A Economia Keynesiana está na moda, escreve o Noah Smith. Para ser adequado implementar o que chamam de Economia Keynesiana -- diminuição de impostos, aumento de gastos públicos -- tem de existir uma falha na procura agregada e a economia não pode estar próximo do pleno emprego ou até em pleno emprego; esses detalhes são frequentemente ignorados.
A economia americana está perto do pleno emprego. Repare-se que a Reserva Federal começou a contrair a política monetária há três anos e a taxa de desemprego não aumentou, logo não é evidente que a economia esteja em recessão, necessitada de estímulo fiscal; mas quando se tem apenas um martelo, tudo parece um prego.
A participação dos trabalhadores no mercado de trabalho está baixa, mas a longevidade dos americanos está em alta por enquanto; as gerações mais jovens já têm esperanças médias de vida mais curtas. O número de anos que se frequenta a escola também, especialmente porque, por causa da Grande Recessão, muitas pessoas regressaram à universidade para estudar. Havendo mais americanos reformados e um maior número de estudantes, o pressuposto ceteris paribus é violado e torna-se difícil comparar os dados actuais de participação no mercado de trabalho com os de gerações anteriores.
No entanto, há sub-emprego e desemprego local, mas o que também há é um nível de mobilidade da força laboral que está a mínimos históricos, uma tendência que se agrava há décadas, apesar de haver muitas empresas que não conseguem encontrar trabalhadores que queiram trabalhar (ler o livro The Hillbilly Elegy, por exemplo), quanto mais pessoas qualificadas para trabalhar -- fala-se em skills gap: um desencontro entre as qualificações que a economia precisa e as qualificações dos trabalhadores.
Este desencontro tornar-se-á mais pronunciado durante a próxima recessão que, muito provavelmente, se irá dever a mudanças estruturais causadas pela Internet. O sector de vendas a retalho americano está prestes a entrar em colapso; atrás dele cairá o imobiliário comercial. Este ano, quase todas as semanas, há uma cadeia comercial a fechar lojas ou a entrar em falência. (O sector automóvel também está fraco; falar-vos-ei disso noutro dia.)
O rácio de área comercial per capita nos EUA é alto, quando comparado com outros países (EUA: 7,3 metros quadrados; Japão e França: 0,16; Reino Unido: 0,12), fruto da expansão que ocorreu antes de e durante a Grande Recessão. Só que, entretanto apareceu o Pinterest, o Instagram, os blogues dos influenciadores, o Like to Know It, as empresas chinesas que vendem directamente pela Internet via eBay ou publicidade no Facebook (muitos casos são fraudulentos), a Amazon, que foi a grande responsável por esta revolução, etc.
Nos acessórios e nas roupas, não é preciso comprar tudo por causa da chamada economia de partilha (share economy): pode-se alugar (e.g., Rent the Runway, Bag Borrow or Steal), existindo mesmo serviços em que nós damos o nosso número, o nosso estilo, e alguém faz toilettes e envia para nossa casa em troca de uma mensalidade, quando nos fartamos mandamos de volta. Outra tendência crescente é o minimalismo, que tem um documentário, e também tem influenciadores, como aquela senhora que durante três meses apenas usou 33 peças de roupa e acessórios para fazer as suas toilettes de trabalho e ninguém topou (ver projecto 333).
Mesmo a área da mercearia e hortaliças está diferente. Há empresas que entregam os ingredientes para fazer refeições directamente em nossa casa, já acompanhados da receita (ver Blue Apron, Hello Chef, etc.). As mercearias tradicionais começaram a fazer entregas ao domicílio e algumas oferecem compras via Internet que se vão buscar à loja empacotadas pelos empregados. Em Portugal, o Continente já fazia entregas ao domicílio há mais de 10 anos; as modas nos EUA por vezes demoram a instalar-se, mas quando se instalam costumam ter um carácter mais compulsivo e destruidor.
Este ano será, no mínimo, interessante.
E há mais lenha a entrar na fogueira
ResponderEliminarhttps://www.ft.com/content/a272ee4c-1b83-11e7-bcac-6d03d067f81f
Essa parte não é preocupante. O Presidente Trump é especialista em dívida de estudantes; ele até tem uma universidade, logo resolverá isso facilmente.
Eliminar"O número de anos que se frequenta a escola também, especialmente porque, por causa da Grande Recessão, muitas pessoas regressaram à universidade para estudar. "
ResponderEliminarEssa parte (sobretudo do "especialmente" para a frente) não deita por terra o raciocinio implícito? Afinal,se as pessoas voltaram à universidade por causa da recessão, isso parece confirmar que há efetivamente desemprego oculto (não que essas pessoas concretas agora fossem sair da universidade se houvesse empregos - imagino que vão ficar até acabar o curso - mas isso significa que essa diminuição da população ativa é conjuntural, e que se calhar há outras pessoas que, nos próximos tempos, irão para a universidade se a economia estiver abaixo de um certo nível de atividade mas irão trabalhar se estiver acima)
"fala-se em skills gap: um desencontro entre as qualificações que a economia precisa e as qualificações dos trabalhadores."
Se for isso, será de esperar um grande aumento dos salários nalgumas profissões e estagnação ou até redução noutras - há alguma evidência disso, a nivel de estatísticas (isto não é uma pergunta de retórica - estou mesmo a perguntar se há)?
O meu raciocínio é que é difícil neste momento comparar dados actuais com passados porque houve algumas mudanças estruturais, uma delas o aumento do nível de educação procurado. Não sei qual o raciocínio implícito a que te referes porque eu não disse que seria impossível fazê-lo no futuro. Quando se analisa dados, as pessoas devem ter em conta os limites dos dados que têm.
EliminarOs salários estão a aumentar e desde 2016 têm aumentado a uma taxa mais alta do que a taxa de inflação alvo da Reserva Federal.
http://www.businessinsider.com/average-hourly-earnings-wage-growth-march-2017-2017-4
Quanto às indústrias que têm maiores ganhos, podes ver um gráfico aqui:
https://www.bloomberg.com/news/articles/2017-02-21/want-a-raise-these-u-s-industries-are-driving-wage-growth