quarta-feira, 26 de outubro de 2016

O Ministro Sol(o)

No meu artigo no jornal ECO, A austeridade não tem cor nem sexo, sugeria que discutíssemos o que importa para a economia portuguesa:
1. Como ser competitivo num mundo que vive mais uma revolução tecnológica? 
2. O que fazer para que desta vez ela não nos passe ao lado? Por que diminui o investimento desde o início do século XXI? 
3. Por que razão a força de trabalho mais qualificada de sempre não aparece nas estatísticas da produtividade?

Os Ministros das Finanças ganharam uma importância e um relevo que não deviam ter (e que não merecem). Têm-no porque os mercados estão sempre a olhar para eles. A centralidade que lhes damos na discussão pública é só mais uma forma de submissão à lógica de curto prazo dos mercados.

No fundo, o que eu sugeria com o meu artigo era que centrássemos a nossa discussão nos trabalhos dos Ministros da Economia, da Educação, das Infraestruturas, do Mar, do Ensino Superior, da Trabalho e Segurança Social, da Modernização Administrativa...

Mas, infelizmente, como mostram as decisões sobre a prestação de contas (ou a falta dela) da administração da Caixa ou a informação em falta no Relatório do OE, o Ministro das Finanças, qual Sol, faz tudo para estar no centro do palco. 

E com isto tudo, onde está o escrutínio sobre a actividade que verdadeiramente importa para o futuro do país, isto é, sobre a actividade dos outros ministros? 





6 comentários:

  1. Excelente artigo, Fernando. Já o tinha lido no ECO.
    Veja a falta de transparência nas contas e projecções de sustentabilidade da Segurança Social. Não se discute o essencial. A perspectiva é o curto prazo, ditada pelos défices imediatos das finanças públicas, como se o futuro não chegasse e não fosse importante não o contaminarmos com os mesmos problemas de sempre que nos trouxeram até aqui.

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    1. Muito obrigado Margarida. A verdade é que não há discussão sobre políticas sectoriais. E como as finanças não tomam posição sobre políticas sectoriais o resultado são medidas que se aplicam a todos os ministérios sem distinção. Ou seja, é a ausência total de estratégia. O que é paradoxal nisto tudo, é que essa centralidade do MF não permite fazer as mudanças sectoriais que permitiriam alterar a estrutura da despesa.

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  2. Nenhum governo vai resolver os problemas do país. A infraestrutura está concluída. O futuro será decidido pelo desempenho da sociedade civil, das empresas à academia. Quanto menos se esperar do governo e quanto menos este interferir, melhor. O período de maior crescimento da economia espanhola dos últimos 8 anos foi registado no período em que esteve sob gestão corrente.

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  3. Li com interesse o artigo para o qual aponta e abraço o desafio que lança.

