Os efeitos do Brexit na economia europeia são imprevisíveis e irão sentir-se por muito tempo. Como acontece com todos os choques e mudanças, alguns países serão mais afectados do que outros por aquela decisão do Reino Unido.
As economias são diariamente afectadas por milhares de choques e mudanças com milhares de proveniências. A inovação nas tecnologias de informação e comunicação, a globalização e a liberalização económica e financeira, e a integração europeia aceleraram a mudança e a transmissão dos choques na economia mundial, como bem demonstraram a crise financeira internacional de 2007/2008 e a crise das dívidas soberanas.
No entanto, o nosso mundo foi, nos últimos séculos, um local de grandes mudanças e esteve sempre muito exposto a choques. Se nos concentrarmos nas últimas décadas podemos, sem ser exaustivos, elencar um conjunto de mudanças e choques a que a economia portuguesa não ficou imune: a adesão à EFTA e a guerra colonial (anos 60); o fim do Sistema de Bretton Woods (71/73); a revolução de 25 de abril, a descolonização e o processo de nacionalizações (74/75); choques petrolíferos de 73, 79/80, 90/91 e 2008; a adesão à CEE em 1986; a Perestroika, o fim da Guerra Fria e a reunificação alemã na segunda metade dos anos 80; o fim do império Soviético e a guerra civil na ex-Jugoslávia no início dos anos 90; a adesão ao SME em 1992; a invasão do Kuwait pelo Iraque em 1990; as crises do SME de 92 e 93; a criação do euro em 1999; o 11/09/2001; a entrada da China na OMC em 2001; a invasão do Iraque pelos EUA em 2003; o excesso de liquidez nos mercados internacionais e as baixas taxas de juro; a Primavera árabe; as dificuldades de acesso ao financiamento durante a crise financeira internacional e a crise das dívidas soberanas; o conflito na Ucrânia; a incerteza política em relação à solução governativa em Espanha; etc.
Muitos destes choques e mudanças tiveram efeitos negativos na economia portuguesa; outros tiveram efeitos positivos. Com uma estagnação que já dura há 15 anos a tentação para culpar o contexto externo é muito grande: é por causa do Pacto de Estabilidade e Crescimento (que violamos ininterruptamente desde 2001…), é por causa do euro, é por causa da China, é por causa da Alemanha que privilegia como área económica o centro e o Leste da Europa, foi por causa das baixas taxas de juro e foi por causa das altas taxas de juro, foi por causa do aumento do preço do petróleo, é o Tratado Orçamental e as sanções (que nunca sofremos até hoje), é a União Europeia que não respeita a soberania dos países, é a União Europeia que é ainda incompleta, é a crise em Angola e no Brasil… e pode ser agora a instabilidade nos mercados por causa do Brexit…
Uma pequena economia como a portuguesa, que pertence à zona euro e cujo processo de desenvolvimento passa necessariamente por aumentar o peso das exportações no PIB, estará cada vez mais exposta aos choques provenientes dos seus parceiros comerciais. Podemos tentar ajudar a melhorá-lo – dar contributos para a zona euro e as instituições europeias funcionarem melhor. Mas o desafio que se coloca aos nossos decisores de política económica é encontrar as políticas adequadas para fazer crescer a economia tendo em conta as restrições, mas também as oportunidades, que a integração na economia europeia e mundial coloca.
Como podemos melhorar o nosso sistema político? Como podemos melhorar a organização e eficiência do Estado? Será que as nossas crianças, independentemente dos níveis de escolaridade e rendimento da família em que nascem, têm as mesmas oportunidades? As nossas empresas têm a mão-de-obra de que necessitam para serem competitivas no mercado internacional? A estrutura de financiamento das empresas garante os incentivos adequados? São estas algumas das questões que eu gostava de ver mais discutidas, tendo sempre em conta o mundo que vivemos.
Caro Fernando Alexandre:
ResponderEliminarDisse: «o desafio que se coloca aos nossos decisores de política económica é encontrar as políticas adequadas para fazer crescer a economia».
Mas no mundo em mudança que acabou de descrever, os decisores políticos não andam sempre a «apanhar bonés», sempre muito atrás dos acontecimentos?
E não acha que muito do que enuncia na parte final do seu texto já se fez ou está a fazer?
O problema não é a dissonância entre o que se passa na realidade e o mundo virtual que os vários meios de produzir notícias criam permanentemente sobre a realidade?
Que os populistas de todos os quadrantes aproveitam para atingir os seus objectivos com o aplauso dos que irão imolar no altar do poder quando lá chegarem.
Quer dois exemplos: o radical Farage publicitou, na campanha pelo Brexit, que 3,4 milhões de libras que vão para a UE passariam para o SNS inglês.
Logo que saiu vitorioso disse que não e que tal nunca deveria ter sido prometido.
Mas com isso conquistou os votos de muitos pacóvios.
O Rivera, do Ciudadanos, que se apresentara como «limpo», perdeu 400 mil votos pela má condução política pós entre o 20D e o 26J e veio culpar o sistema eleitoral.
O mesmo que lhe permitiu o êxito no 20D.
Portanto, aponte-nos a solução.
Correcção ao meu comentário anterior:
ResponderEliminarO Rivera, do Ciudadanos, que se apresentara como «limpo» a 20D, perdeu 400 mil votos pela má condução política entre o 20D e o 26J e veio culpar o sistema eleitoral.
O mesmo sistema eleitoral que lhe permitiu o êxito no 20D.
O último parágrafo é bem importante. Todavia, venho comentar apenas um pormenor lateral, relacionado com a aceitação do que se faz.
ResponderEliminarDurante a penúltima intervenção internacional em Portugal soube-se, com clareza, que algumas medidas justificadas através de exigências externas eram apenas uma maneira de comunicar com o interior do país tendo ficado bastante claro que parte da austeridade então desenhada tinha a ver com o modo de justificá-la, não com o seu óptimo no tempo.
Há cinco anos alguém quis decalcar do referido animal politico uma solução semelhante, através da inanidade de “ir além da troika”. Percebeu-se logo que alguns lêem e memorizam sem compreenderem o suficiente para se adaptarem ao contexto – o país tinha mudado muito e, no entanto, alguns não tinham entendido quase nada.