quarta-feira, 22 de julho de 2015

Uma ideia que não brilha

Hoje, a União Europeia provoca pouco ou nenhum entusiasmo à maioria dos europeus. Ao invés, espalhou-se uma sensação de inquietação, mal-estar, desilusão; as resistências são consideráveis e justificadas. As causas deste sentimento são muito diversas. A primeira, e talvez a mais grave, é a ignorância mútua dos povos europeus e a sua falta de simpatia recíproca e admiração. Isto, misturado com uma preocupante ignorância histórica, impede uma imaginação colectiva, uma “ideia de Europa”, uma projecção do futuro, capazes de mobilizar os europeus numa empresa comum.
A redução de tudo à economia também não ajuda nada. Os funcionários e burocratas que têm nas suas mãos a "Europa" e os políticos limitam-se a segregar regulações, normas, proibições. Enquanto teoricamente defendem a liberdade e a livre iniciativa, na prática condenam a espontaneidade, a imaginação, a variedade que sempre foram a riqueza da Europa.
Pela calada, e bem nas costas dos cidadãos europeus, os iluminados que nos têm pastoreado deram passos atrás de passos sempre com o argumento da inevitabilidade: completada a União Aduaneira (em 1967), era fundamental um mercado único (concretizado em 1993) e este não poderia sobreviver sem uma moeda única. Pelo menos, este é o discurso dos “sábios”, que também se estão, e sempre estiveram, nas tintas para a opinião do canalizador polaco, do operário alemão ou do pescador português.
Infelizmente, não basta que uma “ideia de Europa” brilhe na cabecinha de alguns iluminados, é necessário que brilhe em milhões de cabeças. Só assim o projecto europeu poderia aguentar todos os embates. Hoje, a “Europa” está mergulhada numa crise e desfaz-se em disputas, conflitos, questões mesquinhas. Desgraçadamente, no reino da economia, onde a “Europa” se acantonou, não é possível acender o entusiasmo num número suficiente de almas dispostas a lutar por uma “ideia”.

2 comentários:

  1. O que eu acho interessante é que a UE surgiu, inicialmente, como uma forma de "controlar" a Alemanha e agora... ;)

    A melhor definição da origem e motivos da UE tem uns anos mas continua (relativamente) actual:

    https://www.youtube.com/watch?v=qVrN-gkzVYI

    ResponderEliminar
  2. Há uma sentença ditada pela filosofia popular que garante que as boas contas fazem os bons amigos.
    A União Europeia corre o risco de desmantelamento, com todas as consequências que as contas por pagar implicam, porque os banqueiros, fiados que podem sempre contar com os contribuintes quando os seus devedores não aguentam com a carga e dão de lado, importaram volumes de crédito que eles sabiam muito bem serem excessivos, para gananciosamente arrecadarem comissões que os tornaram soberanos e inimputáveis.

    É esta inimputabilidade que gera um equívoco que lança os do norte contra os do sul: contrariamente à mensagem que corre os contribuintes finlandeses (p.e.) não emprestaram aos gregos (p.e.). Quem emprestou foram os banqueiros alemães, holandeses, franceses, e, possívelmente, também algum ou alguns finlandeses. Depois os gregos foram intimados a pagar o que deviam, a regurgitar o que tinham engolido, da noite para o dia. Não podiam. E para resgate daqueles que engendraram o risco sistémico o governo finlandês e os outros meteram no cepo a cabeça dos contribuintes.

    Fossem outras as regras, fossem os banqueiros, os accionistas e os clientes dos bancos que foram para além de onde deveriam ir, obrigados, sem a intervenção dos políticos, a negociar os seus créditos bilateralmente com os seus devedores, as relações entre os estados membros da UE não teriam caído na armadilha externa, uma armadilha que os banqueiros colocam desde há muito tempo em muitos outros locais do mundo.

    Nem a Grécia (p.e) seria sujeita a obdecer a um diktat que, inevitavelmente, só pode criar animosidades insaráveis durante muitos anos.



    Enquanto existir a rede (moral hazard) que apara os banqueiros em caso de queda dos trapézios em que exibem as suas habilidades, continuarão a acontecer crises e culpados que não serão culpabilizados. Neste caso, da crise profunda que abala a UE, as consequências são dramáticas porque lançam sementes de guerra entre povos que se queriam unir para evitar a guerra.

    ResponderEliminar

Não são permitidos comentários anónimos.