O fenómeno dos emigrantes portugueses gastarem dinheiro em casas em Portugal não é novo, já tinha acontecido durante o Estado Novo, só que enquando que os emigrantes de outrora construiam casas nas aldeias onde tinham as suas famílias, hoje em dia os emigrantes procuram casa em áreas mais urbanas e com boas oportunidades de lazer, ou seja, há uma concentração de procura em sítios como Lisboa e no Porto. Suspeito que o número de vistos Gold deve ter tido menos impacto no imobiliário do que o da comunidade emigrante. Dos meus amigos portugueses nos EUA, vários têm casa e nenhum a tem arrendada a outras pessoas. Recentemente, também houve políticas de incentivo ao retorno de emigrantes para Portugal e estas pessoas não foram para aí para ter menos poder de compra do que os residentes.
Depois há também os imigrantes que procuram Portugal como um sítio onde conseguir melhor qualidade de vida do que nos países de origem. As redes sociais e a imprensa internacional estão cheias de páginas a promover Portugal junto dos estrangeiros não só como destino de férias, mas também como sítio onde se viver. Mesmo sem a promoção oficial, é natural que Portugal não escapasse a esta tendência que parece ser internacional. Por exemplo, o Cheap Old Houses começou sendo uma página no Instagram onde se fazia publicidade a casas americanas com interesse arquitectónico a precisarem de ser renovadas, mas expandiu a geografia de interesee e agora tem uma lista internacional de casas baratas e até tem direito a programa de TV na HGTV. Há muitas contas de expatriados que promovem o seu estilo de vida noutros países: a Jamie Beck, americana, mudou-se para Provence, na França; a Stephanie Jarvis, inglesa, comprou um castelo a precisar de obras na França e criou um canal no YouTube para financiar o trabalho; a Gayle McNeill, inglesa, vendeu a sua casa em Inglaterra e mudou-se para o Algarve com o marido. E por aí fora...
Do lado da oferta, não se pode dizer que haja falta de casas em Portugal, dado que, segundo um estudo da OCDE, Portugal até tem mais casas per capita do que a maioria de países da OCDE, dado que está em quarto lugar, atrás da Grécia, França, e Itália. No entanto, talvez as casas que existem não se adequem às necessidades de quem procura casa. Os segmentos da população que têm maior dificuldade em mudar de/encontrar casa são as pessoas de mais baixos rendimentos, inclusive os reformados e os jovens que iniciam a vida profissional. Para estes, casas mais pequenas e de menor custo poderiam ajudar a resolver o problema. Talvez interessasse ao estado promover a renovação de prédios devolutos, mas aproveitando-os para fazer apartamentos mais pequenos, quiçá estúdios, que permitam aumentar a densidade populacional, sem sacrificar a privacidade.
Há também ideias que estão a ser implementadas que podiam ser exploradas a maior escala. Por exemplo, no Porto há o Programa Aconchego que emparelha jovens estudantes universitários que precisam de casa com pessoas de idade que vivem em casas com espaço para os acolher (tenho uma amiga neste programa). E porque não ter um programa deste género que emparelha reformados com casa que gostariam de companhia com reformados sem casa que não se importassem em dar companhia?
Outra ideia para aumentar a oferta de casas é facilitar a renovação de casas já existentes que precisem de obras, talvez com crédito com boas condições, ou até o estado a financiar as obras com a condição da casa ser arrendada a pessoas de rendimentos mais baixos. Frequentemente o licenciamento para obras é um dos entraves, logo as autoridades locais podiam rever as regras para agilizar o processo ou até educar a população acerca das regras para que a pessoa não gaste o dinheiro em obras e depois não passa a inspeção.
A diversificação geográfica da actividade económica também pode ser usada para adequar a oferta e a procura. Hoje em dia com a Internet não se justifica que tantos empregos ainda estejam localizados em Lisboa e Porto, com o resto do país subaproveitado.
Quanto à ideia de se construir mais casas, acho má. Por um lado, com o envelhecimento da população e a baixa da natalidade, não faz sentido estar a gastar recursos em construir casas, a não ser que o plano seja mudar toda a gente que vive em zonas rurais para Lisboa e Porto e deixa-se o resto do país às moscas. Seria muito mais produtivo para o país se o financiamento fosse usado para construir negócios que gerassem empregos e dinamizassem outras regiões do país, em vez de mais casas. Até porque dificilmente quem tem dificuldade em encontrar casa agora tenha recursos para se mudar para uma casa acabada de construir, ainda por cima com o custo de construção a aumentar devido à inflação.
Mas pode ser que o problema se resolva a si próprio. Nos últimos dias apareceram vários portugueses num dos meus grupos de Facebook a perguntar como emigrar para os EUA. Ele é tecnicos de HVAC, licenciados em Desporto, soldadores, motoristas de pesados, geógrafos,... Daqui a nada, Portugal fica só com baratas e pessoal dos partidos.
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