Posto isto, não faz sentido falar na credibilidade de Tsipras porque quem não tem dinheiro, nem opções, faz o que lhe deixam, não faz o que quer. Pode tentar fazer outra coisa, pode dizer que vai tentar fazer outra coisa, mas quem sabe avaliar a distribuição de poder na relação, pode muito bem ver quando há bluff e quando não há. Vale a pena, no entanto, pensar na credibilidade de quem tem mais poder porque esses têm poder de negociação e margem de manobra. E quando se tem poder, não faz sentido fazer bluff, especialmente se não há a intenção de seguir em frente com a ameaça porque, se o bluff for chamado e não se fizer o que se disse, a credibilidade vai ao ar. É o caso de Angela Merkel.
Primeiro, a Sra. Merkel dizia que a UE não estava a atravessar crise nenhuma, depois que a crise estava contida e não havia possibilidade de contágio dos problemas da Grécia, depois o problema da Grécia estava resolvido e nem se punha a questão do país sair do euro, depois se os gregos votassem "Não" ao referendo, era provável que saíssem do euro. Ou seja, em que ficamos, Sra. Merkel?
Já defendi aqui que a Grécia não sai do euro por pressão dos EUA. Enquanto Schäuble não quer saber da posição dos EUA na equação, Merkel, apesar de mandar bocas aos americanos, é fiel aos EUA. Henry Kissinger uma vez perguntou "Who do I call if I want to call Europe?" Vladimir Putin também foi confrontado com essa questão quando um avião cheio de europeus foi abatido sobre a Ucrânia. A resposta de Putin: "Barack Obama". É um bocado diferente da forma como José Manuel Barroso tinha interpretado a questão de Kissinger.
Ontem foi um dia histórico para Barack Obama, pois foi anunciado o acordo dos EUA com o Irão. A notícia foi tão inesperada e importante que o drama da Grécia foi relegado para segundo plano. Agora pensem bem nisto: na segunda-feira é anunciado um acordo com a Grécia; na terça-feira é anunciado um acordo entre os EUA e o Irão; na quarta-feira o FMI diz que não quer participar no acordo da Grécia, sem que haja cortes significativos na dívida (esta postura do FMI é interessante porque claramente indica que o FMI não confia na Alemanha).
Estou mesmo a imaginar a conversa entre Obama e Merkel:
Obama: "Querida Angela, se os EUA podem chegar a um acordo de compromisso com o Irão, explica-me porque é que a UE não pode chegar a um acordo de compromisso com a Grécia que seja favorável a ambas as partes?"
Angela: "Não subsidiamos vagabundos."
Obama: "Então explica-me porque é que os cidadãos americanos, que têm seguros de desemprego miseráveis e têm o sistema de saúde mais caro do mundo civilizado e com piores resultados, têm de pagar para proteger a UE militarmente? Não foste tu que sugeriste que os EUA deviam gastar menos em despesas militares e mais no bem-estar dos seus cidadãos? A propósito, não é a Alemanha que tem as forças militares em ruínas? Ouvi dizer que os soldados alemães têm de fazer de conta que cabos de vassoras são metralhadoras durante os exercícios da OTAN. Ainda não gastaste um euro sequer com a crise da Grécia no orçamento alemão, apenas te comprometeste no papel. E já agora, não é a Alemanha o país que mais beneficiou com o euro, ou seja, não tiveram vocês um "free lunch"? "
Angela: "Hmmm?!?"
Pois, eu também não sei a resposta. O que eu sei é que o mandato de Angela Merkel chega ao fim em 2017 e, daqui a cinco meses, celebra-se o seu décimo aniversário no poder. Se a Grécia sai próximo do seu mandato, há bronca na UE, e o projecto europeu se desintegra, toda a sua administração será eclipsada pelo desastre.
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