terça-feira, 12 de setembro de 2017

Incompetência ou maluqueira?

É estranho que este caso da AutoEuropa se tenha tornado polarizante, mas é em Portugal e aí qualquer coisa serve. Há, no entanto, uma coisa que me diverte bastante, pois quem "defende" a posição dos trabalhadores da AutoEuropa diz uma coisa e faz outra.

Por exemplo, ontem no Prós e Contras discutiu-se o caso. O painel era constituído por pessoas que não trabalham um horário regular normal, aceitam participar em eventos profissionais fora do horário de expediente e sem compensação, ou seja, se fossemos a contar as horas que trabalham excederia as 40 horas por semana. E também trabalham aos fins-de-semana.

E é isto que eu acho engraçado: se trabalhar 40 horas por semana de Segunda a Sexta, durante o horário de expediente normal, é o ideal, porque é que estas pessoas que aparecem na TV, rádio, e escrevem nos jornais se sacrificam? Será que são incompetentes ou malucos?

10 comentários:

  1. Porque uma coisa é convidarem-me para ir ao Prós e Contras e eu aceitar (ou não), ou (mais realisticamente no meu caso) ficar a escrever artigos até altas horas da madrugada porque me apetece, e outra coisa é haver alguém com poder para dizer "esta semana trabalhas ao sábado e descansas é à quinta".

    No fundo, isto tem tudo a ver com as discussões acerca da "teoria da firma".

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    1. Isso é uma visão muito romântica do mundo; não é verdade que quem trabalhe a horas estranhas sempre goste do trabalho, nem que quem trabalhe a horas convencionais aprecie tal coisa. A teoria da firma não tem qualquer preferência pela hora à qual as pessoas trabalham.

      O que incomoda é que os trabalhadores que não querem trabalhar a horas estranhas consigam impor isso a toda a gente, ou seja, não se sabe se há pessoas a quem apeteça trabalhar ao fim-de-semana porque há uns fulanos que não gostam e decidem que a firma não deve contratar ninguém a essas horas.

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    2. Como já devem ter percebido, o comentário de cima era meu.

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  2. Tinha graça um mundo com hospitais, aeroportos, caminhos de ferro, auto-estradas, restaurantes e televisões encerrados ao fim-de-semana.

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  3. Não é uma questão de gostar ou não gostar; é uma questão de cada acto de trabalho "fora de horas" ser decidido caso a caso, podendo o trabalhador aceitá-lo ou rejeitá-lo de cada vez (sem a rejeição ter que implicar despedir-se do emprego) versus estar sujeito a uma regra genérica "tens que trabalhar ao sábado quando e se te mandarem". Por isso é que eu me lembrei da "teoria da firma"; porque incide vasicamente sobre essa questão (contratar cada serviço específico, num sistema 100% mercantil, versus ter um conjunto de trabalhadores e equipamentos que depois são quotidianamente adjudicados a tarefas especificas por decisão hierárquica, numa espécie de mini-economia planificada).

    Ou seja, a comparação com os trabalhadores da Autoeuropa só faria sentido se os convidados do Prós e Contras tiverem um contrato com a RTP estipulando "devem participar no programa Prós e Contras sempre que forem convocados para tal", o que imagino não seja o caso.

    "não se sabe se há pessoas a quem apeteça trabalhar ao fim-de-semana porque há uns fulanos que não gostam e decidem que a firma não deve contratar ninguém a essas horas."

    De qualquer forma, pelo que li sobre o assunto, não me parece que essa hipótese esteja em discussão, isto é, nenhum dos lados está a propor um modelo em que cada operário da Autoeuropa possa escolher, individualmente, se quer trabalhar de 2ª a 6ª ou se quer trabalhar por turnos (e, não estando, ao que sei, nenhum dos lados a propor a decisão individual, a decisão coletiva democrática - isto é, o que os trabalhadores votaram em referendo - sempre será o sistema que minimiza o número de indivíduos contrariados)

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    1. Não compreendo este argumento. Os trabalhadores da AutoEuropa trabalham neste momento um horário normal e a empresa está a funcionar a tempo inteiro dentro desse horário. Se o horário for alargado, a empresa tem necessariamente de contratar pessoas novas, ou seja, é impossível manter o mesmo pessoal. As pessoas novas podem ser contratadas para trabalhar o novo horário. Até compreendo que, temporariamente, algumas pessoas do horário antigo possam ser chamadas a trabalhar a horas estranhas para treinar o pessoal novo contratado, mas dizer que todos os trabalhadores de um momento para o outro iam andar à deriva do horário que apetecer à gerência é ridículo.

      Mas há alguma diferença, para efeitos da teoria da firma, entre um trabalhador que monta um carro à Segunda-feira e um que o faz ao Domingo? É o mesmo trabalho, suponho que os requisitos de competência também sejam os mesmos.

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    2. "(...) a "teoria da firma"; porque incide vasicamente sobre essa questão (...)"
      Isto mais parece uma conversa de surdos, uma conversa vasal...

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  4. "Não compreendo este argumento. Os trabalhadores da AutoEuropa trabalham neste momento um horário normal e a empresa está a funcionar a tempo inteiro dentro desse horário. Se o horário for alargado, a empresa tem necessariamente de contratar pessoas novas, ou seja, é impossível manter o mesmo pessoal. As pessoas novas podem ser contratadas para trabalhar o novo horário."

    Tenho 99% de certeza que o que está na mesa é pôr todos ou quase a trabalhar por turnos; e, vamos lá ver, nem seria muito prático de outra maneira: vamos imaginar uma empresa que tem 100 trabalhadores, e trabalha de segunda a sexta; a empresa decide começar a produzir também ao sábados e contrata mais 20 trabalhadores para isso. A Rita consegue imaginar uma maneira de a empresa aumentar a produção em 20% sem ser pondo também os 100 trabalhadores originais a trabalhar ao sábado na maior parte das semanas? Não digo que seja impossível, mas parece-me bastante complicado.

