Em inquéritos realizados
durante um período de 10 meses anteriores às eleições federais alemãs de
setembro de 1965, duas questões apresentaram resultados de tal forma
inesperados que dava a impressão que os inquiridos pertenciam a dois mundos
diferentes e afastados.
Uma das questões dizia
respeito às intenções de voto: entre dezembro de 1964 e agosto de 1965, os dois
partidos (SPD e CDU) foram alternando na liderança das intenções de votos. A
outra questão era: “Quem acha que vai ganhar as eleições?”
Até poucas semanas antes
das eleições de setembro de 1965, as intenções de voto mantiveram-se estáveis.
Em dezembro de 1964, tanto as expectativas sobre quem iria ganhar como as
intenções de voto em cada partido rondavam os 50%.
Nove meses mais tarde,
em Agosto de 1965, as expectativas de que os democratas-cristãos iriam ganhar
as eleições subiram para mais de 50%, enquanto as expectativas de vitória dos
social-democratas haviam caído para 16%. Foi a partir desta altura que as
intenções de voto nos democratas-cristãos começaram a destacar-se, acabando
estes por ganhar as eleições com uma vantagem de 8,6 pontos.
Estes dados provocaram
um clique em Noelle-Neumann. Passaram, entretanto, seis anos até que fosse
elaborada uma hipótese sobre o comportamento aparentemente dissonante das
respostas àquelas duas questões, uma hipótese que combinasse a mudança, in extremis, nas intenções de voto a
favor da CDU com a crescente expectativa sobre quem ganharia as eleições.
Noelle-Neuman designaria essa hipótese de “espiral do silêncio”.
O ponto de partida de
Noelle-Neumann era de que deveria haver uma disposição diferente nos dois
campos políticos para expressar publicamente as suas convicções e opiniões. Se
essa diferença na visibilidade pública existia de facto, então isto teria
consequências nas estimativas dos eleitores sobre a força de cada campo e, por
consequência, nas estimativas sobre as suas possibilidades de vitória. Um campo
tornar-se-ia, assim, subestimado e o outro sobrestimado.
Os apoiantes do campo
sobrestimado sentir-se-iam encorajados a expor publicamente as suas posições,
enquanto os apoiantes do campo subestimado tenderiam a cair no silêncio. Apesar
das intenções de voto serem das atitudes mais estáveis, quando um lado assume
uma posição pública por um longo período de tempo e o outro, ao contrário, se
remete ao silêncio, então esta tendência terá consequências nos eleitores
indecisos, que tenderão a colocar-se no lado que lhes parece mais popular e
vitorioso.
A ameaça de isolamento social, o medo
desse isolamento (provavelmente genético, de acordo com a autora), a permanente
observação do “clima de opinião” e da força ou debilidade dos diferentes pontos
de vista determinam se as pessoas expressam as suas opiniões ou se se remetem
ao silêncio. Partindo destas variáveis ou pressupostos, Noelle-Neuman formula
um conceito de opinião pública, baseado na espiral do silêncio. Numa palavra, a
opinião pública é aquela que se pode exprimir publicamente sem correr o risco
de ficar socialmente isolado.
Na superfície de todo o processo da
opinião pública, estará o medo de isolamento e a exploração desse medo por parte
daqueles que querem impor a sua vontade à sociedade, seja para preservar uma
opinião estabelecida, seja para introduzir uma nova regra.
Que consequências práticas pode um
indivíduo retirar daqui para o seu comportamento numa democracia?
Primeira, se a opinião pública funciona
nestes termos, então a oportunidade para a mudar ou moldar está
reservada àqueles que não têm medo de ficar isolados. Dizendo e fazendo o que é
impopular, chocando - como uma avant-garde
ou um hard core - podem tornar as
suas ideias proeminentes.
Segunda, se alguém tem uma convicção forte,
deve exprimi-la publicamente. Ao contrário, se, devido ao medo do isolamento, cai
no silêncio, contribui para o declínio das suas próprias convicções.
Todavia, de acordo com Noelle-Neumann, não é fácil contrariar este mecanismo. Porque nas palavras de
James Madison, um dos pais da constituição americana: "Man is timid and
cautious..."
Caro JCA,
ResponderEliminarTem algo semelhante (pelo menos assim penso) com o CDS em Portugal, com uma sobrevalorização em sondagens e que, ao contrário do que tem vindo a público, provavelmente tem menos a ver com falhas metodológicas e mais a ver com inibição por parte de votantes - e seria interessante saber quais - em se assumirem como tal.
Caro Carlos Duarte,
ResponderEliminarPenso que sim. Há uma ideia parecida, e a Noelle-Neumann reconhece isso, que é a "maioria silenciosa", um slogan introduzido por Spiro Agnew,vice-presidente de Nixon entre 1969-1973. Os media jogam aqui um papel essencial, porque são o principal barómetro usado pelas pessoas para aferir as tendências em cada momento. Noelle-Neumann achava que as pessoas tinham um órgão (isso não está provado cientificamente) que lhes permitia perceber para onde é que o vento está a soprar. Muitas vezes os media não reflectem os sentimentos reais da população, e ao darem voz a certos protagonistas podem induzir as pessoas em erro fazendo-as crer estar perante uma opinião dominante, quando esta é marginal. As maiorias silenciosas só são despertadas quando aparece alguém a materializar em palavras os seus sentimentos muitas vezes vagos e difusos. Alguém que dê coragem a essas pessoas a exprimir-se e a descobrir, muitas vezes para sua grande surpresa, que afinal não estão sozinhas e até são a maioria.
O Boletim da Primavera da Sociedade Portuguesa de Estatística tem um estudo razoavelmente aprofundado sobre a performance das sondagens em Portugal, que ajuda a explicar alguns fenómenos como o da subestimação do CDS/PP em algumas eleições. http://www.spestatistica.pt/attachments/article/101/Boletim%20de%20Primavera%20%282011%29.pdf (ver a partir da página 37).
EliminarObrigado pela sugestão, vou ler de certeza.
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