quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Prova Oral

O nosso Excelentíssimo Ministro das Finanças foi hoje ao parlamento explicar o programa do novo governo. Aqui fica o play-by-play do evento.

De notar o duelo Morgado -- Centeno, que até teve direito a citações de Marx -- do Groucho, não do Karl:

20:16
Mário Centeno: "A honestidade deste Governo e a minha própria vão-se julgar na transparência com que esta governação irá decorrer"

20:14
Mário Centeno para Miguel Morgado: "Eu podia falar de liberalismo a colegas seus de bancadas que tiveram verdadeiras epifanias sobre liberalismo nos últimos anos"

20:11
Miguel Morgado: "Catarina Martins prefere também um ministro das Finanças na versão marxista... na versão Groucho, porque foi Groucho Marx que disse: 'eu tenho estes princípios. Se não gostam, bem, eu tenho outros'"

20:10
Miguel Morgado invoca livro de Mário Centeno para falar do aumento do salário mínimo

20:08
Miguel Morgado para Mário Centeno: "Foram buscá-lo a si para dar um rosto a este processo político. Porque reviram em si um homem moderado. (...) Mas é preciso que as aparências se mantenham"

20:08
Miguel Morgado: "Não recebemos lições de ninguém sobre o aumento do salário mínimo"

20:05
Miguel Morgado (PSD) para Mário Centeno: "Não vamos começar bem, porque o senhor ministro não começou nada bem"

Fonte: TVI

Trees

Ram Dass on self judgment:

I think that part of it is observing oneself more impersonally. I often use this image, which I think I have used already, but let me say it again. That when you go out into the woods and you look at trees, you see all these different trees. And some of them are bent, and some of them are straight, and some of them are evergreens, and some of them are whatever. And you look at the tree and you allow it. You appreciate it. You see why it is the way it is. You sort of understand that it didn’t get enough light, and so it turned that way. And you don’t get all emotional about it. You just allow it. You appreciate the tree.

The minute you get near humans, you lose all that. And you are constantly saying “You’re too this, or I’m too this.” That judging mind comes in. And so I practice turning people into trees. Which means appreciating them just the way they are.

?!?!?!?!?!

No livro "International Social Work Policy and Practice: Practical Insights and Perspectives" editado por Carolyn Tice e Dennis Long, no capítulo dedicado a Portugal, da autoria de Carolyn Tice, aparece a esta passagem:

Isto é, evidentemente, falso. Não tenho (felizmente) nenhum filho com problemas neurológicos e a minha única relação com a Quinta da Conraria é o bisavô da minha mulher, que lá trabalhou, e decidiu dar esse apelido a alguns dos seus filhos. A minha mulher herdou o apelido, que, quando me casei, adoptei. Já fui muitas vezes mal citado. Mas este caso ultrapassa todos.

PS Toda a minha simpatia para a pessoa que faz todo este trabalho e a quem trocaram o nome.

Definições e contradições

Se há coisa que me diverte é ouvir os políticos falar em investimento público, que é justificado usando "teorias económicas": o investimento público faz sentido porque há coisas que são bens públicos, há efeitos multiplicadores da infraestrutura, etc. A definição de bem público é, neste contexto, uma questão premente.

Os bens classificam-se usando dois critérios: rivalidade no consumo e acessibilidade ao bem. Gosto especialmente do exemplo que Greg Mankiw dá no seu livro de Introdução à Economia, o caso de uma estrada. Será uma estrada sempre um bem público? Não, diz Mankiw, uma estrada pode ser tudo: bem público, bem privado, monopólio natural, ou recurso comum. Tudo depende das duas coisas: acesso à estrada e rivalidade no seu uso.

Estradas com portagens (toll roads) e que estão vazias (uncongested) são consideradas monopólios naturais. As que são bens públicos são as estradas sem portagens e não-congestionadas.

