Era um poeta, o Pascal, com o seu caniço pensante e o seu silêncio dos espaços infinitos. Diz ele que o homem é um intermediário entre o nada e o tudo, nada quando comparado com o tudo, tudo quando comparado com o nada. Deve ser por isso que a condição do homem é inconstância, tédio, inquietação. Deve ser por isso que o eu é odioso. Deve ser por isso que toda a face da terra teria sido diferente se o nariz de Cleópatra tivesse sido mais pequeno. Se, como Pascal, só acreditarmos nas histórias cujas testemunhas estejam dispostas a deixar-se degolar, então é tarde para acreditarmos no tamanho do nariz de Cleópatra. O que não significa que seja tarde para acreditar que o tamanho do nariz de Cleópatra decide o destino do mundo. Para isto não precisamos de testemunhas. Se, como Pascal, acreditarmos que somos crédulos e incrédulos, corajosos e tímidos, no que toca a causas e efeitos temos espaço de manobra. Os crédulos acreditarão na força do nariz de Cleópatra, os incrédulos não. Os corajosos afirmarão que é possível o tamanho do nariz de Cleópatra decidir o destino do mundo, os tímidos, mais uma vez, não. O que, também mais uma vez, não significa que os crédulos sejam corajosos e os incrédulos tímidos. Pode ter sido grande ou pequeno o nariz de Cleópatra e pode não ser possível sabê-lo sem testemunhas dispostas a deixar-se degolar. E pode ser possível a um incrédulo ser corajoso e a um crédulo tímido, ele próprio disse que o impossível nem por isso deixa de existir, quem sou eu para. Mas o fundamental aqui é que aquelas quatro coisas somo-lo todos e cada um de nós. O fundamental é serem estas quatro coisas os quatro elementos do espírito. A terra, o ar, o fogo e a água. A terra, incrédula, o ar, crédulo, o fogo, corajoso, a água, tímida, mas pensando no que se diz sobre água e pedras não uma timidez cobarde e mole, o melhor é abandonar a mania das equivalências quando abandonamos o mundo dos números. O fundamental é que era um poeta, o Pascal, deixemos de lado a metafísica. Os espaços que ignoro e que me ignoram. E como, há que dizê-lo, não há só poetas mas cada língua é a sua própria poesia, citemo-lo na dele, ... rien ne peut nous consoler lorsque nous y pensons de près.
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