    [Saindo deste exemplo imaginário e simplificado para o caso real da Autoeuropa, parece que houve efetivamente uma proposta para haver mesmo só uma parte dos trabalhadores a trabalhar ao fim de semana, mas que nenhuma das partes se entusiasmou muito com isso; ver a primeira das "Três hipótese em cima da mesa"; http://expresso.sapo.pt/blogues/jose-soeiro/2017-09-01-Autoeuropa-os-trabalhadores-sabem-o-que-fazem]

    "Mas há alguma diferença, para efeitos da teoria da firma, entre um trabalhador que monta um carro à Segunda-feira e um que o faz ao Domingo?"

    Não, mas há diferença entre a empresa ter um conjunto de empregados, e decidir se eles (e quais deles) vão trabalhar ao domingo ou à segunda, ou para cada dia e cada turno ir recrutar trabalhadores ("Quem quer ir fazer o turno das 8 às 18 da quinta feira, 14 de setembro? Pagamos 70 euros!") - no fundo, é quase a diferença entre haver uma "firma" ou algo diferente. A Autoeuropa funciona no primeiro regime, os Prós e Contras no segundo (com a particularidade que suponho que os participantes não sejam pagos).

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    1. Continuo a não perceber. Estes trabalhadores não operam maquinaria? Ou será que o rácio trabalhador/capital actual é demasiado alto?

      Esse tipo de argumento é hipócrita, não é? Será que o Miguel ao fim-de-semana se fecha em casa e não faz nada que dê trabalho a alguém? E quando vai ao restaurante ou ao café paga mais ao Domingo do que à Segunda-feira?

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  5. "Continuo a não perceber. Estes trabalhadores não operam maquinaria? Ou será que o rácio trabalhador/capital actual é demasiado alto? "

    Estou a tentar perceber o que isso possa ter a ver com a questão; ou mais exatamente, as questões, já que estamos a discutir duas questões distintas:

    questão 1 - É realisticamente viável que uma empresa comece a trabalhar por turnos sem que isso implique que a generalidade dos trabalhadores pré-existentes (na atividade em causa) fiquem a trabalhar por turnos?

    questão 2 - É a mesma coisa estar integrado numa escala em que um superior hierárquico decide, para cada semana, qual o meu dia de "descanso complementar" e ser chamado/convidado para trabalha fora de horas, podendo a cada chamada aceitar o recusar esse trabalho especifico.

    Eu suspeito que o ponto das máquinas tinha a ver com a questão 1, mas, se alguma coisa, o facto de os trabalhadores trabalharem com máquinas até reforça a ideia de que é dificil criar turnos sem por os atuais trabalhadores também em regime de turnos. Explicando melhor (e voltando ao meu exemplo de uma fábrica de 100 trabalhadores que contrata mais 20):

    Se os trabalhadores trabalhassem só com as mãos, seria realmente possível manter os 100 trabalhadores originais a trabalharem sempre de segunda a sexta, e além disso todos os dias de segunda a sexta estariam a trabalhar 17 dos 20 novos trabalhadores (todos os dias 3 estavam de folga), e na sábado estariam a trabalhar 15 dos novos trabalhadores (os tais que estiveram de folga num dos dias de segunda a sexta).

    Mas, claro, num mundo em que os trabalhadores têm que se coordenar com maquinaria (incluindo as próprias instalações físicas da empresa), acho que não dá muito jeito ter 117 trabalhadores de segunda a sexta e 15 no sábado (aliás, se não fosse a necessidade de se coordenar com máquinas, nem seria então preciso um novo dia de trabalho - bastava ter 120 trabalhadores de segunda a sexta) - provavelmente de segunda a sexta iria-se ter mais trabalhadores do que máquinas e no sábado um monte de máquinas paradas.

    De qualquer forma, penso que esta parte da discussão, interessante (para mim, não necessariamente para o resto do mundo) do ponto de vista intelectual, acaba por ser irrelevante para o caso da Autoeuropa, porque aí, pelo que sei, o que está em causa é uma proposta (ou decisão?) de por todos os operários em turnos, não apenas os que foram/vão ser contratados agora.

    "Esse tipo de argumento é hipócrita, não é? Será que o Miguel ao fim-de-semana se fecha em casa e não faz nada que dê trabalho a alguém?"

    Se calhar... Em rigor, se ao fim de semana só desse trabalho a trabalhadores por conta própria (p.ex., fosse comprar o jornal a um quiosque operado pelo proprietário, fosse à praça a uma banca operada pelo concessionário, a cafés e restaurante também em que só la trabalhasse o dono) ou então em que os empregados só fossem trabalhar ao fim de semana se quisessem (ou seja, em que todas as sextas o patrão perguntasse "quem quer vir no fim de semana? Pago [X]", não haveria nada a objetar. Mas admito que é muito provável que os funcionários do atendimento da tv por cabo a quem eu por vezes telefono às 4 da manhã de sábado para domingo não trabalhem nesse regime.

    "E quando vai ao restaurante ou ao café paga mais ao Domingo do que à Segunda-feira?"

    Quando vivia em Lisboa, tenho certeza que muitos restaurantes eram mais caros ao fim-de-semana.

    O que se calhar seria mesmo hipocrisia seria se eu trabalhasse num hospital e durante muitos anos tivesse tido como função (e justificação talvez principal para a minha contratação)a manutenção do software usado para fazer as escalas dos enfermeiros e auxiliares (ou seja, se a existência de pessoas a trabalhar por turnos fosse a linha entre mim e o Rendimento Social de Inserção).

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