam ratificadas pelo Tribunal Constitucional antes de entrarem em vigor em 2015. Evita-se assim o absurdo em que se tem tornado o Orçamento do Estado dos últimos três anos.

Considero esta ideia simplesmente excelente. Lamento apenas que não se tenham lembrado dela mais cedo. Ter-se-ia evitado tanta instabilidade no rendimento das pessoas. Porém, agora que tiveram essa brilhante ideia, seria bom que a aproveitassem a sério, em vez de a usarem apenas para pensionistas e funcionários públicos. Explico.

Como é mais ou menos do conhecimento público, a dificuldade de renegociar algumas das rendas obscenas que se pagam nas Parcerias Público-Privadas (PPP) tem a ver com contratos blindados que prevêem qualquer alteração unilateral possível penalizando fortemente o Estado. Até indemnizações compensatórias contra possíveis aumentos de impostos estão previstas nesses contratos. Essa blindagem faz com que o poder negocial esteja todo do lado dos privados. É, simplesmente, demasiado arriscado para o Governo forçar alterações unilaterais, pagando rendas menores. E, evidentemente, qualquer solução negociada a que se chegue tem sempre o acordo dos privados, pelo que dificilmente favorece o Estado e o interesse público.

A solução encontrada para reduzir pensões e salários pode ser aplicada exactamente da mesma forma às rendas das PPP. Basta ao Governo criar uma nova lei que permita reduzir fortemente as rendas pagas e, simultaneamente, anular as indemnizações compensatórias. Se essa lei for preventivamente enviada ao Tribunal Constitucional para que a sua constitucionalidade seja aferida, não há qualquer risco. Se o Tribunal autorizar tal lei, o que é provável se se garantir uma taxa de rendibilidade razoável ao parceiro privado, fica o Estado protegido e fica a força negocial do lado do Governo, podendo este, finalmente, defender o interesse público nesta matéria.

Em suma, o meio encontrado para fazer os ajustamentos que o Governo considera necessários às pensões e aos salários da função pública pode, com a mesma facilidade, ser usado para finalmente reduzir as rendas pagas às PPP.

É só uma ideia.

4 comentários:

  1. Caro LA-C,

    Não sabe que os contratos com privados têm várias "categorias"? Há os contratos com os credores, que são intocáveis (não estou a falar da Troika), como convém na relação entre Senhor (credor) e Súbdito Feudal (o Estado Português); depois temos os contratos das PPP e rendas energéticas, entre iguais, em que se evita a guerra e apenas se apela à boa vontade e modificações cosméticas; depois tem os contratos com os servos da gleba, perdão, funcionários públicos, e os com os mendigos, perdão, indigentes, isto é, pensionistas - este são para dispôr à vontade do Suserano, quer dizer, Estado... Uma verdadeira sociedade económico-juridico-feudal no Séc. XXI.

    ResponderEliminar
  2. Estimado Luis,

    É uma excelente ideia, mas não funciona.
    Estribar-se o governo na constitucionalidade de uma eventual lei que lhe permitiria tratar de igual modo os contratos das PPP como trata os salários da função pública e as prestações dos pensionistas teria o mérito de obrigar o TC a reconhecer os limites materiais das suas decisões nestas matérias, mas não daria ao governo capacidade para denunciar unilateralmente tais contratos.

    Penso que a via mais adequada é a renegociação sustentada na denúncia dos pressupostos dolosamente mal calculados que justificaram as rendas atribuidas. Há quem tenha, com conhecimento de causa, e dado conhecimento público, de que houve em vários casos, se não todos, empolamento de volumes de actividades para níveis claramente inatingíveis.

    Mas, que se saiba, a utilização deste argumento não tem sido utilizado, ou terá sido de modo mitigado e discreto, talvez para que não sejam obrigados a saltar alguns dos coniventes representantes dos interesses colectivos nas tramóias que levaram à celebração de tais contratos.

    ResponderEliminar
  3. LA-C, e porque nao enviar os contratos iniciais para o constitucional? Se este os declarar inconstitucionais, o Governo fica com maos livres para fazer o que quiser, desde que atribua uma remuneracao em linha com o risco-retorno do mercado.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. :) :) :) Boa!
      Não me parece que se possam mandar contratos para o TC (Tribunal Constitucional), mas muitos deles já foram revistos por outro TC (Tribunal de Contas) que considerou muitos deles absurdos. Até se chegou a queixar de ocultação de documentos e a dizer que deu pareceres favoráveis com base em informações erradas.

      Mas, e este é o ponto, nada parece acontecer. Assumam de vez que é falta de vontade.

      Eliminar

Não são permitidos comentários anónimos.