terça-feira, 20 de maio de 2014

Sexo e mentiras por amor

Robert Solow, economista laureado com o Nobel, disse um dia a respeito de Milton Friedman, também galardoado: “A pretexto de nada, Milton lembra-se da oferta de moeda. Já eu vejo sexo em todo o lado, mas afasto-o dos meus artigos.” Atitude sensata a de Solow, mas que não fez escola. Há cada vez mais economistas académicos que se dedicam ao sexo.
Exemplos? David Blanchflower e Andrew Oswald publicaram um trabalho com o sugestivo título “Money, Sex and Happiness: An Empirical Study”. Dinheiro, sexo e felicidade. As obsessões de Friedman e de Solow num só artigo. Qual a mais importante para a nossa felicidade? Sexo ou dinheiro?
O estudo baseia-se em inquéritos feitos a cerca de 16000 pessoas. Aos inquiridos perguntou-se se eram ou não felizes, nível de actividade sexual, número de parceiros, habilitações, profissão, rendimento e por aí fora. Eu próprio, enquanto estudava nos Estados Unidos, respondi a um destes inquéritos.
Conclusões? Dinheiro é bom. Sexo é melhor. Muito sexo, de preferência. Tanto para homens como para mulheres. Os que apenas o cultivam ocasionalmente são tão infelizes como os celibatários. Mas os resultados não vão contra a doutrina católica. Se bem que quanto mais melhor, os monogâmicos são mais felizes. Os que reconhecem ter sido infiéis, ou ter-se socorrido da prostituição, são bastante mais infelizes. Finalmente, uma conclusão mais esquerdista: os ricos, apesar de terem mais parceiros sexuais, não copulam mais vezes. Fica por perceber se as pessoas são mais felizes porque fazem muito sexo ou se, pelo contrário, praticam muito sexo porque estão mais animadas.
Podia citar mais artigos. Para evitar que pensem que me dedico unicamente a este ramo da Ciência Económica, refiro apenas mais um. Num dos capítulos da sua tese de doutoramento, Hugo Mialon serviu-se de um inquérito de 2000 (o Orgasm Survey) para testar o que leva os agentes económicos a fingir o êxtase. De acordo com esse inquérito, 72% das mulheres e 26% dos homens simulam orgasmos.
Hugo recorre a um modelo de sinalização de Michael Spence (também galardoado com o prémio Nobel). O modelo de Spence detalha que estratégia pode um bom trabalhador seguir para sinalizar a sua capacidade a um potencial empregador. Por exemplo, para mostrar a sua inteligência e capacidade de trabalho, uma pessoa pode licenciar-se numa universidade séria. Dá um sinal ao mercado de trabalho distinguindo-se de um espertalhaço que recorre a uma universidade de vão de escada. O modelo de Spence é útil para estudar quase todos os mercados onde há informação assimétrica. Como durante a cópula é impossível saber se o outro está a fingir ou não, é possível recorrer ao modelo de Spence.
Entre os resultados a que Hugo chegou, há um com uma explicação biológica. Como as mulheres têm uma maior resposta sexual nos seus 30 anos e os homens atingem o seu pico aos 20, há menos necessidade de fingir o êxtase nestas idades. O autor chegou a mais conclusões. Uma mulher que ama preocupa-se com os sentimentos do seu parceiro. Finge os orgasmos (múltiplos ou não) para que o seu homem pense que é uma máquina. Mulheres possessivas recorrem ao mesmo truque. Já os homens, mesmo quando apaixonados, não fingem. Possivelmente são mais honestos (ou menos altruístas).

Leio este estudo e assusto-me. A ideia de um falso orgasmo altruísta é uma faca de dois gumes. Se por um lado dá autoconfiança a cada um, por outro abundam por aí os que erradamente se julgam campeões. Não têm incentivos para se esforçarem. Qual dos efeitos prevalece? Uma boa pergunta para um outro estudo.
PS Publiquei este texto no Suplemento de Economia do Público em Abril de 2007. Lembrei-me dele por causa desta entrada de João Miguel Tavares.

1 comentário:

  1. A simulação compassiva do êxtase!! A excessiva compaixão e a compungência!! Dever e condescendência!! Milhares de anos de história e muitos mais de escritos à volta disto!!

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