Duvida mal

A decisão de recapitalizar o Novo Banco através das obrigações seniores (transferidas para o BES) vai afectar gravemente os investimentos por partes dos maiores fundos financeiros. Como se sabe, os dois maiores prejudicados – a BlackRock e a Allianz – serão provavelmente os maiores fundos de investimento globais, e ambos com uma presença importante na economia nacional, com ações de empresas listadas. Com este governo, duvido que voltem a investir em Portugal. E nenhum fundo voltará a comprar obrigações seniores de bancos portugueses.

Fonte: João Marques de Almeida, Observador

Não é assim que os fundos de investimento funcionam. Os hedge funds correm o mundo à procura de boas oportunidades para investir. Como há um trade-off entre risco e retorno, tem de haver uma avaliação das duas variáveis. É óbvio que os fundos de investimento retornarão sempre a Portugal para investir, só que "enquanto o pau vai e vem, folgam as costas". Quer dizer, eles virão se lhes oferecerem taxas de retorno que justifiquem o risco do investimento, com este ou outro governo. Até a Grécia com as suas estrionices consegue financiar-se junto de hedge funds.

Os fundos podem perder o capital inicial que investem, mas antes cobrarão juros exorbitantes para compensar esse risco. A perda do capital inicial é sempre considerada quando os hedge funds decidem ou não investir e negoceiam a taxa de juro. Quem investe em hedge funds sabe que o capital inicial não está garantido e ajusta as suas expectativas.

Veja-se o caso da Argentina, que estava isolada dos mercados internacionais, por causa da presidência Kirschner. Ao eleger Mário Macri, que é uma pessoa mais pró-negócio, os argentinos negoceiam outra vez financiamento externo porque o governo assim o decidiu, só que pagam os olhos da cara.

International banks — including HSBC, JP Morgan, Goldman Sachs, Deutsche Bank, Citibank, Santander and BBVA — are on the verge of lending the country at least US$5 billion at an annual interest rate of seven percent, after meetings held by Finance Secretary Luis Caputo in New York with bank representatives.

Fonte: Buenos Aires Herald

E podiam ter conseguido antes, se Kirchner acedesse a pagar taxas de juro altas; em vez disso ela preferiu aumentar os impostos sobre as exportações para 30%, ou mais (exportações de soja pagavam 35%), para financiar o país. Já Mário Macri decidiu reduzir os impostos sobre as exportações e obter financiamento do FMI, hedge funds, China, etc.

O que Portugal faz ao assustar os investidores mais conservadores é aumentar a percepção de risco do país, o que sujeita o investimento em Portugal a financiamento por investidores que têm mais apetite para risco, logo cobram taxas de juro mais altas. Há sempre alguém disposto a correr o risco, se for compensado para isso. Mas esse risco acaba por ser pago pelos bolsos dos portugueses, pois mais dinheiro sai da economia em juros.

É por isso que estabilidade, uma justiça eficaz, bom enquadramento legislativo para tratar de casos de corrupção, etc. são importantes: reduzem a percepção de risco do país e atraem investidores que se satisfazem com taxas de juro mais baixas. Ter bancos a actuar em Portugal sem supervisão adequada combinado com governos dispostos a nacionalizar perdas e privatizar lucros é uma estratégia suicida.

Enquanto o BCE apoiar a dívida pública portuguesa, os governos podem ser negligentes e tudo são rosas, mas isto não dura para sempre. Não queiram gerir Portugal usando estratégias de curto prazo pensando que uma situação anormal pode ser prolongada indefinidamente em nosso benefício -- é uma má estratégia de gestão de risco e condena o país à pobreza.

Os hedge funds são fundos de investimento muito sofisticados e os governantes de Portugal são tudo menos sofisticados, ou seja, é como se tivessemos profissionais da NBA a jogar com miúdos da escola primária.