(boas) escolhas

era uma vez uma galinha poedeira
que desatou a pôr ovos à porta
de novos, velhos, feios e bonitos
e de cada vez que as pessoas saíam
esborrachavam os ovos
uma galinha mais velha asseverou
que a dita outra estaria doida
e promoveu o seu internamento compulsivo
a galinha dadora defendeu-se com
o excesso de produção e com
a necessidade de aumentar os preços
dos ditos mercados
no fim da audiência
esperava-a o convite para banqueira
e para ministra das finanças
escolheu ir para um banco
a pensar na reforma dourada
afinal a galinha dos ovos de ouro
não era ela
era só uma prima afastada empertigada
e que não se dava com ninguém
boa escolha, asseverou de novo
a galinha velha e de carne rija

Hoje no Observador

No último Governo Sombra, Ricardo Araújo Pereira chamou a atenção para um trabalho recentemente publicado por um conjunto de 16 destacados economistas (...). Estes economistas propõem uma “narrativa consensual” da crise da área do Euro e argumentam convincentemente que enquanto não se fizer um diagnóstico correcto não se resolve problema algum.
Qual é então o diagnóstico correcto? Segundo Ricardo Araújo Pereira, o estudo diz que a crise do Euro não é uma crise das dívidas soberanas. Na mesma linha vai um artigo publicado no Expresso do fim-de-semana passado assinado por João Silvestre e Jorge Nascimento Rodrigues. (...)
Porque em Portugal é muito comum confundir o que economistas estrangeiros dizem sobre a Europa com o que dizem sobre Portugal, de repente, daqui a uns dias teremos toda a gente a dizer que não havia problema nenhum com a nossa dívida pública e que somos apenas vítimas de um infortúnio. Por isso é importante deixar bem claro que, no que respeita a Portugal, o estudo não conclui nada disto.

Wilde nights are calling...

Hoje não comi chocolates de Halloween e até fui ao ginásio depois do trabalho. Para sobreviver, comecei a ouvir "O Retrato de Dorian Gray" do Oscar Wilde, em audio-livro, apesar de eu já o ter lido e também já ouvi partes. É tão bom que, voltar a ouvi-lo ou lê-lo, leva sempre o nosso pensamento por caminhos não explorados antes. Tem também umas citações, que me fizeram pensar em Mark Rothko.

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Aqueles anúncios irritantes do Facebook...

Valem a pena! O dinheiro vai ser usado para filantropia...

Priscilla and I are so happy to welcome our daughter Max into this world!For her birth, we wrote a letter to her about...

Posted by Mark Zuckerberg on Tuesday, December 1, 2015

Educação familiar

No programa da Diane Rehm de hoje discutiu-se o tópico de crianças que, por uma razão ou outra, ficam ao cuidado dos avós. Ao ouvir o diálogo nota-se que, para estas crianças, quase todas elas de estratos sociais mais baixos, é importante a disciplina e a estrutura que os avós conseguem dar ao ambiente familiar, que normalmente é cáustico. Fica aqui o link para quem queira ouvir.

Quando eu andava na faculdade, por cortesia, os meus pais costumavam tomar conta de dois irmãos, filhos de uns vizinhos nossos. A mãe tinha problemas com depressão e quando ficou grávida do segundo filho frequentemente dizia que a criança não era desejada e teria sido preferível ela ter tido um aborto. Naquela altura não era permitido. Era muito triste ouvi-la falar. O menino mais velho já tinha sete ou oito anos e era muito indisciplinado: não que fizesse traquinices, mas quando decidia que queria uma coisa, pedia, e começava a chorar e a gritar para lha darem. Os adultos normalmente aquiesciam a criança só para a calar.

Recusei-me a alimentar o ciclo vicioso. Durante várias semanas ele fez um berreiro ao meu lado; os meus pais ralhavam comigo e diziam para eu o calar e eu ignorava e dizia ao menino o que eu esperava dele: pedia com voz calma, dizia "se faz favor" e "obrigado" e eu consideraria os seus pedidos. Sem essas três coisas, eu recusava-o sempre. Eventualmente, tornou-se numa criança agradável ao meu lado, mas continuava a ser indisciplinado perto dos outros adultos.

É lógico que para mim era fácil manter a calma porque eu não tinha grandes responsabilidades para além dos meus afazeres escolares; mas se uma situação familiar é difícil, não é com gritos e berraria que ela se irá tornar mais fácil. Infelizmente, muitos adultos não percebem isto ou estão numa situação mental muito difícil e não se conseguem ajudar a si próprios, nem aos seus filhos.