    Nos idos de 2011, nos alvores da austeridade, por várias vezes escrevi que a bancarrota da República era acima de tudo uma oportunidade. A expressão que por várias vezes usei foi "sair da crise enriquecendo" pese embora o meu cepticismo quanto à sua viabilidade no contexto Português. Não acabei desiludido e, realmente, a criação de condições para o investimento nunca foi adiante. Foi o grande erro do governo anterior. Muito consolidação orçamental (que era necessária, evidentemente) mas criação de condições para enriquecer, isso, claro, ficou no tinteiro. O que nos leva à sua primeira questão. Como ser competitivo? Sabe-se como. Não é preciso reinventar nada. É agarrar no Ease of Doing Business e no Global Competitiveness Report, ver o que está mal, ver onde está bem e copiar adaptando. Há é o problema de que muito do que ali está vai contra a alma Lusa e, por isso, não é aplicavel em Portugal. Portanto a minha resposta simplificada à sua primeira questão é que a competitividade de Portugal ao nivel dos países mais prósperos não é possivel porque a sociedade Portuguesa não está talhada dessa forma. A resposta à sua segunda questão é mais do mesmo. Em relação à sua terceira questão, porém, parece-me haver uma falha de percepção. Diz-se que a actual é a geração mais qualificada de sempre mas isso é baseado no número de licenciados e no de gente que conclui o ensino secundário. Apenas quantidade e nada de qualidade. Sim, nunca houve tantos licenciados em Portugal como agora. Mas, desses, quantos são de áreas conducentes à riqueza e à prosperidade? Há em Portugal massa crítica de gente ligada às ciências, à matemática e à economia suficiente para o progresso? De que servem tropecentos mil licenciados em ciência política, sociologia, antropologia, animação cultural e tretas afins que nada acrescentam à riqueza dum país? Não são esses que vão fazer o que quer que seja pelo progresso tecnológico ou pelo investimento. Todas essas profissões estão muito bem para os países que já são ricos e têm dinheiro para gastar nelas. Não lhes nego a utilidade pontual mas são caprichos. Países como Portugal têm que gastar dinheiro no essencial por forma a poderem enriquecer antes e acima de tudo. Ora, quando se diz "geração mais qualificada" inclui-se nesta expressão muitos que são totalmente inuteis para este assunto. Reduzindo apenas àquelas profissões conducentes ao progresso científico e económico aí já a coisa é substancialmente diferente. Não tenhamos ilusões: se houvesse neste momento a criação de condições para o investimento requerendo uma grande quantidade de matemáticos, engenheiros de diversos ramos, físicos, químicos e similares seria necessário contratar no exterior profissionais com curriculo capaz porque não há tantos assim em Portugal capazes de sustentar um grande surto de desenvolvimento tecnológico.

    Deixe-me dar-lhe um exemplo comezinho, pequenininho mas que precisamente pela sua reduzida dimensão ilustra bem o assunto. Se neste momento alguém decidisse priorizar os caminhos de ferro em Portugal com quadros de excelência tanto para a infra-estrutura como para a operação ferroviária, gente de mérito e saber com capacidade para enfrentar um desafio desses não haveria em Portugal gente para uma coisa dessas. Não há quadros em Portugal com as formações e saber necessários a uma aposta desse calibre. E, repare, não estamos a falar de inovações ou desenvolvimento tecnológico. Apenas de aplicar o conhecimento já existente da melhor forma possivel no actual estado do conhecimento.

    Como remate; os ministros da economia e a economia mesma não têm relevo em Portugal simplesmente porque a sociedade Portuguesa não é de molde a que o tenham. Portugal está em trajectória descendente e continuará nela. O fosso em relação aos países mais prósperos continuará a alargar-se acima de tudo porque a sociedade Portuguesa não quer seguir as receitas que levaram esses países à prosperidade.

    É o que há meu caro. É assim a vida.

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    1. Obrigado pelo oomentário. Concordo que copiarmos bem o que os outros já fazem bem era um bom ponto de partida. Há de facto muitas licenciaturas que não fazem sentido, ou que não faz sentido que sejam financiadas pelo Estado e licenciados com competências de qualidade duvidosa. Mas, apesar disso, não me parece que haja dúvidas de que esta geração é a mais qualificada de sempre. Também há mais qualidade. Eu entrei na universidade em 1990. A universidade de hoje é incomparavelmente melhor do que era naquela altura. E como se costuma dizer, temos de fazer o melhor que podemos com aquilo que temos. E eu tenho a certeza que estamos muito longe de fazer aquilo que podemos.

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  4. Caro Fernando Alexandre:
    Para que tal aconteça - discutir-se a economia em vez da distribuição das magras migalhas que ela gera desde há quase 20 anos - a «má moeda» que ocupa as direcções dos partidos, assim como o pessoal político que as rodeia, teriam de ser paulatinamente substituídos pela «boa moeda».
    Mas tal só poderá acontecer por pressão dos cidadãos.
    E o que vemos em grande parte dos cidadãos?
    A repetição das lógicas maniqueístas do funcionamento partidário.
    Pescadinha de rabo-na-boca?
    Parece que sim!

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