segunda-feira, 3 de outubro de 2016

E Pluribus Unum

O Benfica é clube construído sobre os ombros de mitos: Eusébio; Coluna; José Águas; Néné; Torres; Rui Costa; Luisão. Todos eles associados a momentos gloriosos de um clube que arrasta multidões e paixões muito difíceis de entender, mesmo para aqueles que as sentem. No Benfica, como na vida, as pessoas associam-se a momentos marcantes: o quão mais feliz o momento, maior é a marca das pessoas que  o vivem, que tornam possível esse mesmo momento.

Mas há também outro tipo de pessoa, quiçá mais rara, de certeza mais importante: aqueles que, quando tudo está perdido, quando a esperança morre cá dentro, chegam com um abraço e uma palavra de conforto e nos explicam, com gestos ou com palavras, que o continuar é o acto essencial da vida. Que continuando, em frente, seja devagar ou aos trambolhões, o futuro melhor acabará por chegar.

Faço parte de uma geração que nasceu para o futebol com uma promessa de Benfica a jogar da única maneira aceite entre hostes encarnadas: à Benfica. Chegamos ao futebol pelos pés de um maestro ainda em formação, ao leme de uma equipa habituada a ganhar, que nos convenceu que isso era a norma. Mas o destino é por vezes cruel, e ao som de música clássica composta pelo Toy, a nossa adolescência juntou às borbulhas no rosto o período mais negro da história encarnada: Artur Jorge, Graeme Souness, Manuel José, Paulo Autori. Escalona, Martin Pringle, Carlos Bossio, Michael Thomas. E Vale e Azevedo claro está. Preparado para culpar tudo e todos, começando e acabando sempre pelo treinador. E quando o chicote soava e o treinador saía, com a época já irremediavelmente perdida, não havia outro remédio senão apelar a quem tinha um coração vermelho demais para dizer que não:

Mário Wilson.

Eu percebo a glória do Eusébio, do (Sr.) Coluna. Os títulos, cá dentro e pela Europa. Mas sei desta glória por imagens, muitas a preto e branco, de um passado que é para mim tão estrangeiro como a ditadura que acabou uma década antes de eu ter nascido. Quando me falam em mística, quando me falam em amor pelo clube, pelo Meu clube, o meu exemplo foi, é e será sempre o Mário Wilson. Que chegava com um tom apaziguador, sabendo que acontecesse o que acontecer, ganhasse ou perdesse, jogasse bem ou mal, os seus dias ao leme da nau da qual o seu coração era eternamente prisioneiro, estariam sempre contados. Mas não importa. Não importa o mérito, não importa a carreira. Importa o Benfica. Foi o Mário Wilson que explicou ao Rui Vitória que é importante apostar na formação. Ainda que não haja Seixal nem Renatos e Bernardos, só Pepas e Mawetes. Ainda assim, é importante tentar. É importante dar oportunidades aos mais jovens. Aos que sentem o Benfica. Mas acima de tudo, o Mário Wilson ensinou-nos que, mesmo quando perdemos tudo, não podemos perder a dignidade. E essa lição, guardo-a comigo para sempre no coração.

Obrigao, Capitão.

4 comentários:

  1. A benfiquização de Mário Wilson sempre me pareceu uma coisa artificial e oportunista. Wilson veio de Moçambique para jogar no Sporting, e daí passou a Coimbra, onde se distinguiu como jogador e como treinador. Chegou ao Benfica com 45 anos. Serviu o Benfica com profissionalismo e dedicação, mas isso não faz dele um benfiquista, por mais que se queira reescrever a História. Se se identificava com algum clube, esse clube era a Académica.

    Curvo-me perante a sua memória.

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  2. Sr. Burmester, artificial e oportunista?
    https://www.youtube.com/watch?v=77JmyKNWmEU

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  3. Por respeito para com a ainda fresca memória do finado, não comento.

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