Ellas (Ela + Ella)

Não sei qual a melhor...

A Julie London, que é mais jazzy:

Ou a Ella Fitzgerald, que é a versão que tenho no meu iPhone e é mais bluesy. Se calhar vou comprar a Julie também, just to be thorough...

Mas isto eu sei: chorar por amante, não; por gato ou cão, pode ser!

de dentro do tempo

venho de dentro dos tempos
onde os segundos eram invenções
de séculos futuros e
onde os instantes não se contavam
eram apenas aqui e agora
sem adjectivos
sem atributos


nesse tempo não havia noção de tempo
e talvez por isso havia mais tempo
para o abraço, o afago, o beijo, a carícia
também havia tempo para violência e guerra
mas como nada era contado
cada um fazia o tempo que queria
na sua própria cabeça
e em geral as coisas boas lembravam mais
que as más

mesmo que não haja provas disto
exactamente por nada se contar
mas tenho esta impressão do meu tempo

o tempo era meu
eu não era do tempo
e quando me deixei estar e ser no tempo
os dias encurtaram
e a lua apareceu mais cedo

Cry me a river...

Não percebo nada disto, mas é uma boa oportunidade para ouvirmos o JT.

O Justin Timberlake é um moço que foi criado em Memphis e eu já vivi em Memphis, logo tenho de vos dizer que ele é um bom rapaz. Comprou um campo de golfe, Mirimichi, que estava velho e descuidado e fez dele o melhor campo de golfe público do sul dos EUA depois de lá gastar $16 milhões e de o transformar num campo ecologicamente amigo do ambiente.

Para quem não sabe, os campos de golfe, por causa da necessidade de fertilizar intensivamente a relva, podem ser uma fonte de poluição das águas por causa de excesso de fósforo e nitrogénio (este tipo de poluição foi o tópico das minhas dissertação e tese, mas eu estudei-a aplicada à agricultura, não a campos de golfe).

Mirimichi é hoje uma atracção para a cidade de Memphis, que é considerada uma cidade pobre. O campo foi vendido no ano passado por meio milhão de dólares, mas não se sabe muito bem a razão por o preço ser tão baixo. No entanto, o novo dono planeava reestruturar a admissão, logo é natural que o contrato de venda tenha condições adicionais e o objectivo de Justin tenha sido mesmo o de recuperação e transformação e não o de exploração para fins lucrativos.

Ah, mas o que é que eu não percebia? Não percebo porque é que o PS chumbou o PROGRAMA de governo da PàF (mas não o Orçamento de Estado, correcção da minha asserção inicial), mas agora queixa-se de a PàF não lhe ter deixado nada que o PS o pudesse usar. A não ser que isto seja o princípio da desculpa pela qual o PS não irá apresentar um Orçamento de Estado tão cedo.

Ó nosso ilustre Primeiro Ministro António Costa, cry me a river, mas tenha cuidado porque não há solução para as cheias em Lisboa...

A justiça penal no Programa de Governo: esperar para ver

Os Programas de Governo são, normalmente, documentos mais ou menos vagos, o que em parte se compreende tendo em conta a necessidade de ajustar o que se prevê ao que se encontra no terreno em cada Ministério e à evolução da conjuntura económico-financeira tão volátil nos nossos dias.
Especificamente quanto ao que consta do Programa do XXI Governo Constitucional sobre a justiça penal, saúdo a preocupação com as finalidades sancionatórias tal qual se acham previstas no art. 40.º, n.º 1, do Código Penal e que já se retiram da CRP. Assim, a ressocialização – sempre proposta e nunca imposta – encontra nas “casas de saída” uma ideia já antiga e que, com honrosas excepções, nunca saiu do papel e, quando tal sucedeu, tem sido mantida por associações privadas. É uma indeclinável tarefa do Estado, assim como o desiderato de incrementar a rede de actividades produtivas dentro dos estabelecimentos prisionais, em ligação com a comunidade.

Um longo post sobre educação que não conclui

Não tenho, à partida, uma visão definida sobre o papel dos exames no ensino. À partida, os dois lados da discussão teórica têm méritos evidentes. Pessoalmente, passei por dois sistemas de ensino, o britânico e o português, que são radicalmente diferentes no que diz respeito aos exames. 

