terça-feira, 11 de agosto de 2015

Sr. Director do Diário de Notícias: este leite está azedo

Nos últimos anos, têm-se sucedido os casos de corrupção envolvendo quadros de topo da administração pública. Muitos factores contribuirão para este importante progresso em termos da eficácia da justiça no combate à corrupção e certamente alguém, um dia, escreverá a sua história, uma história em que os media terão também o seu lugar.

Um dos casos de corrupção envolvendo um quadro de topo da administração pública é o do ex-director geral do Ministério da Administração Interna (MAI), o arquitecto João Correia, acusado de mais de 80 crimes, num processo com mais de uma dezena de arguidos (incluindo outros elementos da ex- Direcção Geral de Infraestruturas e Equipamentos do MAI, empresários e arquitectos). As denúncias de suspeitas de prática de actos ilícitos, que chegaram ao meu gabinete relativas àquele processo, foram imediatamente transmitidas às entidades competentes, estando na base da investigação que culminou na referida acusação.


Seria de facto muito estranho que um Secretário de Estado, com a responsabilidade das infraestruturas e equipamentos do Ministério, nas suas reuniões com o Diretor Geral das Infraestruturas e Equipamentos, não discutisse obras - o MAI tem mais de 1000 instalações operacionais. Tal absurdo poderia ser notícia. 

Como é óbvio, e ao contrário do que insinua o jornalista, eu não menti ao Ministério Público. No depoimento ao Ministério Público, em parte alguma, declaro que o referido director geral não me informava sobre obras. O que refiro no meu depoimento é que o ex-diretor geral, acusado, repito, de mais de 80 crimes, não me informou sobre algumas obras e sobre actividades inerentes às suas competências (ou outras como as que estão na origem da acusação do Ministério Público).

A acusação que o jornalista Carlos Rodrigues Lima me dirige, pondo em causa o meu bom nome, assenta em duas graves incorrecções. Primeira, toda a estória desta notícia se baseia na descontextualização de uma citação do meu depoimento, que se referia a obras específicas anteriores à minha tomada de posse e não, como o jornalista escreve, a todas as obras. Segunda, naquela citação, o jornalista alterou um determinante que altera o sentido do meu depoimento: onde o jornalista escreveu “Apesar de ter garantido ao Ministério Público que o seu director-geral "não fornecia à Secretaria de Estado quaisquer informações sobre o estado dos processos."” deveria ter escrito “sobre o estado desses processos”.

O défice nas competências de leitura e escrita deste jornalista pôs em causa o meu bom nome e reputação. 
No desempenho das minhas funções, fiz o melhor que soube e humildemente aceito eventuais críticas. O que jamais aceitarei é que ponham em causa a minha dignidade pessoal e profissional.
Informei a direcção do Diário de Notícias desta situação no dia 8 de Agosto e continuo à espera da sua resposta.

Os media são um pilar da democracia, garantindo o pluralismo de visões e contribuindo para uma discussão crítica dos problemas – uma condição necessária para o aperfeiçoamento das sociedades. A qualidade das instituições – e, portanto, da democracia e da economia – depende em grande medida do nível de exigência das sociedades. Neste processo, os media são essenciais. Por um lado, dando voz àqueles que criticam o disfuncionamento das instituições e, por outro lado, trazendo à luz situações que põem em causa o interesse público. Mas somos todos parte desse processo – como escreveu Mário de Cesariny:

Que afinal o que importa é não ter medo 
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente: 
Gerente! Este leite está azedo! 

2 comentários:

  1. Apetecia-me escrever "sem comentários", mas o Fernando merece mais.
    Esta forma de fazer jornalismo parece, também, uma forma subtil de corrupção. Que assusta boa gente. Não foi o caso.

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