terça-feira, 15 de março de 2016

Planetas

Quando andava a tirar o mestrado e doutoramento, fiz parte da Society of Environmental Scientists da minha universidade americana, que era um grupo de alunos de pós-graduação que estudavam diferentes aspectos de questões ambientais. Na altura, entre os alunos, eu era a única economista, e os outros eram de Environmental Science e de Political Science. Por eu ser de economia, de vez em quando recebia uns olhares estranhos dos cientistas puros, para quem o dinheiro é uma coisa porca e pensar nele é moralmente repugnante.

O meu orientador era um dos mentores do grupo e havia outra professora, a Dra. Sarah Kimball, de Environmental Science, que também era nossa mentora. Frequentemente, ela falava-nos da perspectiva macro dos recursos mundiais: o número de planetas que era necessário para suportar o nível de vida médio. O PIB mundial anual são $70 triliões curtos (PPS); a população mundial são 7 biliões curtos. Se os recursos fossem equitativamente distribuídos, cada pessoa no mundo receberia $10 mil dólares por ano (PPS). O PIB per capita de Portugal, em 2014, foi de $21.436 (PPS), ou seja, se toda a gente no mundo tivesse este montante, seriam precisos mais de dois planetas Terra para produzir os recursos suficientes para toda a gente.

Durante as eleições presidenciais portuguesas, gostei muito de calcular o número de planetas Terra que seriam necessários para dar o rendimento dos candidatos a toda a gente -- mas note-se que isto não é muito científico, pois cada pessoa recebe valor do estado e paga impostos ao estado; é apenas um exercício mental engraçado, que serve de referência para o impacto que temos nos recursos mundiais. Por exemplo, a Marisa Matias, ganha cerca de €200.000/ano como deputada do Parlamento Europeu, logo seriam necessários mais de 22 planetas (dividam o rendimento dela por €9000). Nada mau para alguém de Esquerda. Em 2014, Marcelo Rebelo de Sousa ganhou €385.000, logo dá mais de 42 planetas; como Presidente da República iremos economizar bastantes planetas.

Não estou a advogar que se corte no rendimento dos políticos; o ideal seria pagar-lhes bem para atrair pessoas qualificadas e competentes. Basta olhar para o Parlamento português, para ver que há ali grandes deficiências técnicas e intelectuais. Produzem más leis, muitas vezes em benefício próprio, e nem sequer sabem discutir assuntos em condições. Idem para os nossos governantes. Essa é uma das razões pela qual tanta gente em Portugal ganha apenas o salário mínimo e muitos estão desempregados. O ideal seria que o país crescesse produzindo mais riqueza, o que também aumentaria o PIB mundial, em vez de a economia estar estagnada e de se recorrer a dívida para financiar medidas redistributivas para atenuar o problema dos baixos rendimentos de tantos portugueses. Dívida financiada pelo FMI desvia recursos das pessoas no mundo que ganham rendimentos que necessitam menos de um planeta.

3 comentários:

  1. «Basta olhar para o Parlamento português, para ver que há ali grandes deficiências técnicas e intelectuais. »

    Sim, e isso nota-se na aberração de entregar a elaboração de leis a escritórios de advogados. A função primordial de um parlamento (além de aprovar o orçamento, claro) é elaborar leis. Os eleitores elegem (passe a redundância) os deputados para que eles produzam leis (ou não as produzam, o que, em muitos casos, é preferível). Portanto, se os senhores deputados depois entregam esse poder soberano de legislar a terceiros contratados para o efeito, estão a violar o seus deveres e a soberania popular.

    «O ideal seria que o país crescesse produzindo mais riqueza».

    Claro, mas façamos "rewind" para as últimas legislativas: em Portugal raramente se debate como produzir mais riqueza. O debate centra-se, a maior parte do tempo, em como dividir a parca riqueza criada. Mais: a maior parte das políticas governamentais tende a ter um efeito pernicioso na criação de riqueza.

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    1. Poucas vezes acontece que alguém refira este problema do legislador com tanta clareza.

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    2. O Alexandre é espectacular! As nossas conversas são sempre muito giras...

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