domingo, 4 de agosto de 2013

É razoável observarmos sondagens tão díspares?

Na última semana, soubemos de três sondagens diferentes. Numa o PS tinha uma vantagem de 10,5 pontos percentuais, noutra o PS apresentava uma vantagem de apenas 3 pontos percentuais e, finalmente, numa outra a vantagem era de 13. É legítimo perguntar se estes resultados, por si só, nos devem levantar suspeitas sobre como as sondagens são feitas em Portugal. A resposta é não. Explico de seguida.

Para facilitar o raciocínio, suponhamos que o verdadeiro valor do PS é de 35% e o do PSD de 27% e que há duas sondagens feitas com uma amostra de 1000 pessoas. Mais, admitamos que as sondagens são feitas com absoluto rigor científico, não sofrendo de nenhum dos problemas de que as sondagens tipicamente padecem (erros de cobertura da amostra, erros de medição, discrepância entre intenções de voto e o voto propriamente dito, etc).
Uma sondagem feita a 1000 pessoas terá uma margem de erro máxima de 3,1%.* Ou seja, uma sondagem que dê 32,5% ao PS e 29,5% ao PSD está perfeitamente dentro das margens de erro. Por outro lado, uma sondagem que dê 37,5% ao PS e 24,5% ao PSD também está dentro das mesmas margens de erro. No primeiro caso, a vantagem estimada é de 3 pontos percentuais. No segundo caso, a vantagem é de 13 pontos percentuais. Esta variabilidade entre sondagens é exactamente o que será de esperar se as mesmas forem rigorosamente feitas.
Como o erro amostral é inevitável, o que deveria levar o leitor a desconfiar é precisamente o contrário: se as várias sondagens dão resultados muito parecidos é porque há gato.

* Os puristas escusam de vir corrigir o exacto valor das margens de erro para um e outro caso. Se fizerem as contas verão que o exemplo que eu dou está dentro dos intervalos de confiança calculados com exactidão.

5 comentários:

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  2. (comentário corrigido)

    É tonto situar o argumento "contra" as sondagens na falibilidade/validade interna enquanto mecanismo científico, no mau uso/manipulação que se possam fazer delas ou simplesmente porque não existe massa crítica de reflexão sobre os resultados. Não. Como não é defensável sustentar a sondagem porque os regimes autoritários convivem mal com elas. Não. A manipulação não é um exclusivo do autoritarismo. As democracias também manipulam. No limite, se puséssemos em causa as sondagens por estes motivos então teríamos de acabar com os actos eleitorais por suspeita, por exemplo, de irregularidades na contagem. Também a ausência de espírito crítico tem tanta força quanto afirmar que o voto está sustentado no real conhecimento dos programas eleitorais de cada partido.
    Eu dispenso sondagens porque mais do que esclarecer o que quer que seja, bem ou mal concebida tecnicamente, ela manipula. Não é uma questão de massa acrítica. Objectivamente, qual a mais-valia em sondar o que seja para intuir que A sobe nas intenções de voto? Nada. A intenção de voto nada diz sobre a utilidade/consequência do voto das pessoas que manifestam essa intenção.
    A sondagem está a meio caminho de cumprir uma profecia. Apenas isso. Trata-se de induzir o voto, e tanto faz que ela esteja bem ou mal concebida tecnicamente. Eu sondo opiniões para saber se o meu produto terá sucesso no mercado. Mas eu faço sondagens sobre intenções de voto para quê? Para saber que A leva vantagem? Levar ao conhecimento que A leva vantagem é meio caminho para levar A a ganhar. Pertencer ao grupo que ganha é um mecanismo psicológico natural de defesa do ego. Não me interessa se a sondagem cumpre os requisitos técnicos, que a margem de erro é… que o intervalo de confiança é… quando na realidade “não tenho razões para confiar na intenção das pessoas” nem isso me diz sobre as consequências dessas intenções. Então tem um valor nulo por muito bem que esteja tecnicamente sustentada.

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  3. É tonto situar o argumento "contra" as sondagens na falibilidade/validade interna enquanto mecanismo científico, no mau uso/manipulação que se possam fazer delas ou simplesmente porque não existe massa crítica de reflexão sobre os resultados. Não. Como não é defensável sustentar a sondagem porque os regimes autoritários convivem mal com elas. Não. A manipulação não é um exclusivo do autoritarismo. As democracias também manipulam. No limite, se puséssemos em causa as sondagens por estes motivos então teríamos de acabar com os actos eleitorais por suspeita, por exemplo, de irregularidades na contagem. Também a ausência de espírito crítico tem tanta força quanto afirmar que o voto está sustentado no real conhecimento dos programas eleitorais de cada partido.

    Eu dispenso sondagens porque mais do que esclarecer o que quer que seja, bem ou mal concebida tecnicamente, ela manipula. Nem é sequer uma questão de massa acrítica a jusante. Objectivamente, qual a mais-valia em sondar o que seja para intuir que A sobe nas intenções de voto? Nada. A intenção de voto nada diz sobre a utilidade/consequência do voto das pessoas que manifestam essa intenção.

    A sondagem está a meio caminho de cumprir uma profecia. Apenas isso. Trata-se de induzir o voto, e tanto faz que ela esteja bem ou mal concebida tecnicamente. Eu sondo opiniões para saber se o meu produto terá sucesso no mercado. Mas eu faço sondagens sobre intenções de voto para quê? Para saber que A leva vantagem? Levar ao conhecimento que A leva vantagem é meio caminho para levar A a ganhar. Pertencer ao grupo que ganha é um mecanismo psicológico natural de defesa do ego. Não me interessa se a sondagem cumpre os requisitos técnicos, que a margem de erro é… que o intervalo de confiança é… quando na realidade “não tenho razões para confiar na intenção das pessoas” nem "isso me diz sobre as consequências dessas intenções". Então tem um valor nulo por muito bem que esteja tecnicamente sustentada.

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  4. "Levar ao conhecimento que A leva vantagem é meio caminho para levar A a ganhar. Pertencer ao grupo que ganha é um mecanismo psicológico natural de defesa do ego."

    Tanto quanto se sabe, isso é falso.
    Saber que A está à frente nas sondagens não dá vantagem nos actos eleitorais (até porque existem vários efeitos que poderiam ter consequências opostas, tais como os eleitores desse partido não sentirem tanta necessidade de votar, e portanto não se darem ao trabalho de se deslocarem às urnas, etc..).

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  5. Há uns anos li algures que o único efeito comprovado das sondagens era a "abstenção por certeza de vitória" - isto é, se as sondagens indicam que um partido vai ganhar de certeza, os potenciais eleitores desse partido tendem a ir a praia em vez de votar, porque "já está ganho" (um apontamento meu: suspeito que o facto de o partido mais votado, quase por definição, tender a ter muitos simpatizantes pouco politizados contribuirá para isso). Se assim for, a sondagem estará mais próxima de destruir uma profecia do que de a cumprir.

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