terça-feira, 2 de junho de 2015

A Grécia, nós e o euro

Em novembro de 2012 – na fase mais difícil do processo de ajustamento da economia portuguesa – eu e Pedro Bação criámos o sítio “Are we going Greek?”, motivados pelas questões que nessa altura se colocavam à economia portuguesa e ao euro: a austeridade imposta à economia portuguesa não levaria a que esta seguisse o caminho da economia grega? Por outro lado, se a economia portuguesa, bem como a irlandesa e a espanhola, seguissem o caminho da grega o euro sobreviveria? 
Apesar da crise de cada um daqueles países ter a sua própria história, todos eles partilharam, com desfasamentos temporais e diferenças de magnitude, desequilíbrios que vieram a resultar na crise da zona do euro, em particular os elevados níveis de endividamento público e/ou privado e os desequilíbrios externos. Os gráficos que apresentamos mostram a similitude existente entre as economias que foram alvo de intervenção da troica.      
Dois anos depois, actualizámos os dados macroeconómicos que sintetizam o desempenho daquelas quatro economias. Desde abril de 2013, a economia grega afastou-se marcadamente do trajecto das economias espanhola, irlandesa e portuguesa, tendo estes três países iniciado trajectórias de recuperação, ainda frágeis. A Irlanda e Portugal concluíram os programas de assistência económica e financeira dentro do prazo previsto – a Grécia, se tudo correr bem, negociará em breve o terceiro PAEF.
A queda do PIB e o aumento do desemprego na Grécia são uma verdadeira tragédia, similar à ocorrida na Grande Depressão dos anos trinta nos Estados Unidos: entre 2007 e 2013, a Grécia perdeu cerca de 24% do PIB – nos outros 3 países este valor variou entre 5,8% e 7,5% (6,7% em Portugal) – e, no mesmo período, o desemprego aumentou de cerca de 8% para 28%. Em Portugal e na Irlanda, e apesar de estas economias partirem de valores mais baixos de desemprego, a redução desde 2013 tem sido acentuada.
Todos os países beneficiaram da descida das taxas de juro decorrente da mudança de política do BCE em julho de 2012. No entanto, os mercados continuam a exigir à Grécia um prémio de risco substancialmente mais elevado que aos outros países.
Os elevados défices orçamentais na sequência da crise financeira internacional têm vindo a ser corrigidos por todos os países, mas continuam a ser muito elevados, tendo a despesa com juros um peso muito significativo. A dívida pública e a dívida privada continuam em níveis muito elevados. Apenas a Irlanda conseguiu iniciar uma trajectória descendente para a dívida pública. No caso da dívida privada, com a excepção da Grécia, todos os países estão já numa trajectória descendente.
O endividamento externo continua muito elevado, mas todos os países corrigiram os elevados défices externos que tinham registado no período anterior à crise financeira internacional.
Apesar da evolução registada, as questões que se colocavam há dois anos atrás continuam sem resposta: a Grécia continuará no euro? Se a Grécia sair do euro quais serão os efeitos na economia portuguesa? Resistirá o euro à saída da Grécia?
Tendo em conta os elevados custos desta incerteza, os economistas antecipariam um acordo entre a Grécia e os seus credores. No entanto, na história europeia abundam os exemplos de irracionalidade e das suas catastróficas consequências.

4 comentários:

  1. A última frase do post é muito importante. De facto, a irracionalidade é uma constante, sobretudo quando se está a lidar com pessoas que querem rebentar com o sistema. Por exemplo, um dos erros dos líderes políticos que lidaram com Hitler foi pensar que ele nunca se atreveria a fazer o que fez porque os riscos e os custos seriam demasiados elevados. Geralmente, as pessoas que estão dentro do sistema há algum tempo são mais avessos a aventuras porque é o próprio lugar delas que pode estar em causa. O caso muda de figura quando os líderes detestam o sistema e querem acabar com ele. Era o caso de Hitler, é muito provavelmente o caso de muitos dos dirigentes do Syrisa.

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  2. Talvez seja um bocadinho excessivo comparar o Syriza e o Tsipras ao partido nacional socialista e a Hitler.
    Talvez sejam mais comparáveis ao partido socialista e a António Costa, como no outro dia veiculava um pasquim britânico...

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  3. Post muito equilibrado em que, contrariamente àquilo que é costume, não se atira pedras nem se lança anátemas sobre a Grécia. Parabéns ao Fernando Alexandre.

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