~ Johann Hari
Como podem imaginar, estes últimos dias têm sido um bocado deprimentes por causa da situação na Síria--já era e eu até tinha deixado de ouvir a rádio para não ficar muito triste, como se o silêncio alimentasse a ilusão de que não há sofrimento no mundo. Não é só o sofrimento humano que me deprime; também fico triste quando vejo portugueses a dizer que Portugal está prestes a ser invadido por mouros/muçulmanos, como descreveu tão eloquentemente a Sara. Já houve quem me dissesse que os árabes nunca estiveram no noroeste da Península Ibérica, aquilo era só celtas. Portugal não é só o noroeste da península, mas há quem quer que seja. Isto deve ser o complexo da Irlanda--queremos ser irlandeses à força...
Eu podia jurar que Lisboa tinha um bairro chamado Mouraria; as laranjeiras, tão ubíquas nos quintais portugueses, tinham sido introduzidos pelos muçulmanos no que hoje é Portugal; e o Algarve, aquele sítio onde muitos portugueses vão passar férias cá dentro, é chamado assim porque os árabes chamavam a essa região "al Gharb", que significa "oeste" ou "ocidente". Quem está preocupado com a entrada dos mouros em Portugal, já está com vários séculos de atraso: antes de haver Portugal, já havia mouros no que haveria de ser Portugal. Ser português é ser parte mouro e quem rejeita a sua ancestralidade moura, rejeita ser português.
Na segunda-feira foi o Labor Day por estas partes e eu estava um bocado triste com tudo isto. Peguei no iphone, abri o Facebook, e apareceu um seminário TED. Abri a página e o primeiro seminário que me interessou foi acerca de como identificar má informação na Internet, do Markham Nolan. Agora que penso nisso, o sr. Nolan até é irlandês; devia ser a minha ancestralidade celta a puxar por mim...
Os vídeos TED são como as cerejas, não pode ser apenas um. O segundo vídeo era sobre vício e chamava-se "Everything you know about addiction is wrong". Comecei a ver e, a certa altura, o orador, o Johann Hari, fala em Portugal, de como é o único país do mundo que realmente descriminalizou o consumo de drogas. Essa parte eu sabia--quase toda a gente nos EUA pensa que a Holanda tem a política mais liberal no que diz respeito a drogas; mas não, é Portugal.
Mais tarde recordei-me de um episódio que tem exactamente 20 anos. Uma das primeiras pessoas que eu conheci nos EUA foi um rapaz chamado Michael Silva. Quando ele soube que eu era portuguesa, disse-me que também era português por parte do seu avô, mas era fácil de adivinhar que o era pelo seu sobrenome. Eu perguntei se ele tinha aprendido muito sobre Portugal com o avô e ele disse-me que não, o avô tinha deixado a sua avó quando ela ainda estava grávida. E nesse momento, para mim ser português foi uma coisa triste. Às vezes, magoa ser português.
"Ser português é ser parte mouro e quem rejeita a sua ancestralidade moura, rejeita ser português."
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ser português é ser Cristão e ponto final paragrafo!! Portugal apoiar a islamização da europa!!!?? afinal a geração europeia é a geração islamica...
Eu não acho. Portugal foi fundado à revelia do Papa, logo para mim a fundação do reino de Portugal até pode ser vista como uma afronta a Deus. Eu gosto muito que o fundador de Portugal desafiasse Deus, foi uma concepção muito moderna de estado. Isto é a minha visão impressionista; eu não sou historiadora de profissão.
EliminarJá o Prof. José Matoso, cara Rita, em estudo crítico à obra de Herculano acerca da história do municipalismo português nos descrevia, a norte do Douro, hoje nordeste de portugal, trás os montes, e onde se dizia que vivalma ali habitava face às razias de lado a lado, da persistência de comunidades que se designavam em aldeias. Do imperador de toledo que entregou o zelo da almedina, de coimbra, a um conhecido moçárabe (a título de curiosidade, os Lusitanos não eram um povo celta, apesar de alguns costumes celtas que adquiriram, principalmente de vetões celticizados e outros celtas iberos).
ResponderEliminarA ignomínia e o exagero, o excesso na virtude é um vício, costumam andar de mão dada, já ensinavam os antigos como o Aristóteles. Prudência e compaixão, pois que a compaixão sem prudência cedo faz esmorecer a boa vontade e extirpa, do coração dos homens, a paixão e, sobretudo, a compaixão!! (na madeira, por exemplo, região que conta com uma tremenda comunidade emigrada e com o retorno regular de milhares de emigrantes madeirenses que, sem qualquer apoio do Governo Regional, voltam a recorrer à emigração, não vislumbro valor algum, muito menos prudência, no esforço que o Governo Regional pede aos Madeirenses para acolher refugiados da Síria ou de outro País qualquer!! Parece-me, sinceramente, uma tolice para a fotografia dos que se compadecem mais alto!! Perigosa tolice!!)
Os mouros estiveram em toda a península, excepto nas Astúrias, pelo que o noroeste do actual território português não escapou. Claro que, pelo noroeste, a presença moura foi de curta duração e sempre em fluxo e refluxo, já que não havia propriamete fronteiras. O Porto - cujo nome latino Portus Cale daria, como sabemos, o nome a Portugal - foi reconquistado pelo Conde Vímara Peres em 868 (há uma estátua dele junto à Sé a assinalar o acontecimento). F
ResponderEliminarFalar de celtas nessa época da História é anacrónico. Entre a queda do Império Romano e a invasão árabe/moura da península em 711 a principal população eram os visigodos. Há no norte de Portugal muitos traços toponímicos da presença daquela tribo germânica, como Freamunde, Gervide, Gemunde ou Nevogilde.
PS Não sabia que tinham sido os árabes a trazerem as laranjeiras. É, portanto, estranho, que em grego ou persa, por exemplo, laranja se diga "portugal".
Caro Alexandre Burmester, os Celtas precedem a presença de Alanos, Suevos e Visigodos, em largos séculos, precedem inclusive os Romanos e serão contemporâneos, talvez, à presença Grega e Fenícia.
EliminarSei muito bem, meu caro. Trata-se de uma civilização pré-romana. Por isso referi que é anacrónico mencioná-los relativamente ao tempo da invasão moura (referia-me ao artigo).
EliminarNós trouxemos as laranjas doces da China (em alemão e sueco, por exemplo, laranja diz-se "maçã da China). E fui verificar para ter a certeza de que não dizia asneira, e sim, em árabe, tal como em grego, laranja diz-se "portugal". Deduzo que as laranjas que os árabes espalharam eram as amargas (ditas de Sevilha) mas que fomos nós que trouxemos a variedade que toda a gente prefere hoje em dia.
ResponderEliminar(Isto é só um pequeno aparte sobre um texto que me tocou porque nós ignoramos completamente a forma, geralmente positiva, como o resto do mundo nos vê).
Muito obrigada pela clarificação e pelo feedback, Isabel!
EliminarFaz bem em ter e gosto em ser portuguesa da UE. Tirando alguma ineficiencia nata, os portugueses são muito mais tolerantes, do que a maioria dos povos do mundo.
ResponderEliminarSé agora li, e ouvi, isto. Muito bom Rita, muito bom.
ResponderEliminarObrigada!
EliminarRita,
ResponderEliminarhttp://www.publico.pt/diversidade/jornal/a-historia-de-portugal-contada--pelos-nossos-genes-21878549
Em resumo, os mouros é ali de Coimbra para baixo. O pessoal cá de cima, intuitivamente, até tem razão ;)