quinta-feira, 30 de agosto de 2018

Snobismo apimentado

Eu não devia escrever a esta hora -- aqui já são 21h19, que é como quem diz, hora de eu ir para a cama porque me levanto antes das seis; quer dizer, é mais idealismo porque eu carrego no snooze umas duas vezes --, mas hoje estava a pensar em moinhos e em ainda não vos ter falado sobre o meu moinho. Qual moinho? O de pimenta, claro.

Comprei o meu primeiro moinho de pimenta numa loja de caridade por volta do ano 2000 e é todo feito em madeira e metal; custou 25 cêntimos. Funciona muito bem, mas tive de o dedicar à moagem de estrelas de anis porque precisava de fazer broinhas doces no Natal e aqui não há erva-doce. Uns anos mais tarde, decidi comprar outro moinho de pimenta, este da Fletcher's, depois de o ver mencionado no blogue Chocolate and Zucchinni. Gosto muito dele, mas quando quero moer muita pimenta, o meu dedo doi.

Comprei depois um moinho a pilhas, mas era baratucho e partiu-se. Também fiquei um bocado chateada com ele porque não o achei excepcional, mas que queria eu? Foi barato e o barato sai caro. Por volta dessa altura, comecei a pensar que o melhor era comprar outro igual ao primeiro moinho que eu tinha comprado. Iniciei uma investigação exaustiva nas lojas especializadas, como a Williams Sonoma e a Sur la Table, há mais de cinco anos, mas todos os moínho que vi tinham plástico e eu queria metal. Ai, pagar $40 ou $60 por um moinho com mecanismo de moagem de plástico parece-me parvo. Eu sou acima de tudo muito snob...

Pensei depois que o óbvio seria procurar em lojas de caridade, que foi onde eu encontrei o primeiro. Em Houston, encontrei um todo em metal e madeira por $2 -- malvada inflação --, mas quando cheguei a casa verifiquei que o moinho não funcionava muito bem, apesar de ser de metal; percebe-se por que acabou na loja. A minha busca por um moinho de pimenta decente foi elevada a uma obsessão part-time.

Nunca me tinha ocorrido procurar em Portugal, mas na minha última visita, saí para almoçar com uma amiga e, durante o meu passeio, calhou passar pela Rua Ferreira Borges, em Lisboa, ali ao pé das Amoreiras, e notei que havia uma lojinha de produtos de casa, inclusive coisas de cozinha. É uma loja mais antiga, mas quando a vi lembrei-me daqueles livros sobre Paris que falam daquela loja de artigos de cozinha muito famosa em que os empregados nos tratam mal. Já não me recordo se foi num livro do David Lebowitz or do David Sedaris que li um episódio engraçado a propósito.

(Antes de pensarem que tenho memória de elefante, desengamem-se: conheço a Ferreira Borges muito bem porque quando eu era pequena ia visitar a minha tia em Lisboa e passávamos muito por lá para ir ao Centro Comercial e, claro, há uma R. Ferreira Borges, em Coimbra, logo é um nome fácil de eu recordar.)

Decidi entrar e estava um senhor já de idade sentado à espera de clientes. A loja estava tão cheia que mal havia espaço para me movimentar à vontade, mas perguntei ao senhor se tinha moinhos de pimenta e ele foi logo buscar um. Inquiri se era de metal o mecanismo e ele olhou para mim como se eu fosse completamente avariada por fazer uma pergunta cuja resposta era obviamente afirmativa (note-se que ele não me tratou mal, apensas achou que a minha pergunta era estranha). Ó, apaixonei-me logo pelo moinho e pelo senhor.

Paguei €15 pelo meu moinho e o senhor embrulhou-o em papel pardo (recusei o saco de plástico) e meti-o no meu saco e saí toda contente. O moinho foi feito no Japao, não sei quando; só sei que funciona muito bem e é umas das coisas que me faz feliz cá em casa.

A esquina onde fica a loja:


O meu moinho de pimenta -- sempre que o uso fico super-feliz porque funciona mesmo bem e lembro-me do senhor que mo vendeu:

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