segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Um mal bastante disseminado e democratizado

“Madoff: Teia de mentiras” (The wizard of lies) é o melhor filme que se fez até ao momento sobre a tragédia Madoff. Barry Levinson é um realizador competente, um bom artesão. Robert De Niro e Michel Pfeiffer cumprem bem o seu papel de casal Madoff. Em Dezembro de 2008, Madoff revelou à família a enorme fraude que andara a urdir durante mais de 16 anos. Foram os filhos que o entregaram à justiça, apesar de Madoff declarar várias vezes que se entregaria de qualquer maneira. Antes de mais, o filme centra-se na tragédia familiar. Os dois filhos morreram, entretanto. O mais velho suicidou-se com 46 anos em 2010. O mais novo morreu em 2014 de cancro, com 48. Madoff, agora com 79, espera pela morte na prisão. A mulher, Ruth, deixou de lhe falar e foi abandonada e ostracizada por todos, excepto por uma irmã, ela própria vítima das vigarices do cunhado. O filme aborda, de raspão, a incompetência dos reguladores, os quais não cruzam informação entre si, e são ingénuos ao ponto de acreditarem na palavra de um vigarista - onde é que já vimos este filme?
Madoff deixa no ar a pergunta se é ou não um sociopata. Claro que é, como o são muitos desses gurus empresariais e da alta finança. Gente especialista em contornar regras, atreitos a correr grandes riscos e sem um pingo de remorsos nas veias. A diferença de Madoff é que confessou e, por isso, está preso – a justiça americana também não é bem essa maravilha que às vezes se diz. Os outros sociopatas, os que puseram a economia mundial à beira do precipício, foram os primeiros a erguer-se e, muitas vezes, a aproveitar-se dos destroços que eles próprios provocaram.
Madoff diz várias vezes que o problema é a ganância das pessoas. Ele próprio recomendava aos seus clientes que não investissem mais de metade do seu dinheiro nos seus fundos. Mas os clientes não resistiam. Queriam mais e mais, e depois muitos ficaram a arder, sem nada. Isto não iliba nem desculpa Madoff, claro. Mas é um problema que muitas vezes nos esquecemos ou preferimos ignorar. Preferimos atribuir a culpa toda aos Madoffes deste mundo – ele bem se queixa, com alguma razão, que foi transformado no bode expiatório de todo o sistema. Estes vigaristas aproveitam-se das fraquezas humanas, e uma delas é a ganância, um mal bastante disseminado e democratizado. Infelizmente.


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