terça-feira, 6 de outubro de 2015

A importância do líder do PS ser de ‘esquerda’

João Miguel Tavares, no Público de hoje, aposta na permanência de António Costa na liderança do PS. Aposto ao lado dele. No entanto, discordo de JMT quando ele refere que o ideal seria que o PS tivesse um líder da ala direita do partido, que permitisse um governo reformador. De facto, um dos maiores obstáculos à realização de reformas em Portugal tem sido a carga ideológica que as envolve. Não há melhor exemplo disso que a adopção das chamadas políticas de austeridade, que decorrem do elevado endividamento e estagnação da economia portuguesa, mas que os partidos de esquerda (incluindo o PS) insistem em qualificar como sendo uma opção política da direita. Como se viu na Grécia, com o novo memorando assinado pelo Syriza, as políticas de austeridade decorrem da insuficiência de recursos financeiros nacionais para fazer face aos compromissos assumidos pelo Estado.

Devia ser fácil chegar a acordo sobre esta evidência e, partindo daí, procurar formas de aumentar as receitas e/ou de reduzir as despesas. O denominador comum, que não é mínimo, na discussão entre o PSD/CDS e o PS será sempre a compatibilidade das políticas económicas com a pertença à zona do euro.

O facto de António Costa representar a ala esquerda do PS parece-me ser uma condição essencial para colaborar com o próximo governo na avaliação das funções do Estado e consequente adopção das reformas que assegurem a sustentabilidade e a competitividade da economia portuguesa. Há mudanças em Portugal que só podem ser feitas com a esquerda do PS. E toda a gente sabe que já não há muito tempo para as fazer.

Embora sem liderar, António Costa tem aqui a oportunidade de desempenhar o papel reformador que Gerhard Schroeder – associado na sua juventude a movimentos de esquerda radical – desempenhou na Alemanha na viragem para o século XXI. Salvava a sua carreira política e ajudava a salvar o país.

4 comentários:

  1. "Há mudanças em Portugal que só podem ser feitas com a esquerda do PS."

    Infelizmente é verdade. Desde logo rever as normas da Constituição relativas à operacionalidade do Estado. A nossa Constituição advém de um período revolucionário em que era preciso colocar travões no texto constitucional para travar intentonas, inventonas e demais canalhices que a extrema-esquerda tentasse na altura.

    Mas hoje os tempos são outros, exigindo flexibilidade e rapidez de processos no Estado. O presidente da República não pode demorar dois meses a tomar posse, o país não pode parar no período em que há eleições presidências, porque não pode haver mais eleições imediatamente antes nem depois. Este atavismo dura há 40 anos e nunca mais se adapta a Constituição ao séc. XXI porque os socialistas são uns reaccionários que acham que esta Constituição é uma "Bíblia" em que não se pode tocar.

    O país continua dependente da sua facção socialista, retrógrada e incompetente, e a direita faz mal em não chamar as coisas como elas são, fazendo campanha pela modernização política e constitucional de Portugal. Da esquerda não se pode esperar nada senão lirismos e trafulhices.

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  2. Muito bem visto. Concordo, no entanto o maior medo que tenho é que António Costa não esteja à altura de perceber o mesmo e se mantenha na sua postura de superioridade moral repudiando toda e qualquer (necessidade de) austeridade. É a oposição fácil vs a oposição útil e patriótica. Veremos, soon enough...

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  3. Outra coisa será, ocorreu-me agora, que acusações choverão quando (se) o líder do PS, por muito de esquerda que seja, começar a assinar por baixo de algumas medidas austeras - será que a ala ainda mais à esquerda (+ BE + PCP) não o começam a acusar de ser de direita? De ser um vendido? De ser fraco? E será que isso não deixa as palavras da familia de "austeridade" sob relação directa com a direita na mesma? O que vai contar são as percepções, como sempre.

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  4. Caro Fernando Alexandre,

    Escrevi hoje um texto no mesmo sentido que o seu, em resposta a uma "opinião" da Moody's, provavelmente escrita pelo idiota de serviço, que dizia que, ao não existir uma maioria (de direita), seria difícil implementar reformas.

    Parece-me que há algo que tem escapado a agências internacionais, Troikas e outras construções mais ou menos tecnocratas: as verdadeiras reformas só são (ou são melhor) feitas pelos próprios, i.e., para reformar um área-chave da esquerda (ex. corte nas pensões), a reforma tem de ser feita (ou mesmo liderada) por essa esquerda. O mesmo se aplica à direita (se for necessário, por exemplo, cortar nos efectivos policiais ou nas forças armadas, terá de ser a direita a faze-lo).

    No caso português, e com o rol extensivo de reformas que são necessárias e que afectam todos os quadrantes, isso implica forçosamente um entendimento entre o PSD e o PS e, sempre que possível, o CDS. Admito que no futuro e se ganharem um pouco mais de "gravitas" institucional, possam igualmente ser feitas com o Bloco. Tudo o resto - as picardias, o eu-é-que-sou-mais-reformador/defensor-do-que-tu - são perdas de tempo e já as houve em excesso nestes quatro anos por culpa de ambas as partes.

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