terça-feira, 1 de abril de 2014

Eles sabem o que assinaram?

Escreve Pedro Lains, “Um dos argumentos de quem é "contra" a reestruturação da dívida portuguesa (as aspas é porque ninguém é mesmo contra) é que ela já foi feita há uns tempos, quando os empréstimos da troika passaram dos 5 para os 3%, em média, e os prazos foram alargados em sete anos.”

Não é bem isso que está em causa. O principal argumento de quem está contra o Manifesto que Lains e outros 73 subscreveram é ligeiramente mais subtil e segue as seguintes linhas: se o Manifesto apenas pede a reestruturação da dívida oficial então o manifesto é totalmente irrelevante, porque se limita a pedir algo com que todos estamos de acordo, algo que já foi feito e que irá continuar a ser feito, independentemente de qualquer manifesto. Quando muito podemos criticar, e bem, a ineficácia do governo. Já se o Manifesto exige a reestruturação da restante dívida então tal pode ter consequências catastróficas. Portanto, o argumento é simples: pôr a reestruturação da dívida não oficial em cima da mesa é, neste momento, um acto de absoluta inconsciência.

E como responde Pedro Lains a este argumento? Não responde. Há dois dias perguntei-lhe directamente no Facebook, depois de ele ter prometido que não ia fugir às respostas: “A reestruturação da dívida que assinaste no manifesto, é só referente à divida detida pela tróica, ou refere-se também à restante?”

Resposta de Pedro Lains: “Essa pergunta é armadilhada, embora seguramente não de propósito. Percebes isso? O que eu acho é que o Governo deve ter como prioridade política negociações sobre a dívida e estabelecer cenários em que há espaço para que isso aconteça e não apenas cenários em que não há nenhum espaço para que tal aconteça, como faz.”

Ou seja, à pergunta mais básica possível, que é saber a que parte da dívida se aplica a reestruturação, Pedro Lains, simplesmente, não sabe ou não quer responder. É natural.

9 comentários:

  1. (1) A dívida tem que ser reestruturada, porque é impagável. Pode ser reestruturada mais tarde ou mais cedo, mas vai ter que o ser, pelo que a questão tem que ser colocada. O Luís A-C não enfrenta este facto.

    (2) É evidente que a dívida tem que ser reestruturada toda ela, e não apenas a dívida à troika. É claro que isso terá consequências desagradáveis, embora eu duvide que possam propriamente ser catastróficas. Porém, o que tem que ser tem muita força.

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    1. Obrigado por deixares bem claro a resposta à minha pergunta em (2). Quanto ao que dizes em (1), o que declaras ser um facto, eu não considero um facto. És capaz de me dizer porque consideras um facto?

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    2. Porque uma dívida de 130% do PIB a pagar juros de 4% ao ano significa que o Estado necessita de ter um saldo primário de 5,2% do PIB. Não conheço nenhum Estado democrático e sem petróleo que consiga ter tal saldo primário, ano após ano após ano.
      É claro que a inflação pode fazer diminuir este valor. Mas, mesmo que a inflação seja de 2%, ainda assim o Estado precisará de um saldo primário de 3,2%. Continuo a não conhecer nenhum que o alcance.
      Há ainda a hipótese de crescimento económico mas, com uma população em regressão e cada vez mais envelhecida, é muito difícil ter um crescimento económico de mais do que 1 ou 2% ao ano (e se se conseguir isso já é um pau).

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    3. Caro Lavoura, relativamente à inflação não estaria assim tão seguro, por baixo!! Há 7 anos atrás as perspectivas de inflação no mundo desenvolvido apontavam-se, nos menos alarmistas, aos 5%, para cima!! O esconjurar das fantasmagóricas pressões inflacionarias tem, de certo modo, sido um carrasco para a nossa parte!!

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    4. Luís Lavoura, isso que diz não faz da dívida impagável um facto. É, apenas, a sua opinião e até bastante mal fundamentada, diga-se. O peso dos juros são de 4,5% do PIB. Com uma inflação de 2% e um crescimento médio de 2% (valor absolutamente medíocre, diga-se, apenas na última década crescemos tão pouco), basta ter um excedente orçamental primário de 0,5%. tendo um excedente de 3 ou 4% já dá bastante margem.
      Depois, mesmo que não conheça países com excedentes primários prolongados, tal não torna a sua opinião num facto, apenas a torna numa opinião mal informada. Por exemplo, entre 1985 e 2008, o excedente primário médio na Bélgica foi de 4%.
      Finalmente, mesmo que não houvesse (vários) exemplos de excedentes primários significativos e constantes, tal não quereria dizer que os mesmo eram impossíveis. Simplesmente eram não observados porque, naturalmente, regra geral tais excedentes são desnecessários. A não ser que seja necessário abater dividas públicas muito elevados, por que raio haveriam os governos de manter excedentes orçamentais significativos?

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    5. Pedro Ramalho Carlos2 de abril de 2014 às 22:07

      Luís A-C, estando completamente de acordo, não só com o post como com o comentário, só tenho um comentário à sua última questão, pois parece-me relevante:

      "A não ser que seja necessário abater dividas públicas muito elevados, por que raio haveriam os governos de manter excedentes orçamentais significativos?"
      A resposta é diferente consoante se é ou não verdadeiramente Keynesiano . Se sim, a resposta é:
      "Para gerar a folga de capital público que permitará ao Estado ser mais "gastador" nas zonas recessivas dos ciclos económicos". (algo que o pseudo-keynesianos que ululam pela nossa praça tendem a esquecer).

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  2. Caro Lavoura, creio, também, que a reestruturação, unilateral, da dívida só não seria catastrófica se houvéssemos excedentes orçamentais e comerciais, suficientes, para financiar o crescimento da economia e do emprego, que tornassem desnecessário o recurso ao crédito no exterior!! Isto, tomando por medida a tragédia do presente!!

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  3. Parabéns, Luís Aguiar-Conraria, por este debate muito bem estruturado e esclarecedor.

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  4. Parabéns, Luís Aguiar-Conraria, por este debate muito bem estruturado e esclarecedor.

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