João Miguel Tavares, no Público de hoje, aposta na permanência de António Costa na liderança do PS. Aposto ao lado dele. No entanto, discordo de JMT quando ele refere que o ideal seria que o PS tivesse um líder da ala direita do partido, que permitisse um governo reformador. De facto, um dos maiores obstáculos à realização de reformas em Portugal tem sido a carga ideológica que as envolve. Não há melhor exemplo disso que a adopção das chamadas políticas de austeridade, que decorrem do elevado endividamento e estagnação da economia portuguesa, mas que os partidos de esquerda (incluindo o PS) insistem em qualificar como sendo uma opção política da direita. Como se viu na Grécia, com o novo memorando assinado pelo Syriza, as políticas de austeridade decorrem da insuficiência de recursos financeiros nacionais para fazer face aos compromissos assumidos pelo Estado.
Devia ser fácil chegar a acordo sobre esta evidência e, partindo daí, procurar formas de aumentar as receitas e/ou de reduzir as despesas. O denominador comum, que não é mínimo, na discussão entre o PSD/CDS e o PS será sempre a compatibilidade das políticas económicas com a pertença à zona do euro.
O facto de António Costa representar a ala esquerda do PS parece-me ser uma condição essencial para colaborar com o próximo governo na avaliação das funções do Estado e consequente adopção das reformas que assegurem a sustentabilidade e a competitividade da economia portuguesa. Há mudanças em Portugal que só podem ser feitas com a esquerda do PS. E toda a gente sabe que já não há muito tempo para as fazer.
Embora sem liderar, António Costa tem aqui a oportunidade de desempenhar o papel reformador que Gerhard Schroeder – associado na sua juventude a movimentos de esquerda radical – desempenhou na Alemanha na viragem para o século XXI. Salvava a sua carreira política e ajudava a salvar o país.
"Há mudanças em Portugal que só podem ser feitas com a esquerda do PS."
ResponderEliminarInfelizmente é verdade. Desde logo rever as normas da Constituição relativas à operacionalidade do Estado. A nossa Constituição advém de um período revolucionário em que era preciso colocar travões no texto constitucional para travar intentonas, inventonas e demais canalhices que a extrema-esquerda tentasse na altura.
Mas hoje os tempos são outros, exigindo flexibilidade e rapidez de processos no Estado. O presidente da República não pode demorar dois meses a tomar posse, o país não pode parar no período em que há eleições presidências, porque não pode haver mais eleições imediatamente antes nem depois. Este atavismo dura há 40 anos e nunca mais se adapta a Constituição ao séc. XXI porque os socialistas são uns reaccionários que acham que esta Constituição é uma "Bíblia" em que não se pode tocar.
O país continua dependente da sua facção socialista, retrógrada e incompetente, e a direita faz mal em não chamar as coisas como elas são, fazendo campanha pela modernização política e constitucional de Portugal. Da esquerda não se pode esperar nada senão lirismos e trafulhices.
Muito bem visto. Concordo, no entanto o maior medo que tenho é que António Costa não esteja à altura de perceber o mesmo e se mantenha na sua postura de superioridade moral repudiando toda e qualquer (necessidade de) austeridade. É a oposição fácil vs a oposição útil e patriótica. Veremos, soon enough...
ResponderEliminarOutra coisa será, ocorreu-me agora, que acusações choverão quando (se) o líder do PS, por muito de esquerda que seja, começar a assinar por baixo de algumas medidas austeras - será que a ala ainda mais à esquerda (+ BE + PCP) não o começam a acusar de ser de direita? De ser um vendido? De ser fraco? E será que isso não deixa as palavras da familia de "austeridade" sob relação directa com a direita na mesma? O que vai contar são as percepções, como sempre.
ResponderEliminarCaro Fernando Alexandre,
ResponderEliminarEscrevi hoje um texto no mesmo sentido que o seu, em resposta a uma "opinião" da Moody's, provavelmente escrita pelo idiota de serviço, que dizia que, ao não existir uma maioria (de direita), seria difícil implementar reformas.
Parece-me que há algo que tem escapado a agências internacionais, Troikas e outras construções mais ou menos tecnocratas: as verdadeiras reformas só são (ou são melhor) feitas pelos próprios, i.e., para reformar um área-chave da esquerda (ex. corte nas pensões), a reforma tem de ser feita (ou mesmo liderada) por essa esquerda. O mesmo se aplica à direita (se for necessário, por exemplo, cortar nos efectivos policiais ou nas forças armadas, terá de ser a direita a faze-lo).
No caso português, e com o rol extensivo de reformas que são necessárias e que afectam todos os quadrantes, isso implica forçosamente um entendimento entre o PSD e o PS e, sempre que possível, o CDS. Admito que no futuro e se ganharem um pouco mais de "gravitas" institucional, possam igualmente ser feitas com o Bloco. Tudo o resto - as picardias, o eu-é-que-sou-mais-reformador/defensor-do-que-tu - são perdas de tempo e já as houve em excesso nestes quatro anos por culpa de ambas as partes.