O sistema de ensino britânico não está centrado na importância do exame. Lembro-me de um professor que, no início de uma aula de preparação para o exame, disse que não acreditava em surpresas e leu alto as perguntas que iriam sair. A ideia do exame não é testar se a pessoa acerta ou não acerta em dados avulsos, mas se é capaz de apresentar um argumento próprio, coeso, que reconheça os dois lados do problema e seja capaz de destilar uma conclusão. É claro que o meu exemplo foi de Universidade, pós-licenciatura, mas, falando com os meus colegas ingleses, não me parece nada que não seja a norma nas escolas e nas licenciaturas também, onde a produção dos alunos é sobretudo na base dos ensaios, escritos em casa, e apresentações. E, já agora, não é bem uma questão de tornar a avaliação mais contínua: a discussão é mesmo sobre a necessidade de avaliação. O chumbo basicamente é um conceito não existente. E isso resulta? Não sei, mas sei que os ingleses, os com quem trabalho mas também aqueles que conheço fora do local de trabalho, são capazes de apresentar argumentos complexos de uma maneira simples, sintética e estruturada. Não acho que os portugueses saiam das escolas ou universidades com a mesma capacidade, para ser sincero. 

Na minha Universidade, em Lisboa, o exame tinha um papel crucial. Os exames eram em larga medida imprevisíveis, tinham várias perguntas e exercícios, e era preciso estudar a matéria toda para ter chances reais de passar no exame. O resulado não foi necessariamente mau. Seria extremamente ingrato se dissesse que o rigor intelectual a que fui obrigado, também por causa dos exames, não me foi benéfico. Ainda hoje sinto que, no meu escritório, em que trabalho com outros economistas, na larga maioria britânicos, a maioria doutorados, se não me atrapalho nada e em boa parte acho que é precisamente porque fui obrigado a esse rigor intelectual. Mas, novamente, não acho que a faculdade ou a escola me tenham particularmente preparado para o debate propriamente dito, para ouvir com uma mente aberta, para não sentir a minha autoridade ameaçada por haver outros pontos de vista. Acho, na verdade, que isso construí cá (e é um work in progress!). 

E é aí que o problema provavelmente reside. Tenho ideia de que, em Portugal, a cultura e a educação ainda são vistos como bens de classe. Bens que servem para distinguir-nos uns dos outros, num país onde a minguante classe média trava um combate desigual pela não despromoção. A arte não é vista como um kantiano prazer despreocupado, mas como uma arma de defesa. A cultura é para vestir como as roupas de seda colorida na idade média. Os programas mais populares são concursos que testam a cultura, que consiste maioritariamente na memorização de dados avulsos. Alguns destes programas até comparam essa capacidade de memorização com as de uma criança. Outros progrramas muito populares são os de comentário unipessoal, sem contraditório, ou programas com contraditório onde todos falam por cima uns dos outros. Subjacente está sempre a ideia de que há uma verdade, que é uma espécie de troféu ganho por quem é visto acertar mais vezes. Quer-me parecer que um movimento de redução do papel do exame vai na direção correta de reduzir a visão na sociedade portuguesa de que há sempre um certo e um errado, e de que a cultura é uma arma. Mas, repito, não tenho uma posição final sobre o assunto.

Estou revoltada!

Andei tantos anos a fazer exames para ter uma educação e agora dizem-me que foi tudo mentira. Os exames que me andavam a fazer eram apenas para me assustar, não tinham benefício nenhum. Que crueldade! E aquela felicidade que eu sentia em ir para a escola era tudo uma ilusão; não devia tê-la sentido por causa dos exames -- os malvados exames, senhores!!!

Porque é que eu me sujeitei a tantos anos de escola? Não havia razão nenhuma. Devia ter feito apenas a escolaridade mínima e seria feliz para o resto da minha vida. Tantos anos sem exames que eu desperdicei!

Não sei como é que irei sobreviver a ter um doutoramento e um salário de seis dígitos depois de saber isto. Onde é que eu me dirijo para processar o estado português?